Cidades

De volta pro meu aconchego

Músicos da Orquestra do Teatro Nacional prestaram homenagem a pacientes recuperados do novo coronavírus. Embalados pela música de Elba Ramalho, dentre outras canções, eles tiveram alta, ontem, do Hospital de Campanha do Mané Garrincha

Correio Braziliense
postado em 25/07/2020 04:15
Com muita música, 16 pacientes que estavam no hospital de campanha comemoraram a alta








O Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha foi palco, ontem, de um concerto especial. Pouco antes das 17h, os músicos foram os primeiros a chegar. Por cima da roupa formal, trajavam capote, touca e máscara de proteção facial. Em seguida, eles prepararam os instrumentos e logo se posicionaram no palco improvisado para um pequeno ensaio. Na plateia, aos poucos, as cadeiras, distantes umas das outras, foram ocupadas por homens e mulheres de diferentes idades.

Todos aguardavam ansiosos as grandes estrelas do dia, que apareceram entre um arco de balões coloridos, diante de muitas câmeras fotográficas, em cadeiras de roda empurradas por profissionais da saúde. Eram 16 pacientes recuperados do novo coronavírus; cada um com uma história de vida, mas todos com o olhar de superação. Para trás, eles deixavam lembranças difíceis dos momentos de internação no Hospital de Campanha do Mané Garrincha, as angústias dos sintomas e a incerteza do diagnóstico. Adiante, a alegria por retornar ao aconchego da casa e da família, com a certeza de que foram cuidados por “anjos”.

“Fiquei surpresa com o cuidado deles, com o amor e o carinho. Não tenho palavras. Só posso rezar e agradecer pela vida deles”, comentou Mônica Souza da Silva, 45 anos. A paciente começou a sentir os sintomas da covid-19 durante uma viagem que fez para Goiânia com o marido. “Uma dor de cabeça muito forte, uma febre sem explicação, fortes dores no corpo e nos olhos”, relembrou. Quando voltou para Brasília, foi para o Hospital Regional da Asa Norte (Hran), onde os médicos logo a internaram por conta da baixa saturação de oxigênio no sangue. Mônica passou 15 dias na unidade de saúde, até ser transferida para o hospital de campanha. “Só Deus mesmo. Agora é cantar vitória”, afirmou.

Músicas para celebrar a conquista não faltaram. O repertório foi escolhido a dedo pelo duo de violoncelo Gidesmi do Santos Alves e Ocelo Mendonça, da Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional. Versões de Ave Maria, Asa Branca, a trilha sonora do filme Missão Impossível e De volta pro meu aconchego. “Estamos fechando um ciclo, tanto para os pacientes quanto para profissionais da saúde que vão ver suas famílias. Também sabemos que é uma missão quase impossível lutar contra essa pandemia”, explicou Ocelo.

O ambiente hospitalar não é uma novidade para os músicos. Antes da pandemia, visitavam unidades de saúde com a Orquestra Sinfônica para tocar para os pacientes. “Mas, faltava esse convite. Me sinto muito feliz por fazer essa homenagem. É um dia de gratidão. Essas pessoas conseguiram dar a volta por cima”, acrescentou Gidesmi. Emocionado, o artista lembrou da irmã, que passou 20 dias internada por conta do vírus, em Maceió. “Algo que queria ter feito para ela”.

Comoção
Na saída de cada interno, palmas, notas musicais e lágrimas. As máscaras de proteção até escondiam o sorriso, mas não foram suficientes para conter a emoção. Sentada na primeira fileira, Júlia Ferreira, 26, aguardava ansiosamente a chegada da sogra Sônia, 54. “Foi terrível ficar longe dela. Estamos acostumados a ter ela sempre perto. Meu namorado queria fechar a loja e vim pra cá recebê-la”, contou. Com dificuldades de respirar, Sônia ficou seis dias internada no Hospital Regional de Sobradinho (HRS) e depois foi transferida para o Mané Garrincha, onde ficou mais 13 dias internada. “Ela é uma pessoa forte e muito nova. Ficamos assustados, porque teve complicações no pulmão”, complementou Júlia.

Desde a abertura oficial da unidade de campanha, mais de 800 pacientes receberam alta. Ali dentro, eles criam laços, motivam um ao outro e, principalmente, depositam nos profissionais a confiança de uma vida. Não à toa os chamam de anjos. “É gratificante celebrar a alta de um paciente. Cada momento é único. Por mais que hajam restrições, não podemos impedir as reações das famílias. Os encontros são emocionantes”, relatou uma profissional.

Mesmo paramentados, com barreiras protetoras dos pés à cabeça, os servidores expressavam nos olhos a alegria por cada vitória. Entre as histórias de ontem, o reencontro de Antonio Marcos Rozeno de Araújo, 46, e a irmã Socorro Rozeno, 56, sensibilizou todos os presentes. “Ele é um paciente sindrômico, não tem consciência do que aconteceu e ficou bem grave”, comentou uma profissional, bastante emocionada. Socorro não esperou o encerramento da homenagem e logo correu para abraçar o irmão. “Cuido dele e da nossa mãe, de 92 anos, e nós pegamos a covid. Fiquei 20 dias muito mal no Hran, há três dias saí do hospital. Minha mãe ficou internada, mas faleceu no domingo. Ele não sabe que a mãezinha dele faleceu. Eu saí, mas ainda estou me recuperando em casa. Por isso estou emocionada, porque eu me preocupei muito com ele. Pensei que ia perder ele, mas, Deus é grande. Meu medo era eu morrer e não ter quem cuidasse dele. Nunca vou permitir que alguém leve ele para um orfanato. A família toda o ama muito”, contou Socorro.





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