postado em 17/12/2009 07:00
Cristiana Andrade
Enviada especial
COP-15
Agenda do meio ambiente
Cúpula de países tenta superar impasses para cumprimento de metas contra o aquecimento global, de 7 a 18 de dezembro, em Copenhague
Agenda do meio ambiente
Cúpula de países tenta superar impasses para cumprimento de metas contra o aquecimento global, de 7 a 18 de dezembro, em Copenhague
Copenhague ; As perdas econômicas decorrentes dos desastres naturais relacionados às mudanças climáticas somaram US$ 863 bilhões entre 2000 e este ano, segundo o Centro de Pesquisas Epidemiológicas de Desastres (Cred), organização ligada à Universidade Católica de Louvain, em Bruxelas. De acordo com o Cred, no mesmo período, foram 3.770 ocorrências, que mataram 778,7 mil pessoas e afetaram 2,1 bilhões, um terço da população mundial.
Os números não apenas mostram a urgência de um acordo global até amanhã, em Copenhague, onde ocorre a 15; Conferência das Partes da Convenção sobre as Mudanças Climáticas (COP-15), bem como a necessidade real de se falar em financiamento para adaptação e mitigação a longo prazo, um dos graves entraves do encontro. A única proposta aventada até agora partiu da União Europeia, que disse que poderia dispor de algo em torno de US$ 20 bilhões por ano para ajudar os países mais pobres. O que, num prazo como o avaliado pelo Cred, significaria o retorno de 22% do que foi perdido com as catástrofes em nove anos.
Este ano, 58 milhões de pessoas foram prejudicadas, de alguma forma, por desastres ambientais. Foram 245 eventos, dos quais 224 relacionados à água. Onze milhões de pessoas foram atingidas por enchentes, houve 8.919 mortes, e os prejuízos chegaram a US$ 19 bilhões, segundo o Cred. Os dados foram compilados entre janeiro e novembro deste ano. No Quênia, 3,8 milhões de pessoas precisam de alimentos e assistência. A Ásia é outro continente especialmente vulnerável a tempestades e enchentes. Entre janeiro e novembro, 48 milhões de pessoas foram afetadas por eventos relacionados à água. No Brasil, as mudanças climáticas já são percebidas em várias regiões, como as últimas chuvas torrenciais no Sul, em Minas e no Rio da Janeiro. Por outro lado, a seca no Nordeste tende a se agravar nas próximas décadas.
Segundo a representante especial das Nações Unidas para Redução de Riscos em Desastres (UNISDR), Margareta Wahlstr;m, as estatísticas de 2009 são um pouco melhores comparadas a anos anteriores ; em 2007, 178 milhões de pessoas foram atingidas por enchentes, e, no ano passado, 45 milhões. Mas ela diz que os fenômenos climáticos extremos continuam ocupando o primeiro lugar da lista de preocupações da UNISDR. ;Além disso, eles vão continuar afetando metade da população mundial que está altamente exposta e vive nas regiões costeiras;, disse.
Sofrimento
Ulric Trotz, que mora na Guiana e pertence ao Centro de Mudança Climática da Comunidade Caribenha, teme que a piora dos tufões, enchentes e outros eventos extremos dizimem comunidades inteiras. ;Estamos muito preocupados, pois já temos perda e sofrimento. Não podemos deixar que a temperatura global aumente em 2;C. No ano passado, tivemos de importar 50% de óleo combustível. Precisamos desenvolver tecnologias e nos adaptar.;
[SAIBAMAIS]Para Raja Jarrah, assessor de Mudanças Climáticas da Care International, organização não governamental que atua em vários países do mundo, inclusive no Brasil, com ajuda humanitária, a questão dos refugiados ambientais tende a piorar se as medidas não forem tomadas em tempo. Ele diz que os projetos da Care tentam manter o homem no campo, fazendo com que se adapte localmente. Mas, quando o problema estoura, seja por um evento climático, seja por guerra pela água ou pela terra, são criados os campos de refugiados, onde a organização dá ajuda pontual.
;Temos priorizado as ações de maior magnitude, principalmente na zona semiárida da África (Sudão, Senegal, Mali, Burkina Fasso, Costa do Marfim, entre outras). Ali, ajudamos a comunidade a ter um elo melhor de venda com os compradores de carne ou de grãos; para que não passem fome, ensinamos como estocar a carne seca, orientamos a não deixar o gado solto, pastando sempre no mesmo lugar. Mas o grande desafio é que as consequências das mudanças climáticas também são de longo prazo, e nos próximos 20 e 30 anos tendem a piorar. Esse é o desafio: essas comunidades travam guerras diárias para comer, para sustentar sua família, para encontrar água. Então, tentamos conscientizar sobre essas alternativas para o dia-a-dia, com a questão ambiental, mas não é nada fácil;, reconhece.
Mergulho no caos
Quanto mais se aproxima o fim da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-15), maior a sinalização de que não sairá da Dinamarca nenhum acordo satisfatório. A tensão aumentou ontem, e os ministros tiveram de trabalhar num ambiente caótico, com protestos do Brasil, da Índia e do Tuvalu, que comparou o evento ao naufrágio do navio Titanic. Durante a manhã, 170 pessoas foram detidas pelo controle de segurança do Bella Center, incluindo o negociador-chefe da delegação brasileira, o embaixador Luiz Alberto Figueiredo Machado.
Nas reuniões, foi decidido que o primeiro-ministro da Dinamarca, Lars Loekke Rasmussen, assumiria a presidência das negociações do clima, em substituição à ministra do Meio Ambiente Connie Hedegaard, que passará a coordenar as conversações informais. Rasmussen será o presidente da fase final das negociações, que serão concluídas na sexta-feira com um encontro de quase 120 chefes de Estado e de Governo, segundo Yvo de Boer, principal funcionário da ONU para a questão climática. Não se deve esperar, porém, grandes avanços. O primeiro-ministro australiano(1), Kevin Rudd, disse que ;não há garantias de êxito;. Por sua vez, o premiê britânico, Gordon Brown, afirmou à BBC que será muito difícil fazer um acordo.
A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, definiu a quarta-feira como ;o dia da ;colchetação;;, referindo-se aos espaços em branco no texto de negociações, que ainda precisam ser discutidos. Porém, apostou que tudo dará certo. ;Esperamos que as coisas estejam bem. Sempre perto do final, em qualquer negociação, há uma intensificação. Não significa que não vai dar certo;, afirmou.
No plenário da conferência, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, aproveitou para discursar e culpar o capitalismo pela atual situação climática. ;Os ricos estão destruindo o planeta;, disse. Chávez, que foi um dos primeiros chefes de Estado a chegar à COP-15, aludiu à ausência de seu colega americano Barack Obama, que só chega na sexta-feira. ;Pode-se dizer que um fantasma percorre as ruas de Copenhague e acho que ele anda entre nós, nesta sala, um fantasma espantoso que quase ninguém quer nomear é o capitalismo;, afirmou, enfatizando a responsabilidade dos países industrializados no aquecimento global.
;Mãe Terra;
Já o presidente boliviano, Evo Morales, anunciou que está promovendo com as Nações Unidas a aprovação de uma Declaração Universal dos Direitos da Mãe Terra, assim como a criação de um tribunal de justiça climática. Assim, afirmou, ;os países com industrialização irracional pagarão a dívida que têm para com o planeta;. ;Venho, em nome dos povos indígenas que sempre viveram em harmonia com a natureza, defender os direitos da Mãe Terra;, disse.
Do lado de fora do Bella Center, a confusão foi entre manifestantes e policiais. Mais de 100 pessoas foram presas, quando tentavam avançar em direção à sede da conferência. ;Nosso objetivo é entrar no Bella Center por outras vias e sem violência;, declarou Peter Nielsen, porta-voz dos ativistas. Porém, a polícia não permitiu. Entre 700 e 800 pessoas tentaram avançar até a entrada da conferência, mas enfrentaram um grande dispositivo policial. Os manifestantes se dispersaram para tentar desorganizar as forças, mas não conseguiram. Depois de uma rápida confusão e do uso de gás lacrimogêneo, eles foram detidos, algemados e colocados no chão.
Ajuda para florestas
Austrália, França, Japão, Noruega, Inglaterra e Estados Unidos anunciaram uma ajuda imediata de US$ 3,5 bilhões em três anos para a luta contra o desflorestamento, responsável por 20% das emissões mundiais de gases de efeito estufa. Em comunicado comum, os seis explicam que esperam, dessa forma, ;vencer e, se possível, derrubar o desmatamento nas nações em desenvolvimento;.