postado em 27/10/2009 08:00
O reaproveitamento de materiais, uma das soluções mais usadas para conter o acúmulo de lixo no planeta, também chegou ao universo do surfe. Uma pesquisa conduzida na Universidade do Vale do Itajaí (Univali) resultou em pranchas feitas a partir de resíduos de agave, planta abundante no litoral brasileiro e considerada nociva a alguns ecossistemas, como as restingas. Ao contrário do poliuretano, plástico empregado na fabricação das pranchas convencionais, o material não promove o lançamento de gases na atmosfera e é facilmente absorvido pela natureza. A ideia rendeu aos pesquisadores Marcelo Ulysséa e Marcella Silvestro uma indicação à semifinal do Prêmio Santander de Empreendedorismo 2009.Ulysséa, que é surfista e aluno de oceanografia na Univali, conta que sempre teve curiosidade de testar e desenvolver novos materiais voltados para a área. ;Percebemos que, em algumas praias, a planta estava tomando o espaço das espécies nativas e formando verdadeiras crateras. No fim de seu ciclo de vida, ela produz uma espécie de pendão de 7m de altura, em média. Com essa estrutura, consigo fabricar a prancha;, explica. A ideia de investigar o potencial da agave surgiu depois que o estudante voltou de uma temporada nos Estados Unidos, onde teve contato com Gary Linden, surfista mundialmente famoso por utilizar diferentes tipos de madeira na produção de pranchas artesanais.
A agave foi introduzida no Brasil em 1900, para o cultivo de sisal, costume que permanece forte até hoje na Região Nordeste. Ela é muito usada para fins paisagísticos. ;Muita gente planta agave em casa. Quando o pendão cai, sementes são lançadas no chão, colonizando uma área grande. Por isso, ela se dissemina com tanta rapidez;, explica.
De acordo com Ulysséa, a madeira é recolhida depois de seca. A partir daí, as laterais são retiradas, sobrando uma tora, onde é feita a curvatura de fundo da prancha (veja arte). Depois disso, uma tábua é encaixada ao lado da outra, com o auxílio de uma prensa. ;O acabamento, porém, é feito numa loja especializada, onde são usados materiais como resina e fibra de vidro;, destaca. O produto final lembra as pranchas antigas, usadas por surfistas no Havaí. A cor, por exemplo, permanece natural. ;A prancha nada mais é do que uma madeira vitrificada por dentro da resina. Cada tora tem uma coloração específica. Por esse motivo, é impossível produzir uma prancha igual à outra;, enfatiza o pesquisador, lembrando que são necessárias oito toras, em média, para fazer uma prancha.
A solução ecológica, no entanto, tem seu preço. Enquanto produtos de poliuretano podem ser encontrados por um valor que varia de R$ 500 a R$ 800, as pranchas de agave custam de R$ 400 a R$ 1,2 mil, dependendo do tipo e tamanho. ;O trabalho é artesanal. Enquanto produzo um bloco, a indústria convencional consegue fazer 10;, justifica Ulysséa, que já comercializa algumas unidades. Na companhia da engenheira civil com especialização em meio ambiente Marcella Silvestro, o pesquisador inscreveu o projeto no prêmio promovido pelo Banco Santander. Eles são semifinalistas na categoria indústria, na Região Sul. ;Não tínhamos pretensão alguma, mas estamos felizes com a indicação. Se ganharmos o prêmio, montaremos a fábrica;, diz.
A proposta da dupla, de acordo com Marcella, é promover o esporte sustentável. ;O Brasil é o maior produtor de agave do mundo. Portanto, temos matéria-prima em abundância. Nossa intenção, no futuro, é fazer uma plantação para tirarmos dela a nossa produção;, afirma. Para ela, o uso de materiais ecológicos pode ser mais estimulado na indústria do surfe. ;Apesar de ser um esporte bastante ligado ao meio ambiente, os surfistas acabam usando um utensílio altamente poluente, como no caso das pranchas feitas com poliuretano;, conclui.