Ciência e Saúde

Internet vira espécie de consultório médico, mas erros de informação são comuns e perigosos

Paloma Oliveto
postado em 09/05/2010 08:57
Ao digitar a palavra hipertensão no Google, o mais popular programa de buscas na internet, aparecem 1,2 milhão de páginas em que o nome da doença é citado. Também há anúncios relacionados ao assunto ; um deles prometendo a cura da impotência sexual. Na lista de resultados, há páginas do Ministério da Saúde, de hospitais, de estudos científicos e da sociedade médica especializada em hipertensão. Porém, em meio às informações de fontes seguras, a pessoa que faz a busca corre o risco de ler textos elaborados por leigos, sem qualquer fundamentação teórica. Como, por exemplo, o conselho de se misturar remédio a uma fórmula feita com alho e azeite de oliva.

A rede mundial de computadores tornou-se uma interminável e bem acessada enciclopédia de termos médicos. No Brasil, de acordo com uma pesquisa do Comitê Gestor da Internet, 39% dos usuários usam a web para procurar informações relacionadas à saúde, sendo que o percentual sobe para 60% quando se consideram apenas os quem têm nível superior. Embora reconheçam a utilidade da internet na democratização da medicina, especialistas também se preocupam com a qualidade e o uso que se faz das informações.

;Não há a menor dúvida de que a internet contribui para a informação. O médico que não souber o que está acontecendo na área pode passar por um grande constrangimento, porque o paciente vai chegar ao consultório atualizado;, acredita Reginaldo Albuquerque, clínico-geral e endocrinologista do Exame Medicina Diagnóstico/Dasa e editor do site www.diabetes.org.br, da Sociedade Brasileira de Diabetes. ;Mas nada pode substituir a relação entre médico e paciente. Algumas pessoas, por exemplo, querem checar a opinião de seu médico com a do site. Isso é perigoso. Há muita informação na internet, como a que adoçante dá câncer, que se pode jogar no lixo;, alerta.

A funcionária pública Zenaide Gonçalves da Silva Ramos, 44 anos, chega a dizer: ;Confio mais no ;Dr. Google; do que nos médicos;. Ela usa o programa para fazer todo o tipo de buscas ; é a página inicial do computador ;, mas reconhece que saúde é o tema de que mais gosta. ;Procuro desde o que vai aparecendo de novidades até dúvidas que tenho. De uma dor no pé a casos de doenças mais complexas;, conta Zenaide, que é a buscadora oficial de assuntos médicos da família. ;Se, por exemplo, o dermatologista me passar uma receita, eu entro na internet para pegar informações sobre as propriedades dos ingredientes e ver outras opiniões, para ter certeza de que posso usar mesmo;, conta.

Zenaide usa o buscador até para interpretar exames. ;Fico tentando decifrar. Chego no médico e já vou falando tudo que tenho;, afirma. Para ela, o tempo de espera para conseguir marcar uma consulta é algo que estimula comportamentos parecidos. ;Se você tem infecção urinária, faz o exame, que demora sete dias para ficar pronto, por exemplo. Até lá, você já foi ao Google, achou o remédio e resolveu o problema.; Apesar da confiança depositada na internet, ela diz que procura filtrar apenas as boas informações. ;Na minha família, já teve caso da pessoa ter um sintoma e o Google a levar a pensar que estava com uma doença seríssima. A pessoa tem que filtrar, se não fica em pânico mesmo;, diz.

Neurose
O presidente da Associação Paulista de Medicina e diretor da Associação Médica Brasileira, Jorge Carlos Machado Curi, alerta que esse tipo de episódio é comum. ;A pessoa conclui apressadamente que tem uma determinada doença. Começa a ver tanta coisa que fica psicótica e neurótica, avidamente procurando informações e achando que tem tudo;, afirma. ;Hoje, com tantas informações, até os médicos têm dificuldades de separar o joio do trigo. Imagine para o leigo. Um risco é de, ao escolher o caminho errado, a pessoa acabar até retardando o diagnóstico de uma doença real. Ou então o contrário, passar muito tempo achando que tem algo que não existe;, afirma.

A administradora Vanessa Holanda Timoteo da Silva, 26 anos, é adepta das consultas online e até mesmo da automedicação. ;Normalmente, se estou com algum sintoma, faço a busca para ver o que posso ter ou procurar algum remédio, desses que não são controlados, ou receitas caseiras de remédios;, conta. Ela afirma que nunca teve nenhum problema adverso por causa das fórmulas ;receitadas; pela internet.

Curiosa, a administradora gosta de tentar decifrar os resultados de exames na web. ;Adianta bastante, nunca levei nenhum susto com os resultados. Confio 90% do Google;, diz. O clínico-geral Reginaldo Albuquerque, porém, adverte que é muito perigoso o leigo tentar interpretar exames. ;O exame, por si, não faz diagnóstico de nada. É um número que pode ter significados diferentes dependendo do estado do paciente, dos sintomas e do exame clínico, realizado pelo médico;, explica.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação