Ciência e Saúde

Vivendo e aprendendo a viver bem

A longevidade está na moda. Alcança marcas inéditas nos gráficos oficiais %u2014 com média de 72,8 anos de vida no Brasil %u2014, mas nada disso vale a pena se não houver conforto e qualidade, defendem especialistas

Paloma Oliveto
postado em 20/06/2010 12:00
Expulsos do paraíso, Adão e Eva perderam um dos maiores presentes oferecidos pelo Criador: a imortalidade. Desde então, o homem persegue a fórmula da vida eterna que, para os nórdicos, estaria escondida em uma maçã; na mitologia grega, na doce ambrosia; na crença chinesa, na mistura entre mercúrio e cinábrio. Mas, se até hoje ninguém descobriu a fonte da juventude, o fato é que, nas últimas décadas, a humanidade se aproximou deste sonho. Graças a avanços científicos, como o controle de doenças e a melhoria no saneamento básico, hoje vive-se mais do que no passado, tendência que, de acordo com projeções demográficas (1), vai se intensificar.

[SAIBAMAIS]Mas a vida pode ser ainda mais longa ; e vivida com maior qualidade ;, garantem especialistas de uma área médica que cada vez mais ganha adeptos no mundo: o antienvelhecimento. Apesar do nome, não se trata de estética. O conceito está relacionado à saúde. Viver mais de 100 anos, ficar livre de doenças, manter o cérebro em forma, adquirir mais condicionamento físico, ter mais disposição, lidar bem com o estresse e sentir-se permanentemente jovem ; são esses os principais objetivos da especialidade, de acordo com o americano Mark Liponis, clínico-geral do Canyon Ranch Health Resorts, uma rede de spas dos Estados Unidos voltada à medicina preventiva.

Liponis é autor do best-seller Ultralongevidade, na lista dos mais vendidos do The New York Times, que chegou agora ao Brasil pela editora Sextante. A principal teoria dele é a de que o envelhecimento é uma doença. O médico acredita que o natural seria que as pessoas passassem dos 100 anos sem as mazelas associadas à idade avançada, como problemas cardíacos, reumáticos e endócrinos, entre outros. ;Envelhecer não é uma consequência natural do fato de vivermos muitos anos. Na natureza, há uma série de organismos que têm uma vida longa sem mostrar nenhum sinal de envelhecimento;, diz o autor.

Sete segredos
Liponis, que começou suas pesquisas depois de diagnosticado com um câncer renal, afirma que os sinais geralmente atribuídos à velhice são causados, em grande parte, pelos distúrbios do sistema imunológico. Por isso, ele defende um programa de sete passos ; ;respire, coma, durma, dance, ame, relaxe, fortaleça-se; ; que ajudariam o organismo a controlar seu mecanismo de defesa. ;É evidente que esse sistema (imunológico) tem que fazer todo o possível para melhorar nossas chances de sobrevivência;, lembra. Quando se sente ameaçado, o corpo desencadeia reações para combater os agressores. ;Acontece que toda essa atividade tem um custo: o dano colateral decorrente de uma guerra imunológica. O corpo fica enfraquecido pela ameaça em si e pela resposta dada a ela;, esclarece.

Em entrevista ao Correio, Mark Liponis, que garante seguir diariamente os próprios conselhos, lembra que o aumento da expectativa de vida, por si só, não é vantajoso. ;Não queremos pessoas vivendo mais, porém, doentes. Queremos que elas vivam mais e com saúde;, afirma. Para ele, a chave de controle do sistema imunológico, que levaria à longevidade com qualidade, está na dieta, na atividade física e no comportamento do indivíduo. ;A ciência está começando a entender como os exercícios que fazemos, os nutrientes que ingerimos, o humor, a alegria e a satisfação afetam nosso sistema imunológico;, comenta.

Além de abandonar os maus hábitos, como o excesso de consumo de gordura e o sedentarismo, o médico defende uma mudança emocional para garantir os longos e bons anos a mais pela frente. ;Ter uma vida social melhora a saúde e a longevidade;, garante Liponis, com base em um estudo publicado no periódico especializado Epidemiology. A pesquisa, que acompanhou por três anos 2.575 adultos com mais de 65 anos, mostrou que o índice de óbitos foi mais alto entre os que se isolavam.

1 - Estatística
De acordo com o IBGE, a expectativa de vida, em todo o mundo, foi de 67,2 anos em 2008, sendo que, no Brasil, é de 72,8 anos. O país onde se vive mais é o Japão (82,6 anos). A expectativa dos brasileiros cresceu mais de 30% desde a década de 1960.


Em busca do tempo perdido

Luiz Mendes Garcia

Depois de mais de seis décadas de vida sedentária, Narme Gomide, 70 anos, matriculou-se em uma academia, por insistência dos filhos. Passados quatro anos, a atividade virou vício. ;Adoro vir para a academia. O que mais gosto é o convívio social;, conta Narme, que faz aulas em uma turma voltada à terceira idade da Companhia Athletica, no Lago Sul. ;São pessoas com a mesma faixa etária, a gente se completa socialmente. Se tem um filme bonito, estão todas lá. Se tem uma festa de aniversário, vamos todas. A autoestima, sem dúvida, fica elevada. Não ficamos mais dependentes dos filhos para sair;, vibra. Assim como Liponis, ela defende que o importante não são os anos a mais: ;Não me preocupo com isso. O importante é ter qualidade;, ensina.

Segundo o médico brasileiro Augusto Vinholis, um dos maiores especialistas em longevidade do país, o homem deveria viver até os 126 anos. A matemática é a mesma aplicada a qualquer mamífero, cuja expectativa de vida é calculada multiplicando-se por seis a idade adulta. Um cachorro, exemplifica Vinholis, atinge a maturidade aos 2,5 anos. Por isso, esses animais vivem, em média, 15 anos. O mesmo acontece om o cavalo, que fica adulto aos 4 anos e 2 meses e tem expectativa de vida de 25 anos. ;Quando um cachorro morre aos 10 anos, as pessoas dizem ;Coitado, morreu cedo;. Mas se uma pessoa morre aos 80, elas dizem: ;Ah, estava velhinho, está bom;. Temos mania de morrer cedo;, brinca Vinholis.

Os três ciclos
A conta que ele faz é a mesma da medicina tradicional chinesa, que divide a vida em três ciclos, sendo que o último deveria ocorrer entre os 84 e os 126 anos. Para chegar lá, Vinholis defende um programa de desintoxicação do organismo, começando pela alimentação. Autor do livro A dieta ideal, que será lançado em Brasília em 5 de julho, o médico combate a alimentação básica do brasileiro, composta principalmente de carboidratos simples e muita gordura. ;A pessoa como arroz branco, bife acebolado, coxinha frita no óleo velho, toma café o dia todo e, à noite, toma sopa de macarrão com pão, assiste à televisão e vai dormir. Quando chega aos 40 anos, o fígado, o pâncreas e o intestino não aguentam mais. E aí surgem os problemas;, resume o médico.

A mudança na alimentação foi uma das tarefas que o aposentado Luiz Mendes Garcia, 74 anos, teve de seguir, depois de sofrer um enfarto, há 10 anos, quando caminhava no Parque da Cidade. ;Mudei completamente minha alimentação. Hoje como muita salada e legumes, e é sem óleo, pois só uso azeite e tomo um vinhozinho de vez em quando, por recomendação médica;, diz. Além disso, ele frequenta a academia cinco vezes por semana, durante mais de três horas diárias. O resultado do empenho aparece nos exames médicos: ;A cada quatro meses, vou ao cardiologista. A última foi na segunda-feira passada. Ele disse que estou ótimo;, garante.


Entrevista - Mark Liponis

;Queremos pessoas que vivam mais e com saúde;

Autor do best-seller Ultralongevidade, o médico Mark Liponis virou celebridade nos Estados Unidos, onde participa de diversos programas de televisão e rádio para divulgar a medicina preventiva, da qual é considerado um dos maiores especialistas americanos. Há 12 anos, então com 37, ele foi diagnosticado com câncer renal e resolveu investigar como os fatores ambientais influenciam na incidência do tumor maligno. A partir daí, passou a se debruçar sobre pesquisas que poderiam prevenir o surgimento de doenças e encontrou no sistema imunológico a base de uma vida mais longa e mais saudável. Em entrevista ao Correio, Liponis lembra que não basta viver mais, mas é preciso que a saúde acompanhe esses anos extras.

Em países em desenvolvimento como o Brasil, muitos especialistas argumentam que o envelhecimento é uma questão negligenciada. O senhor acredita que este é um problema global?

Como o padrão de vida está aumentando por todo o globo, o envelhecimento e as doenças decorrentes dele estão se tornando questões muito mais importantes. Veja, por exemplo, os custos exorbitantes da saúde nos Estados Unidos. Isso é um resultado direto da melhoria da qualidade de vida, que, por sua vez, aumenta a expectativa de vida, resultando no custo maior para o tratamento de doenças inerentes ao envelhecimento, como mal de Alzheimer, diabetes, artrite, problemas cardíacos e câncer.

Quais os benefícios sociais da longevidade? Por outro lado, o senhor acredita que também há aspectos negativos?

Nós precisamos melhorar nossa expectativa de saúde, e não apenas a expectativa de vida. A expectativa de saúde é um indicador de quantos anos vivemos de maneira saudável, enquanto que a outra mede apenas o tempo a mais de vida. Não queremos pessoas vivendo mais, porém, doentes. Queremos que elas vivam mais e com saúde, ou, como dizemos nos Estados Unidos, vivendo mais jovem por mais tempo (living younger longer). À medida em que pudermos ampliar a expectativa de vida saudável, não teremos desvantagens na longevidade.

Existe atualmente algum estudo científico sobre longevidade que, para o senhor, pareça promissor?

Para mim, a área de pesquisa mais promissora agora é a que nos ensina a melhorar o sistema imunológico. É o nosso próprio sistema de defesa, e quando aprendermos a controlá-lo, teremos a oportunidade de eliminar doenças como mal de Alzheimer, diabetes, artrite, problemas cardíacos e câncer. A ciência está apenas começando a entender como coisas como a nossa dieta, os exercícios que fazemos, os nutrientes que ingerimos, o humor, a alegria e a satisfação afetam nosso sistema imunológico. Acredito que logo a ciência vai aprender como efetivamente ampliar a expectativa de vida e a expectativa de saúde de forma bastante significativa, a partir do controle de diferentes aspectos do sistema imunológico.

O senhor acredita que, para viver mais de 100 anos, as pessoas estão dispostas a abandonar maus hábitos, como a ingestão exagerada de gordura e o sedentarismo?

Esse é o desafio. A maioria das pessoas não está disposta a abrir mão de seu estilo em troca de mais 30 anos de vida. Poucas são disciplinadas, determinadas e prontas para receber essa gratificação. Mas o verdadeiro motivo de adotar hábitos saudáveis é, na verdade, viver melhor agora. Quando o indivíduo adota princípios de alimentação, atividades físicas, ingestão de vitaminas, controle do estresse, melhoria da qualidade do sono e dos relacionamentos, ele se sente melhor imediatamente ; mais vivo, com mais energia, mais jovem e com mais energia. Essa é a grande e imediata recompensa.

Quais os principais inimigos da longevidade?
É uma questão importante. Os principais são inflamações, autodepreciação, falta de disciplina e mau humor. Otimismo, visão positiva e autoestima elevada nos ajudam a persistir nos hábitos saudáveis, e são eles que nos conduzem à longevidade. Isso significa não fumar, não comer nem ingerir álcool excessivamente, assim como se exercitar diariamente, descansar e comer uma saudável e colorida salada.

O senhor segue os sete passos do programa que criou?
Sim, sempre que possível. Tento aderir à regra do 90-10; isto quer dizer que tento fazer as escolhas saudáveis e aderir a meu programa de saúde pelo menos 90% do meu tempo. Tenho tido sucesso e, nos últimos 12 anos, me exercitando e me alimentando de forma saudável. Até agora, está dando certo.

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