O tic-tac do relógio da vida é incessante. Do momento em que se nasce até o último suspiro, envelhecemos. Embora muitos relutem em aceitar o curso natural da trajetória humana, há aqueles que conduzem o passar dos anos com maestria. São pessoas que encaram o tempo como um aliado e chegam aos 70, 80, 90 anos cheios de vitalidade.
Não há dúvidas de que a evolução da medicina colaborou para prolongar a vida de homens e mulheres. Basta lembrar que o brasileiro vive, atualmente, cerca de 72,7 anos, enquanto, em 1960, a expectativa de vida no país era de 52,4 anos, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Mas especialistas são unânimes em dizer que a longevidade é decorrência dos bons hábitos ao longo da história de cada um. Aqueles que fumam, são obesos, sedentários e não administram bem situações de estresse morrem pelo menos uma década antes do que os que têm uma rotina saudável.
Prova disso é o aposentado Alenn Assis de Almeida. Aos 82 anos, ele esbanja entusiasmo e conta que o esporte sempre esteve em sua rotina. ;Eu tinha 9 anos quando comecei a jogar basquete. Na adolescência, fiz ginástica e natação. Morava no Rio de Janeiro e também nadava na praia. Mudei para Brasília em 1961, comecei a praticar judô e conheci ainda os benefícios do ioga. Nunca encarei o esporte como uma obrigação, ele é um prazer;, diz.
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- para ouvir entrevista com Allen Assis Almeida, 82 anos, que conta seu segredo de longevidade
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E é assim até hoje. De segunda a sexta-feira, as manhãs são dedicadas aos exercícios em uma academia. A alimentação, confessa Alenn, não foi tão cuidada na juventude e recentemente o coração sentiu os abusos. ;Imagino que minhas escorregadas na dieta comprometeram a saúde. Há um ano e meio tive um infarto. Mas não tenho dúvidas de que resisti a ele por causa do meu vigor físico;, acredita.
O octogenário não lamenta estar envelhecendo. ;É um processo mais que natural. Não fico pensando nos contras de ser um idoso. Meu avô morreu aos 45 anos, meu pai chegou aos 82 com a saúde debilitada. Sempre tive uma postura positiva diante da vida. Tenho 53 anos de casado e procuro aproveitar cada minuto. Ter uma companheira bacana para conversar, passar os dias e viajar é importante, a família é fundamental nessa caminhada;, completa Alenn.
A professora do programa de pós-graduação em gerontologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Anita Liberalesso explica que o equilíbrio emocional abre portas importantes para a longevidade. Segundo ela, à medida que as pessoas envelhecem, ficam mais expostas a fatores de risco à saúde e perdas afetivas ou de posição social. ;Ninguém envelhece da noite para o dia. Temos tempo para ficarmos mais sábios, nos adaptarmos às mudanças. A velhice não é sinônimo de declínio e infelicidade. Hoje, além do arsenal da medicina, temos como aliada a informação. Sabemos melhor como prevenir doenças;, observa.
A especialista também ressalta que não é segredo a importância que a educação e a formação têm para a longevidade. ;Todas as pesquisas na área da gerontologia apontam que, assim como os cuidados preventivos com a saúde, é importante dar atenção à atividade intelectual. Quem busca o conhecimento tem uma inquietude saudável. Ter espiritualidade, equilíbrio emocional, altruísmo a atitudes positivas nos ajudam a conquistar objetivos na vida, lutar por causas de valor imaterial;, pondera. ;E são esses valores que darão força e sabedoria para enfrentar os problemas, aborrecimentos e tristezas comuns na vida de todos nós. Afinal, quem não passa por momentos difíceis, perdas e lutos?;, acrescenta.
Os cidadãos com mais de 60 anos correspondem hoje a 10,5% da população brasileira. O estudo Longevidade no Brasil, encomendado por um banco nacional e conduzido pelo cientista social José Carlos Libânio, demonstra que, aos poucos, o conceito de envelhecimento tem sido melhor assimilado no país. ;Consultamos cerca de 2 mil pessoas. A maioria entende que, mais do que uma questão cronológica, a longevidade está relacionada à qualidade de vida, o que significa estar ativo e ser independente. Para 87% dos entrevistados, chegar a essa fase é um privilégio;, diz Libânio.
Descontração
Rir, dançar, conversar e saber extravasar as emoções são bons caminhos para viver mais tempo. Essa é a conclusão de um estudo coordenado pelo geriatra Thomas Perls, da Universidade de Boston (EUA). O objetivo do trabalho era entender o efeito que a personalidade de cada um exerce sobre o tempo de vida. A pesquisa identificou características comuns a pessoas centenárias e seus filhos e mostrou que os mais extrovertidos sabem lidar melhor com o estresse, são menos solitários e menos deprimidos.
Para a coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas da Terceira Idade (Nepti) da Universidade de Brasília (UnB), Maria Regina Moreira, a extroversão é uma característica que ajuda no convívio social. ;As amizades são importantíssimas durante toda a vida, mas para quem passou dos 60, elas são fundamentais. Os amigos nos carregam nas horas difíceis e afastam a solidão, tão temida para os idosos;, afirma.
Além de trabalhar no Nepti, Regina, que tem 69 anos, participa de um grupo da terceira idade que se reúne quinzenalmente para passeios e reuniões sociais. Dele, também faz parte a dona de casa Jusiléa Oliveira da Silva, que, aos 79 anos, faz questão de estar em todas as atividades propostas pela trupe. ;Adoro ser independente e, embora more sozinha, estou sempre em companhia das amigas que fiz no grupo. Tenho o espírito jovem e muita vitalidade, jamais fico parada. Considero que esse é realmente um dos segredos da longevidade. A idade chegou sem que eu percebesse;, confessa.
As companheiras de cinema, teatro e exposições concordam com ela e acrescentam: ninguém pode ser feliz sozinho. ;Fiquei viúva muito cedo e trabalhei muito para cuidar de seis crianças sozinha. Quando menos esperava, perdi uma filha repentinamente. Ela tinha apenas 38 anos. Chorei muito e enfrentei o luto. As amizades me salvaram;, enfatiza a aposentada Maria José Barbosa.
E os amigos, sempre eles, se encarregam também de incentivar as conquistas pessoais. A farmacêutica aposentada Yeda de Paula Valle, 76 anos, que também integra o grupo da terceira idade, lembra que os desafios rejuvenescem. ;Quando superamos medos, mexemos com a nossa autoestima. Canto no Coro Sinfônico Comunitário da UnB. As peças são difíceis. Trabalhamos com compositores consagrados. Imaginei que não conseguiríamos. Recentemente, interpretamos a Segunda Sinfonia de Mendelssohn. As amigas estavam na plateia para aplaudir a conquista;, conta a entusiasmada senhora.