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Publicação de sentença quanto ao processo 2016.04.1.0018623

Procedimento comum após ação de conhecimento de Ronivaldo de Melo Franco em desfavor de S.A. Correio Braziliense e outros

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 05/08/2020 15:00

RETRATAÇÃO

Na veiculação envolvendo o Sr. Ronivaldo de Melo Franco, informamos, por equívoco, que ele teria sido preso por suposto crime de estelionato, o que não ocorreu. Pedimos desculpas ao Sr. Ronivaldo de Melo Franco e também aos nossos leitores.

Segue íntegra da sentença:

Processo : 2016.04.1.001862;3
Classe : Procedimento Comum
Assunto : Obrigações
Requerente : RONIVALDO DE MELO FRANCO
Requerido : CORREIO BRAZILIENSE e outros

Sentença Vistos, etc.
Ronivaldo de Melo Franco propôs ação de conhecimento, sob o procedimento comum, em desfavor de S.A. Correio Braziliense e Flávio Leite Costa, partes devidamente qualificadas nos autos do processo em epígrafe.
Disse, em síntese, que no dia 14.10.2015, quando conduzia seu veículo automotor, foi abordado por uma guarnição da PMDF e conduzido à 20a Delegacia de Polícia, por apresentar sinais de embriaguez, acrescentando que, submetido a teste etilômetro e constatado alto teor alcoólico, foi autuado em flagrante delito, sendo arbitrada fiança, paga algumas horas após.

Asseverou que neste interregno, também foi preso e conduzido à mesma delegacia um grande estelionatário, acusado da prática de diversos goles contra estabelecimentos de venda de materiais de construção.
Aduziu que no meio da madrugada, chegou à delegacia uma equipe do programa televisivo DF Alerta, do canal TV Brasília, para fazer a cobertura da prisão do estelionatário.
Narrou que a reportagem, com duração de três minutos, na qual narrada toda a dinâmica criminosa praticada pelo estelionatário, foi transmitida pelo programa DF Alerta em rede aberta para todo o DF e cidades do Entorno, acrescentando que, ao longo da narração, foi divulgada, com clareza e exatidão, a imagem do autor, algemado e conduzido por agentes da Polícia Civil, como se fosse o estelionatário.
Afirmou que cópia do vídeo contendo a referida reportagem foi publicada nos sites de notícias CorreioWeb e Notícias do Gama, circunstância que lhe causou danos de ordem moral passíveis de indenização, dadas as repercussões negativas junto à sua comunidade.
Pediu, em sede de tutela provisória de urgência, fossem os réus compelidos a retirar a reportagem de seus meios de comunicação. No mérito, pugnou pela condenação dos réus ao pagamento de R$ 100.000,00 (cem mil reais), a título de indenização por danos morais, bem como pela imposição de obrigação de fazer, consistente em publicar a íntegra da sentença a ser proferida, acompanhada de pedido de retratação.
Juntou os documentos de fls. 20/49.
Tutela provisória de urgência indeferida (fl. 52).
Por meio da petição de fl. 56, o autor desistiu da ação em relação ao segundo réu, pleito homologado à fl. 67. Citado, o primeiro réu ofereceu contestação às fls. 69/79, acompanhada dos documentos de fls. 80/90. Suscitou, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva ad causam, sob o argumento de que não foi o autor da matéria jornalística, limitando;se a republicar o conteúdo do vídeo, filmado, elaborado e editado por
terceira pessoa. Ainda em sede preliminar, arguiu a perda superveniente do interesse processual, no que diz respeito à retirada da reportagem jornalística, já promovida. Pugnou, ademais, pela denunciação da lide à TV Brasília, responsável pela confecção e edição do vídeo.
No mérito, afirmou que não praticou qualquer ato ilícito, na medida em que, ao republicar a reportagem jornalística em seu site, não fez qualquer juízo de valor ou modificação no conteúdo original, veiculado pela TV Brasília, indicada como fonte responsável pela sua elaboração. Acrescentou que a indisponibilidade do conteúdo, em prazo razoável, demonstra a sua diligência e boa;fé. Impugnou a existência de danos morais indenizáveis, afirmando que o fato noticiado somente pode ser tido como mero dissabor ou aborrecimento. Questionou o valor pretendido a título de indenização, reputado excessivo. Alegou que descabido o pedido de divulgação de nota de retratação e de publicação do inteiro teor da sentença.
Réplica às fls. 94/102.

Intimadas as partes a especificar provas, o autor pugnou pela oitiva de testemunhas (fl. 105), ao passo que o réu nada requereu (fl. 106).
Por meio das decisões de fls. 113/113 verso e 115, foram indeferidos, respectivamente, os pedidos de denunciação da lide e de prova testemunhal.
É o relatório. Decido.
Reitero que o feito comporta julgamento antecipado, nos termos do art. 355, inciso I, do NCPC, desnecessárias que se mostram outras provas, que não as já constantes dos autos.
Rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam. Atribui;se ao réu S.A. Correio Braziliense a prática de conduta ilícita, consistente na publicação de vídeo contendo reportagem em que veiculada a imagem do autor, como se estelionatário fosse. É o quanto basta para que se visualize a sua pertinência para figurar no pólo passivo, haja vista a perfeita transposição dos titulares da relação jurídica de direito material para a relação jurídica de direito processual, com o registro de que a identificação acerca da imputada responsabilidade diz respeito ao mérito da demanda, devendo ser como tal apreciada.
Acolho, entretanto, a preliminar de perda superveniente do interesse processual, no que toca ao pedido de retirada da reportagem jornalística tida por ofensiva, na medida em que os documentos que instruem a contestação demonstram já ter sido adotada tal providência.
Superadas as questões preliminares, não se vislumbram quaisquer vícios outros que possam macular o regular andamento do feito. Assim, estão atendidos os pressupostos processuais de existência e de validade da relação processual, as partes são legítimas e há interesse processual na solução da controvérsia remanescente.
Enfrento o mérito.
Conforme relatado, cuida;se de ação por meio da qual pretende o autor seja o réu S.A. Correio Braziliense condenado ao pagamento de indenização por danos de ordem extrapatrimonial, sofridos em razão da divulgação de vídeo no qual veiculadas imagens em que a sua imagem aparece, ao tempo em que narrada a prisão de estelionatário. Vindica o autor, ainda, a imposição de obrigação de fazer, consistente na veiculação da íntegra da sentença a ser proferida, bem assim de pedido de retratação.
Os elementos de prova constantes dos autos dão conta de que, no dia 13.10.2015, por volta das 23:00, o autor foi preso e autuado em flagrante pela suposta prática do crime previsto no art. 306 da Lei n. 9.503/97 ; embriaguez ao volante (fls. 25/27), sendo;lhe arbitrada fiança de R$ 790,00,paga no dia seguinte (fl. 28).
Demonstram, ainda, que a TV Brasília veiculou, no programa DF Alerta, reportagem jornalística em que noticiada a prisão de Alexandre Cardoso da Silva, pelos crimes de estelionato e uso de documento falso, à qual associada, por diversas vezes, a imagem do autor (CD acostado à fl. 46).
E comprovam, ademais, que o conteúdo da reportagem foi republicado pelo réu no site
www.correioweb.com.br (fls. 43/45).
Pois bem.
A responsabilidade civil versa sobre o dever imposto a alguém de indenizar outrem, quando verificada a prática de ato ilícito que ocasione ao lesado um dano patrimonial ou extrapatrimonial, decorrente de ato comissivo ou omissivo. São pressupostos para a configuração da responsabilidade civil: conduta ; ao menos culposa; nexo de causalidade e dano indenizável.

A propósito, convém destacar a lição do professor Sergio Cavalieri Filho: "Portanto a partir do momento em que alguém, mediante conduta culposa, viola direito de outrem e causa;lhe dano, está;se diante de um ato ilícito, e deste ato deflui o inexorável dever de indenizar, consoante o art. 927 do Código Civil. Por violação de direito deve;se entender todo e qualquer direito subjetivo, não só os relativos, que se fazem presentes no campo da responsabilidade contratual, como também e principalmente os absolutos, reais e
personalíssimos, nestes incluídos, o direito à vida, à saúde, à liberdade, à honra, à intimidade, ao nome e à imagem" (CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 8a ed.. São Paulo: Atlas, 2009,p. 18).
A fim de solucionar a controvérsia exposta nos autos e analisar se o autor faz jus à compensação por danos a seu patrimônio imaterial, faz;se necessária a ponderação entre direitos fundamentais de envergadura igualmente constitucional.
De um lado, o direito à honra e à imagem ; art. 5o, incisos V e X, da Constituição Federal. De outro, o direito à liberdade de expressão ; arts. 5o, incisos IV e XIV, e 220, ; 1o, da Constituição Federal.
Como se sabe, em hipóteses de colisão entre direitos fundamentais, deve;se buscar a sua
compatibilização à luz do postulado da proporcionalidade, relativizando;se, no caso concreto, um deles em detrimento do outro.
Não se desconhece que os direitos e garantias fundamentais externados no art. 5o da Constituição Federal foram criados para proteção de particulares em face de abusos perpetrados pelo Estado. No entanto, esses direitos e garantias foram paulatinamente estendidos para alcançar também as relações privadas.
É a chamada eficácia horizontal dos direitos fundamentais.
Buscando eximir;se de responsabilidade, o réu alega que não praticou qualquer ato ilícito, na medida em que, ao republicar a reportagem jornalística em seu site de notícias, não fez qualquer juízo de valor ou modificação no conteúdo original, veiculado pela TV Brasília.
Tal circunstância, contudo, não afasta a sua responsabilidade. Com efeito, na medida em que alguém se dispõe ao desempenho de atividade jornalística, evidente que o dever de informação clara, correta e adequada vem a reboque, incumbindo ao interessado a tomada de todas as diligências necessárias à confirmação da veracidade da notícia veiculada, pena de, assim não procedendo, responder por danos eventualmente causados à esfera de interesse de terceiros.
E esse dever não é infirmado pelo fato de o meio de comunicação simplesmente republicar conteúdos elaborados por terceiros, ainda que identificada e indicada expressamente a fonte responsável pela elaboração. Assim não fosse, a republicação se prestaria, sem qualquer forma de coibição eficaz, à potencialização de tais efeitos danosos.
Destarte, tanto para o autor da notícia, como para aquele que a republica, a que título for, remanesce hígido o dever de aferição da idoneidade da notícia veiculada, exceção feita aos provedores de internet ; que não é o caso do réu para quem dispensada a realização prévia dos conteúdos inseridos pelos usuários, a teor do art. 19, da Lei 12.965/2014.
Estabelecidas essas premissas, é de se observar que o conteúdo jornalístico republicado pelo réu de fato destoou da realidade, ao atribuir a terceira pessoa ; associada ao autor por meio da divulgação de imagens suas ; a prática dos crimes de estelionato e uso de documento falso. Aliás, essa constatação sequer é por ele impugnada.
E ainda que o réu se encontrasse nas dependências da delegacia, por força de prisão em flagrante decorrente da suposta prática do crime de embriaguez ao volante, não há como deixar de reconhecer que a equivocada imputação da prática de estelionato ; crime que a sociedade, em geral, repudia com maior veemência, até mesmo em razão da banalização da mencionada infração de trânsito, dada a sua cotidianidade ; fez com que ele experimentasse inequívocos prejuízos em sua honra objetiva e subjetiva, a torná;lo credor de compensação financeira.
Enfim, o réu divulgou matéria em que, por imagem, foi associada ao autor, preso por embriaguez ao volante, a prática de estelionato, crime que maior repercussão causa no seio social ; tanto assim é que levou uma rede de televisão a promover a cobertura jornalística do fato ; caso em que, para além dos apontados dissabores ou aborrecimentos, efetivou;se evidente ofensa a atributos personalíssimos por ele titularizados.

Assentada, portanto, a conduta ilícita do réu e os danos experimentados pelo autor, bem assim o nexo causal entre uma e outros, cumpre apenas delimitar a extensão de tais danos, para fins de arbitramento da indenização devida.
Para tanto, indispensável recorrer aos parâmetros que hodiernamente têm pautado essa árdua tarefa, cabendo registrar, desde já, que o valor da indenização não pode ser tão alto, a ponto de ensejar eventual enriquecimento sem causa, tampouco demasiadamente baixo, a ponto de não atingir a função pedagógica de desestimular o ofensor na reiteração da prática ofensiva. Ademais, indispensável a aferição das condições pessoais do ofendido, bem como as possibilidades financeiras do ofensor, mais uma vez levando em conta o caráter compensatório, punitivo e preventivo da indenização.
Sopesados esses critérios, tenho que, na espécie, R$ 15.000,00 (quinze mil reais) bem quantificam os prejuízos morais sofridos pelo autor, registrando;se que, além dos critérios antes mencionados, foram considerados o fato de o réu ter promovido, em tempo razoável, a indisponibilidade do conteúdo veiculado, bem como a circunstância de o autor já se encontrar preso por ocasião do evento, ainda que pela suposta prática de crime distinto.
Quanto ao pedido de obrigação de fazer, consistente na veiculação da íntegra da sentença ora proferida, bem como na divulgação de nota de retratação, tenho;o por igualmente cabível, como forma de recomposição integral do dano sofrido pelo autor.
Ante o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido e condeno o réu S.A. Correio Braziliense a pagar ao autor, a título de indenização por danos morais, a importância de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), sobre a qual incidirão correção monetária, pelo INPC, a contar da presente data (súmula 362 do STJ), e juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, desde o evento danoso, ocorrido em 14.10.2015, data da veiculação da matéria jornalística (súmula 54 do STJ).
Determino ao réu, ainda, que no prazo de 15 (quinze) dias promova a publicação da íntegra da presente sentença, acompanhada da respectiva nota de retratação, no mesmo site em que veiculada a notícia desabonadora ao réu (www.correioweb.com.br), e em espaço adequado, mantendo a veiculação de ambas pelo prazo de 10 (dez) dias, sob pena de multa, ora fixada em R$ 2.000,00 (dois mil reais) para cada dia de descumprimento.
Arcará o réu com o pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, que, atento ao art. 20, ; 3o, do CPC vigente à época da propositura da ação, fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.
Resolvo o mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil.
Transitada em julgado esta sentença, recolhidas as custas processuais e não havendo novos requerimentos, arquivem;se os autos, com as cautelas de estilo.
Sentença proferida pelo Núcleo Permanente de Gestão de Metas do Primeiro Grau ; NUPMETAS;1,
instituído pela Portaria Conjunta no. 33, de 13 de maio de 2013.
Publique;se. Registre;se. Intimem;-se.
Brasília ; DF, terça-;feira, 21/02/2017 às 13h35.
Rodrigo Otávio Donati Barbosa
Juiz de Direito Substituto

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