Ciência e Saúde

Pesquisadores brasileiros investem na criação de empresas especializadas na produção das proteínas que ajudam na defesa do organismo

O material é utilizado em inúmeras pesquisas, que vão da busca por tratamentos contra o câncer ao combate de pragas agrícolas

postado em 11/03/2010 08:00
Necessidade de importar o material, preços elevados e possível comprometimento da qualidade do produto. Essas são algumas das dificuldades relatadas por cientistas brasileiros que usam anticorpos em suas pesquisas, principalmente na área de biotecnologia. Buscando remover esses obstáculos, pesquisadores do país têm se dedicado à produção dessas proteínas que atuam na defesa do organismo e podem ser usadas de diversas formas em estudos, como a busca por tratamentos de doenças ou a detecção de agentes causadores de pragas que afetam plantações. O material é utilizado em inúmeras pesquisas, que vão da busca por tratamentos contra o câncer ao combate de pragas agrícolasO setor agrícola, por sinal, tem sido um dos maiores beneficiados com as iniciativas nacionais. A Rheabiotech, empresa criada em 2008 e ligada à Incubadora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), por exemplo, criou um kit denominado Soja Detecta, que permite a identificação de uma doença mais conhecida como ferrugem asiática, provocada pelo fungo Phakopsora pachyrhizi. Por meio do produto, o mal pode ser diagnosticado até cinco dias antes de as lesões na plantação começarem a surgir. Segundo a pesquisadora Fernanda Alvarez Rojas, sócia da empresa localizada em Paulínia (SP), a doença pode destruir por completo a plantação, causando enorme prejuízo. O kit é capaz de reconhecer o problema ainda dentro da célula, facilitando a tomada de decisões sobre o manejo da cultura. ;Assim, é possível garantir uma aplicação de fungicidas de maneira eficiente, evitando o comprometimento da plantação e a disseminação dos esporos para áreas que não foram afetadas;, destaca a cientista, cuja empresa já possui um catálogo com cerca de 300 anticorpos. Fábricas como a ligada à Unicamp ainda são raras no Brasil, mas começam a atender a demanda de universidades e institutos de pesquisa no país e no mundo. Fernanda conta que a ideia de montar a empresa surgiu durante seu mestrado. ;Na época, eu fazia o uso de anticorpos em minhas próprias pesquisas e tinha muita dificuldade para obter material de qualidade vindo de outros países. A produção em larga escala nesses locais não é comum;, afirma. Para a especialista Andrea Heimann, sócia da Proteimax, a grande vantagem da produção local é a obtenção de qualidade com baixos custos para os clientes. Atualmente, a empresa possui 70 anticorpos de linha, além daqueles produzidos por encomenda. ;Nossa linha é dirigida para receptores acoplados à proteína G. Hoje, 60% dos remédios agem acoplados à essa proteína. Por esse motivo, nossos produtos atingem as mais diversas áreas de pesquisas, voltadas para o tratamento de doenças como câncer, hipertensão e obesidade;, diz a responsável pela empresa idealizada há 10 anos pelo professor Emer Suavinho Ferro, do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo (USP). Há cerca de cinco anos, a Proteimax conseguiu captar recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) para o desenvolvimento em larga escala de anticorpos policlonais (1) específicos. O desenvolvimento dos projetos trouxe visibilidade internacional à empresa, que acabou firmando contratos com instituições estrangeiras, como a Universidade Hebraica de Jerusalém. Hoje, a empresa tem como principais clientes laboratórios de pesquisa de universidades e indústrias farmacêuticas. Doenças As pesquisas dessas empresas também podem ajudar no combate de doenças que afetam o homem. A Rheabiotech trabalha atualmente em um projeto que busca o desenvolvimento de um anticorpo capaz de diagnosticar e prognosticar doenças autoimunes, como a esclerose, a doença celíaca e artrites. ;A segunda etapa desse projeto consiste na humanização de anticorpos para fins terapêuticos. Porém, é preciso lembrar que são outros procedimentos e desenvolvimentos. É necessário fazer de uma forma com que não haja rejeição por parte do organismo do indivíduo. O projeto já foi aprovado e as pesquisas terão início dentro de um ano;, prevê Fernanda. Já a Proteimax fechou recentemente uma parceria com a especialista do ICB Edna Kimura para a caracterização interna dos anticorpos que reconhecem alvos específicos em diferentes tipos de câncer. ;O histórico de sucesso na formação de equipes com competências científicas e empresariais, para a produção de anticorpos especiais, é o diferencial estratégico da nossa empresa. O fator é importante para sua inclusão no mercado brasileiro e mundial;, afirma Andrea. 1 - R$ 1 mil por ml Há dois tipos de anticorpos: o monoclonal, um único tipo de anticorpo dirigido contra uma determinada proteína, e o policlonal, a mistura de vários tipos de anticorpos. Ambos podem ser produzidos em laboratório. Em média, os monoclonais demoram 60 dias para ficarem prontos e são produzidos a partir de camundongos. Já os policlonais são feitos a partir do sangue de coelhos e levam 90 dias para serem produzidos. Segundo Fernanda Rojas, esses animais, que precisam ser sacrificados no fim do processo, são escolhidos devido à variabilidade genética e ao grande volume de anticorpos que possuem. Em geral, cada processo resulta na produção de 50ml de anticorpos, vendidos, geralmente, em frascos de 1ml. No exterior, cada vidrinho chega a valer R$ 1 mil. Ouça entrevista com a pesquisadora Fernanda Alvarez Rojas

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