Cidades

Escassez de testes afeta ações contra a covid-19

Impedido de comprar novos exames por força de decisão judicial, o Governo do Distrito Federal (GDF) está com o monitoramento de casos comprometido. Para especialistas em saúde, impasse atrapalha as estratégias para impedir a disseminação da doença

Correio Braziliense
postado em 22/07/2020 04:19
A enfermeira Karine Rodrigues recuperou-se do coronavírus em casa




Considerado um dos principais meios de garantir o monitoramento de novos casos da covid-19, a testagem da população permite que o Poder Público entenda o avanço da doença e adote medidas para reduzir o risco de contágio. Embora dados apontem que a velocidade da contaminação tenha desacelerado, o acompanhamento detalhado está comprometido em algumas unidades básicas de saúde (UBSs) devido a uma decisão judicial que impede o Executivo local de comprar novos testes. Mesmo assim, o DF é uma das unidades da Federação que mais testou a população, com 403.119 exames até o fim de junho.

A Secretaria de Saúde disponibiliza dois tipos de exames à população: o RT-PCR — com amostra de secreção — e o teste rápido, em que se coleta sangue. Contudo, a indicação é válida apenas para pacientes com sintomas da doença e, mesmo assim, há UBSs sem estoque. Para pesquisadores, esse cenário atrapalha as estratégias de acompanhamento da doença, que poderiam ser aperfeiçoadas após a retomada das atividades econômicas.

Professora da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília (UnB), Valéria Paes observa que o fortalecimento da atenção primária pode contribuir com o trabalho de identificação de novos casos. “No DF, de 2014 para cá, houve um movimento no sentido de ampliar a cobertura (da atenção primária), mas ainda não chegamos ao ponto ideal”, avalia a professora.

Valéria reforça que o cumprimento de medidas básicas também podem auxiliar o controle da doença. “No momento em que houve a abertura de comércios e serviços, deve-se recomendar que a população continue a seguir recomendações como uso de máscara, higienização das mãos e saída apenas em caso de necessidade, para a própria autoproteção”, afirma. “Há pessoas que precisam sair para trabalhar. Nesses casos, é importante procurar manter o distanciamento social.”

Mesmo com todos os cuidados que Karine Rodrigues, 32 anos, toma no ambiente de trabalho, ela não conseguiu se proteger do vírus. No fim de junho, a enfermeira foi infectada pela covid-19. “Havia muita gente ao meu redor sendo afastada. Tive sintomas moderados, fiquei em casa e comecei a melhorar depois de 2 de julho”, relata. “Vivenciar um diagnóstico positivo é uma incerteza. Você não sabe se o que você tem é um caminhar da própria doença ou o agravamento dela. Fiquei muito tensa. Fora a indisposição geral, que é muito ruim”, descreve Karine.

Rastreamento

Sanitarista com PhD em epidemiologia, o médico Eduardo de Azeredo Costa considera que o enfrentamento à pandemia da covid-19 levou mais destaque a políticos do que a vozes da área técnica. Para ele, o cenário segue preocupante, mas o momento de estabilização pode ajudar na hora de tomar medidas importantes. “O DF está em uma situação epidemiológica que propicia um controle mais efetivo. Ceilândia tem condições de fazer enfrentamento e controle da pandemia por meio do uso adequado de agentes e unidades básicas de saúde, por exemplo”, sugere.

O médico também defende a realização de testes RT-PCR — com coleta de amostras de secreção do nariz e da garganta — para controle da transmissão. “É preciso saber quem são os infectantes para poder isolá-los. Assim que um caso suspeito é informado, pode-se ativar uma rede de agentes de saúde da região, para que eles visitem a casa das pessoas, dos amigos e dos vizinhos da comunidade e, eventualmente, o local de trabalho”, acrescenta Eduardo.

A ação, segundo ele, seria seguida do acompanhamento daquela vizinhança. Nos casos em que não fosse possível o isolamento, o sanitarista aponta como saída levar o paciente para uma estrutura gerenciada pelo governo durante a pandemia, como hotéis ou ginásios. O trabalho poderia ajudar, principalmente, para o monitoramento de infectados assintomáticos ou com sintomas leves: “Há pessoas que nem aparecem nos postos de saúde. Então, não é possível fazer rastreamento de contatos, porque ninguém fica sabendo o que houve”, pontua Azeredo.


Embargo

Decisão do Tribunal de Justiça do DF e dos Territórios (TJDFT), na última quarta-feira, interrompeu a compra de 1 milhão de testes rápidos para a detecção da covid-19 pelo GDF. A determinação levou em conta uma investigação do Ministério Público do DF e Territórios, que apurava um suposto esquema de fraude na aquisição dos exames. Segundo a Secretaria de Saúde, o impedimento afetou o estoque das UBSs, ainda não reposto. No entanto, a pasta espera contar com 300 mil testes doados pela Receita Federal. Os itens passam por um processo de análise de qualidade e devem ser distribuídos nas unidades básicas e hospitais públicos em breve.

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