Ciência e Saúde

Rumo a Marte, sem sair do lugar

Seis voluntários serão trancafiados amanhã em um simulador de estação espacial construído em Moscou. Durante 520 dias, eles serão monitorados e trabalharão como se estivessem participando de uma viagem ao Planeta Vermelho

postado em 02/06/2010 07:00
Testes da missão Mars 500 da Agência Espacial Européia ESAOs desafios que uma missão tripulada enfrentaria para chegar a Marte seriam inúmeros. Além de obstáculos como a radiação solar e as partículas de alta energia presentes na atmosfera do planeta, os astronautas precisariam suportar um confinamento de quase dois anos. Pois foi para verificar como uma equipe reagiria a uma viagem tão longa ; a distância a partir da Terra é de 220 milhões de quilômetros ; que a Agência Espacial Europeia (ESA) preparou a missão Mars 500. Amanhã, seis voluntários, sendo três russos, um chinês, um francês e um italiano, entram em uma estação de isolamento que simula os ambientes de uma estação espacial. Lá, permanecerão durante 520 dias, onde serão monitorados e submetidos a diversos testes físicos e psicológicos.

A Mars 500 vai recolher dados que poderão ajudar no planejamento de uma futura missão (1) a Marte. A unidade de isolamento foi construída em Moscou. Um grupo já passou 105 dias no módulo em 2009. Agora, uma nova equipe entra em ação para ficar trancafiada até outubro do ano que vem. ;O maior risco desse tipo de isolamento é psicológico;, explicou, em entrevista coletiva, Alexander Souvorov, chefe do projeto no Instituto dos Problemas Médico-Biológicos (IBMP), organizador da experiência com a ESA.

Uma missão a Marte pode ser comparada à aventura da expansão marítima de Portugal e Espanha realizada há mais de 500 anos, segundo José Leonardo Ferreira, professor do Departamento de Física da Universidade de Brasília (UnB) e doutor em ciências espaciais. ;Eles construíram melhores barcos para que a tripulação suportasse longas viagens à Índia;, compara, lembrando que o desafio é imenso, pois envolve também o retorno.

Na estação montada em Moscou, composta de quatro módulos (veja arte), os voluntários participarão de atividades como se estivessem em uma viagem especial de verdade. O ambiente conta com quartos individuais e pequenos confortos, como uma academia e uma horta. Um dos voluntários, Romain Charles, engenheiro de 31 anos, admitiu aos jornalistas que viver longe da realidade terrestre pode ser complicado. ;A relação com a família, a namorada e os amigos vai ser algo difícil de gerenciar a distância. E não haverá sol nem ar fresco. Não há janelas no módulo;, lembra.

Atividades diárias
Quando estiverem dentro da estação, os tripulantes terão contato de voz com uma central de controle e ocasionalmente com os familiares e amigos, como ocorre normalmente em missões no espaço. As atividades diárias serão divididas em oito horas de sono, oito de trabalho e oito de lazer. Para se divertir, a equipe pode levar itens pessoais como notebooks, filmes e livros. ;Estar confinado significa muitas limitações. A pessoa fica longe dos familiares, dos amigos, dos lugares que costuma frequentar, e perde referenciais importantes;, comenta Maraci Sant;ana, psicóloga clínica e especialista em terapia comportamental. Depois de 250 dias, o grupo será dividido. Três voluntários irão para o módulo que simula a superfície de Marte, para a avaliação dos efeitos de um pouso no planeta.

Uma missão real rumo ao Planeta Vermelho só deve ocorrer por volta de 2030. Tanto a ESA quanto a Nasa têm projetos. O novo programa espacial dos Estados Unidos, que ainda está sendo discutido no Congresso, deve deixar a Lua de lado e dar mais ênfase a Marte. Dessa forma, outras experiências como a Mars 500 devem ser realizadas até lá.

;Manter pessoas por meses em um ambiente fechado é um dos principais problemas de missões como essa. A convivência entre as pessoas é difícil, então é completamente necessário para os cientistas fazerem testes psicológicos prévios;, afirma José Leonardo Ferreira, da UnB. As possibilidades de erro devem ser minimizadas ao máximo. Em uma jornada desse tipo, não é possível trocar a tripulação ou voltar no meio do caminho. Quando algo dá errado, a situação precisa ser resolvida na hora, o que exige muito equilíbrio mental, lembra o astrofísico.

1 - Campanha
Um dos maiores defensores de uma missão tripulada a Marte é Buzz Aldrin, 78 anos, o segundo astronauta a pisar a Lua na histórica viagem de 20 de julho de 1969. Aldrin faz campanha para a exploração do Planeta Vermelho e chegou a enviar um projeto para o Congresso americano. ;Marte tem muito mais a oferecer ao homem do que a Lua. É o planeta mais semelhante à Terra encontrado até agora. Eu me preocupo com o ritmo lento da Nasa;, afirmou ao jornal espanhol El Mundo.

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