postado em 04/02/2010 10:21
As chamadas tecnologias de segunda geração para a produção de biocombustíveis estão na ordem do dia. O mundo todo busca formas alternativas para o uso energético da biomassa (todo tipo de material orgânico que pode ser utilizado para produção de energia), aumentando as possibilidades oferecidas pelos processos atuais e, principalmente, priorizando o uso de matérias-primas que não competem com a produção de alimentos. A partir deste ano, a Embrapa Cerrados ; unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária ; coordenará pesquisas para avaliar novas fontes de biomassa que possam ser usadas na obtenção de etanol.[SAIBAMAIS];Em uma perspectiva de médio e longo prazos, será estratégico para o Brasil produzir etanol a partir de biomassa lignocelulósica (vegetal);, afirma Marcelo Ayres, pesquisador da Embrapa Cerrados e coordenador da iniciativa. Para isso, o projeto vai avaliar o uso de gramíneas forrageiras (pastos), sorgo, ponteira e palha da cana-de-açúcar (partes da planta que não são aproveitadas), além de algumas espécies de árvores, como pinus, eucalipto e duas espécies da Amazônia: o tachi-branco e o paricá.
A escolha das espécies a serem avaliadas busca contemplar plantas mais adaptadas às condições do cerrado e que apresentem grande potencial de produção de biomassa. Outra vantagem é o conhecimento sobre o manejo dos sistemas de cultivo ; como se planta, a forma de colher e o maquinário utilizado. ;A maioria dessas espécies cresce e se desenvolve em todo o país. Além disso, elas produzem muita biomassa e são adaptadas às condições climáticas do cerrado, podendo ser plantadas até mesmo onde a cana-de-açúcar não pode;, explica o coordenador.
Os chamados materiais lignocelulósicos são compostos orgânicos que representam cerca de 50% de toda a matéria encontrada no planeta. Segundo Ayres, essa matéria-prima poderá diminuir consideravelmente a competição pelo uso da terra para a produção de alimentos e, ao mesmo tempo, representar uma diminuição dos custos. ;Além disso, os biocombustíveis geram baixas emissões de gases de efeito estufa, reduzindo impactos ambientais;, esclarece.
O processo de produção do etanol de segunda geração passa por diversas fases (veja arte), mas duas são fundamentais. Na primeira delas, as longas cadeias de celulose e hemicelulose ; polissacarídeos que formam a parede das células vegetais ; são quebradas para chegar a açúcares com cinco ou seis moléculas de carbono. Na segunda etapa, os açúcares reduzidos são fermentados. Esse é o procedimento que os cientistas devem percorrer até chegar ao combustível. No entanto, essa prática ainda é um desafio. ;Na teoria, qualquer tipo de biomassa vegetal se presta ao processo. Porém, para cada espécie deve haver um tipo de processo de quebra (hidrólise) e fermentação. Nosso desafio é descobrir um único processo para produzir etanol em escala industrial;, explica Ayres.
Integração
A pesquisadora da Embrapa Agroenergia Cristina Maria Monteiro Machado, participante do estudo, esclarece que as pesquisas desse tipo em todo o mundo apresentam gargalos relevantes que exigem esforços concentrados de pesquisa, desenvolvimento e inovação. ;São processos de conversão de elevada complexidade, com etapas interdependentes que são influenciadas pelas características das matérias-primas. Elas abrangem diferentes áreas do conhecimento;, descreve. Desse modo, a pesquisa demanda uma abordagem integrada e multidisciplinar.
O projeto brasileiro é dividido em quatro planos de ação, a serem desenvolvidos pelas unidades da Embrapa em todo o país em parceria com a Universidade de Brasília (UnB), a Universidade de São Paulo (USP) e duas intituições norte-americanas: o laboratório Labex e a Instituição Americana de Agricultura (ARS, na sigla em inglês). O primeiro plano de ação é a avaliação agronômica das biomassas ; saber quanto pode ser produzido por área e por ano. O segundo é a caracterização físico-química. Ou seja, descobrir a quantidade de compostos importantes (como moléculas de celulose) para a produção de etanol. O terceiro plano consiste em determinar quanto se produz de etanol a partir de cada uma dessas biomassas. E, por fim, vem a análise de viabilidade econômica. ;Nesse sentido, temos de estimar o quanto de energia será gasto para produzir esse tipo de etanol;, observa Ayres.
Cristina explica que cada uma das fontes que serão avaliadas pela pesquisa tem suas vantagens e desvantagens. Embora o uso de resíduos pareça ser mais viável no curto prazo ; uma vez que não haveria custo de produção de matéria-prima ;, problemas relacionados à logística, como coleta e transporte, deverão ser avaliados. Já o uso de culturas plantadas exclusivamente para a produção de etanol têm como desvantagem o custo agrícola agregado ao processo.
O Brasil é hoje um dos maiores produtores de etanol do mundo. Ao buscar matérias-primas mais eficientes, os cientistas buscam contribuir para o aumento da produtividade nacional e para a manutenção da competitividade do agronegócio brasileiro no mercado. Outro objetivo é ampliar a oferta de tecnologias, produtos, processos e serviços relacionados ao negócio de biocombustíveis, preocupando-se com a redução de impactos ambientais.