A idade havia chegado sem transtornos ou danos à saúde para a costureira Maria Célia Teixeira. Até meados do ano 2000, aos 75 anos, ela era uma mulher ativa, com uma rotina dividida entre o atendimento a clientes e os pequenos afazeres da casa onde morava com uma das filhas. Como acontece na maioria dos casos, a Doença de Alzheimer chegou sem grande alarde, levantando, a princípio, a falsa suspeita de que os lapsos ocasionais de memória poderiam ser consequência das sete décadas e meia de vida.
Na época em que acometeu Maria Célia, a doença, hoje a maior causa de demência em idosos, era um mistério de difícil diagnóstico para os médicos. Nove anos depois, a cura ainda é um desafio a ser vencido, mas o problema é reconhecido com mais facilidade por geriatras e neurologistas. O mal contabiliza 1,2 milhão de vítimas no Brasil, segundo dados da Associação Brasileira de Alzheimer (Abraz). Mas a frieza dos números nem de longe reflete o sofrimento experimentado pelos doentes e familiares. A progressão da doença é silenciosa e irreversível. Os primeiros sintomas ; como alterações de memória, de comportamento e de coordenação ; e a dificuldade de raciocínio e incapacidade de realizar tarefas simples, presentes nas últimas fases, são causados pela degeneração e morte das células nervosas.
O neurologista e neurocirurgião Luiz Cláudio Modesto explica que a incidência do Alzheimer é proporcional ao aumento da população idosa. ;Estima-se que, em 2050, o mal acometerá 106 milhões de pessoas em todo o planeta;, diz. Para o especialista, a grande busca dos médicos é detectar a doença o mais cedo possível. ;As drogas disponíveis no mercado se mostram eficazes para frear a progressão, prolongando a sobrevida do paciente, que varia de oito a 10 anos. Mas é preciso se conscientizar de que o auxílio dos familiares é fundamental para que o doente tenha qualidade de vida;, observa Modesto.
Carinho
Graças aos olhos atentos e ao carinho da família, Maria Célia encontra forças para lutar contra a doença. ;No primeiro estágio, minha mãe não se lembrava de fatos recentes. Sua memória remota era boa e ela estava consciente, tanto que percebia que estava doente. Mas com o tempo, foi perdendo o discernimento, ficou completamente dependente;, lamenta a filha da costureira, Edna Teixeira de Melo, 54 anos. Com a ajuda das irmãs e de duas enfermeiras, ela cuida da mãe há oito anos. ;Chorávamos bastante. O processo de aceitação da doença veio com o tempo, mas o sentimento de derrota diante do Alzheimer é inevitável. Suportar a perda torna-se um desafio diário, pois embora a pessoa esteja presente, está alheia a tudo e a todos. É muito triste. Minha mãe não me reconhece mais, usa fraldas e age como uma criança incapaz de formar frases inteiras. Apesar de tudo, ela ainda demonstra afetividade e é muito bem humorada;, descreve Edna.
Pesquisas sobre novas substâncias que auxiliam no tratamento do mal estão em curso nos Estados Unidos e na Europa. Recentemente publicados no Journal of Alzheimer Disease, resultados preliminares de um estudo feito em camundongos no Centro de Pesquisa sobre a Doença de Alzheimer (Universidade do Sul da Flórida) revelou que a cafeína pode ser viável como estratégia preventiva ou mesmo para retardar os sintomas da doença em curso. Os cientistas esperam começar em breve os testes em humanos. Também nos Estados Unidos, pesquisadores do Instituto Picower para Aprendizado e Memória (Massachusetts) divulgaram que, estimulando a função de um gene envolvido na formação da memória, eles conseguiram reverter os efeitos da doença em ratos de laboratório.
Apesar das promessas, o neurologista e diretor científico da Abraz, Ivan Okamoto, alerta que é preciso cautela. ;Existem muitas pesquisas, algumas darão resultados, outras não. O que temos de concreto são os medicamentos que usamos. Eles representam um grande avanço porque proporcionam tempo e qualidade de vida aos portadores desse mal. Há 10 anos, isso era impossível;, pondera.
; Dicas para o cuidador
Cuidar de um paciente de Alzheimer é, acima de tudo, um ato de amor. Pessoas que passaram pela experiência recomendam paciência, dedicação e divisão de tarefas com outros familiares e amigos. Confira algumas dicas:
; Estabeleça rotinas. Além de facilitar a vida do cuidador, o portador da doença se sente mais seguro
; Incentive a independência. É necessário que o portador receba estímulos para continuar fazendo algumas atividades sozinho
; Faça perguntas simples. Converse sem encadear vários pensamentos, ideias ou escolhas. As perguntas devem possibilitar respostas como sim ou não
; Torne a casa segura: a dificuldade motora e a perda de memória podem aumentar a possibilidade de quedas
; Ajude a manter as habilidades pessoais. Algumas atividades podem incentivar a dignidade e o respeito próprio, dando propósito e significado à vida
; Mostre fotografias de membros da família com nomes para ajudar no reconhecimento, coloque placas indicativas nas portas dos cômodos da casa