Ciência e Saúde

Estudo mostra como operações para desobstrução de artérias nos rins estão se tornando banais

Cresce o debate sobre procedimentos alternativos

Paloma Oliveto
postado em 05/11/2009 08:10
Pacientes com doenças renovasculares podem estar passando por procedimentos invasivos desnecessários. Preocupado com a banalização da cirurgia como tratamento de primeira linha nos Estados Unidos, o cirurgião vascular Ross P. Davis, da Wake Forest University Baptist Medical Center, em Salem, resolveu investigar um grupo de 434 pessoas com problemas vasculares nos rins. Descobriu que somente 20% apresentavam estenoses (estreitamento do vaso sanguíneo) ou entupimento das artérias renais no momento em que receberam o diagnóstico inicial.

De acordo com Davis, conforme os exames de detecção e os procedimentos cirúrgicos vão sendo incrementados pelos avanços tecnológicos, mais aumenta o número de pacientes operados simplesmente porque apresentam alguma anomalia vascular. ;Nós temos de refletir sobre quando as intervenções realmente podem ser a melhor opção para o paciente e seu problema;, diz. O médico e professor universitário conta que a quantidade de cirurgias tem crescido tanto nos Estados Unidos que os centros federais de assistência à saúde já começaram a questionar a necessidade da técnica. No Brasil, esses procedimentos também são realizados. Procurado pelo Correio, o Ministério da Saúde não divulgou as estatísticas.

Cresce o debate sobre procedimentos alternativosO resultado da pesquisa de Davis, publicada no Journal of Vascular Surgery, da Sociedade de Cirurgia Vascular norte-americana, mostrou que as estenoses das artérias renais só progridem para um estágio que significa riscos à saúde em uma quantidade muito pequena de pacientes. Embora nos Estados Unidos haja um intenso debate sobre a melhor maneira de curar essas pessoas, com opções que vão de tratamentos medicamentosos a operações de grande porte, passando por procedimentos menos invasivos, como stents e angioplastia, Davis diz que a tendência é optar logo pela mesa de cirurgia.

Uma das técnicas mais aplicadas pelos médicos norte-americanos é a angioplastia com stent. Um tubo contendo um balão vazio é introduzido nas artérias por meio de uma agulha, que perfura a pele próxima à área onde há entupimento das veias. Quando o balão é inflado, o stent se expande e permite que as artérias, antes recheadas de placas de gordura, deixem o sangue fluir normalmente. Davis ressalta a importância do procedimento, mas apenas para pacientes em estado grave. ;Acredito que qualquer intervenção para estenoses das artérias renais tem melhor aplicação para pessoas com declínio da função renal ou que sofrem de hipertensão que não cede com medicamentos;, diz.

Complicações
O médico alerta que é preciso muito cuidado ao indicar esses procedimentos porque, por mais avançados, eles ainda oferecem riscos aos pacientes. ;Existem outras opções que podem ser aplicadas. Qualquer intervenção pode resultar em complicações. Então, antes de fazer as cirurgias, precisamos pesar os potenciais riscos e os benefícios para o paciente;, justifica.

Para o estudo, os pesquisadores analisaram o prontuário de 434 pacientes hipertensos que fizeram pelo menos duas ultrassonografias das artérias renais entre 1993 e julho de 2008. O objetivo foi verificar se eles realmente apresentavam estenoses no órgão ; quem apresenta o problema tem dificuldades de controlar a pressão alta ou já possui algum comprometimento das funções renais. Ao todo, os médicos tiveram acesso a 863 exames, realizados em diferentes fases. Desses, 178 apontavam um processo significativo de entupimento das artérias. Porém, somente 72 renais do grupo examinado sofreram progressões da doença e apenas 2% das ultrassonografias apontaram aumento da oclusão ou bloqueio das artérias. Além disso, os pesquisadores descobriram que o diagnóstico de estenose renal nem sempre significa um declínio severo das funções do órgão.

De acordo com Davis, o resultado da pesquisa mostra que, na maioria das situações, o uso de medicamentos é o tratamento mais apropriado, sendo que a cirurgia ou a angioplastia com stent devem ser reservadas apenas para pessoas que não apresentam melhoras com os remédios. ;Você pode diagnosticar que o paciente tem estenose, mas isso não necessariamente quer dizer que a pessoa vai desenvolver algum problema em consequência dela. O fato de você ter estenose não necessariamente significa que você tem de fazer algo a respeito;, conclui. O cirurgião vascular lembra que a pesquisa foi direcionada apenas a hipertensos com problemas renais. ;Não temos embasamento científico para dizer que o mesmo se aplica em casos de pessoas com entupimento das artérias coronárias;, alerta.

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