Ciência e Saúde

Entrevista - Michel Brunet: "A noção de elo perdido é estúpida"

Paloma Oliveto
postado em 26/06/2009 07:56

Em maio passado, cientistas apresentaram no Museu de História Natural de Nova York o fóssil de Ida, que seria o elo perdido entre o homem e os primatas. Isso não contraria a sua tese, de que não há um ancestral comum?

Eu não digo isso, que não há um ancestral comum. Mas a noção de elo perdido é estúpida. Você tem o grupo da família humana e o grupo dos grandes macacos. No grupo dos macacos, os biólogos moleculares mostraram que, entre chimpanzés e humanos, o nível genético tem apenas 1% de diferença. Essa grande similaridade genética é justamente o que faz pensarmos que pode ter havido um antepassado comum. Mas as coisas são bem mais amplas do que imaginamos e alguns conceitos precisam ser modificados. Um deles é justamente o do elo perdido. Não se pode dizer com segurança que houve um ser que evoluiu do macaco para o homem. Foram várias populações, várias diferentes espécies. A nossa única certeza é a nossa incerteza. Não tenho como responder a essa pergunta agora. A ciência é uma atividade formidável, mas temos que ser humildes, porque há muitas coisas sobre as quais não sabemos.

Ainda hoje há cientistas que consideram Touma; um primata, e não uma criatura pré-humana?

Sim, deixe-me contar uma história. Quando éramos crianças, brincávamos de bola de gude na hora do recreio e tentávamos descobrir quem era o melhor. Eu fazia isso na França, você deve ter feito isso no Brasil. Havia os bons jogadores e os ruins. Hoje, continuo a brincar. Mas o pátio do meu recreio é o deserto, onde encontro hominídeos. Outras equipes também brincam de encontrar (o espécime) mais antigo. Temos bons jogadores e ruins. Isso se chama inveja. Pesquisadores não são perfeitos, isso seria até mesmo biologicamente injusto. A proporção de bons e ruins pesquisadores é a mesma verificada em outras áreas. Mas existem características em Touma; que só podem ser encontradas em famílias humanas. Ele, definitivamente, não era um macaco.

[SAIBAMAIS]Duzentos anos após o nascimento de Darwin, existem escolas onde o criacionismo ainda é ensinado. O que o senhor pensa sobre isso?

Nossa história tem pelo menos 8 milhões de anos e, durante a maior parte desse tempo, até que fossem encontrados os primeiros fósseis na Bélgica, em 1825, éramos todos criacionistas. Então, abrimos as gavetas, colocamos os fósseis dentro, as fechamos e não falamos mais sobre isso. A gente acredita no homem fóssil há 150 anos. Comparado aos 8 milhões de anos, é mesmo um período ainda recente. Hoje, os criacionistas distorcem Darwin, são os neocriacionistas. Eles falsificam a ciência dizendo: ;Sim, a evolução existe, mas quando a vida apareceu, teve a mão de Deus;. No ano passado, fiz palestras em escolas do sul dos Estados Unidos e você sabe bem que o que eles ensinam lá. Os Bush são de lá. Eles ensinam Darwin, mas na realidade, é o criacionismo disfarçado. A ciência é evolução. O resto não é ciência. É claro que existem as filosofias e os pensamentos pessoais. Mas isso não é ciência. (PO)

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