Ciência e Saúde

Líder da pesquisa não esconde otimismo

postado em 21/05/2010 13:25

O cientista norte-americano Daniel G. Gibson parece um predestinado. Ele e sua equipe de colegas do J. Craig Venter Institute ; centro de pesquisas sediado em Rockville (Maryland) ; já haviam conseguido duas façanha: a conclusão do genoma humano e a criação do primeiro genoma de bactéria sintética. Por 15 anos, Gibson sonhava em construir uma vida sintética. A façanha anunciada ontem tornou esse sonho uma realidade que estremeceu a comunidade científica e já lança luz sobre as possibilidades de uma nova ;revolução industrial;. Ao produzir a primeira célula sintética autorreplicante de uma bactéria, o J. Craig Venter Institute abriu a possibilidade para a criação de medicamentos mais eficientes e compostos químicos revolucionários, e para o entendimento sobre o funcionamento celular. Em entrevista exclusiva ao Correio, por telefone, Daniel Gibson, principal autor da pesquisa publicada ontem pela revista Science, explicou como realizou o estudo e detalhou as principais dificuldades do projeto. Mesmo com a típica cautela dos cientistas, ele não deixou o otimismo de lado. ;Esperamos produzir células sintéticas com propriedades extraordinárias;, declarou, após admitir a importância do experimento.

Entrevista Daniel G. Gibson

O que a construção de uma célula sintética e autorreplicante de bactéria representa para a ciência? Qual é a importância dessa façanha?
Trata-se de um experimento muito importante, que mostra que podemos começar com um código de DNA em um computador e transformá-lo em um código de DNA da vida, por meio da síntese em laboratório. Nós pegamos os genes da célula chamada de Mycoplasma mycoides, que estava em uma base de dados no computador, e realizamos algumas modificações. Acrescentamos algumas %u201Cmarcas d%u2019água%u201D sequenciais para transfornar alguns genes. E, ao sintetizar esse genoma %u2014 com mais de 1 milhão de pares-bases %u2014, fomos capazes de transplantá-lo em células de um recipiente de Mycoplasma capricolum. E, então, ela se transformou em uma Mycoplasma mycoides sintética.

Quais foram as principais dificuldades da pesquisa?
Ao iniciarmos esse projeto, em 2004, quando a maior parte do DNA havia sido sintetizada em laboratório, os únicos genomas sintéticos completos eram de vírus. As maiores estruturas de DNA até então sequenciadas em laboratório tinham apenas 32 mil pares-bases de comprimento. Tivemos que desenvolver novos métodos para sintetizar genomas de bactérias. Esse foi um dos principais desafios. Mas também tivemos que aprender não apenas como transplantar o genoma nas células, mas introduzir essas sequências nas células de um recipiente de Mycoplasma capricolum, de forma que transformassem em células de Mycoplasma mycoides. Sabíamos que genomas sintéticos eram mais comuns na levedura. O que tivemos de fazer foi desenvolver novos métodos para pegar genomas da levedura e transplantá-los. O problema é que quando você transplanta genomas de levedura no capricolum, ela se degrada.

Que benefícios essa descoberta deve trazer para a humanidade?
O que nós fizemos, por enquanto, foi realmente um experimento de prova de princípios. Agora, poderemos desenvolver organismos mais úteis. Podemos desenhar células artificiais e produzir fármacos. Sabemos que podemos fazer células com propriedades mais benéficas. O experimento também nos possibilita saber mais sobre a função dos genomas. Ao fabricar um gene essencial para a vida, podemos detalhar o que cada gene individualmente faz. E podemos entender como a célula funciona.

O senhor poderia citar mais aplicações práticas para o futuro?
No futuro, esperamos produzir células sintéticas com propriedades extraordinárias. São células que podem resolver o problema da energia no mundo, produzir compostos industriais para limpar o carbono da atmosfera e a água e fabricar produtos farmacêuticos. Há muitas coisas que podem acontecer. Por enquanto, é uma prova de princípios. Mas somos cientistas e temos a habilidade para fazer isso.

Quais os próximos passos dessa pesquisa? Como ela evoluirá nos meses seguintes?
Bem, agora estamos começando a reduzir o tamanho dos genomas desses organismos e produzir diferentes células sintéticas, com genomas mais reduzidos. Também estamos tentando evoluir para um próximo modelo: queremos ver se podemos transplantar genomas ainda maiores. Esse passo é importante, porque alguns dos organismos mais úteis são muito maiores que Mycoplasma mycoides.

Ouça, em inglês, trecho da entrevista com Daniel Gibson

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