Ciência e Saúde

Luz contra a dengue

postado em 24/06/2010 07:15

Ministério da Saúde recomenda não deixar água acumulada em pneusO Brasil poderá em breve contar com uma das alternativas mais eficientes e rápidas para diagnosticar a dengue e barrar a epidemia de uma das doenças que mais tem feito vítimas no país nos últimos anos. Pesquisadores do Laboratório de Virologia da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP/USP) desenvolveram um método pelo qual se substitui o uso de seringas e agulhas para coletar o sangue por saliva e urina.

Segundo a técnica, que já foi testada com sucesso em laboratório, mas não em humanos, ao contrário do exame tradicional, não é preciso esperar pela reação dos anticorpos no sangue do paciente, pois o novo método detecta o vírus antes desses anticorpos começarem a agir. Uma das vantagens é que o resultado com o diagnóstico pode sair em três horas. ;Assim, o paciente já pode começar o tratamento, em vez de esperar até dez dias pelo resultado do exame;, afirma o virologista Victor Hugo Aquino Quintana, coordenador do estudo.

Dados do Ministério da Saúde mostram que a dengue ocorre com maior incidência nas regiões Nordeste e Sudeste. Principalmente nos estados mais atingidos pela doença, como Rio de Janeiro, Bahia e Mato Grosso, entre outros, o volume de repetidas campanhas educativas sobre a sua prevenção já criou uma cultura do saber. Ou seja, as populações sabem como se defender do mosquito transmissor, porém, a falta de um diagnóstico rápido e preciso faz com que o número de óbitos se constitua uma das principais preocupações das autoridades sanitárias. Em 2009 morreram 298 pessoas das 8,2 mil contaminadas, segundo a Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde

Mas agora surge uma nova possibilidade de combate à doença com a pesquisa da USP de Ribeirão Preto, o que poderá preencher essa lacuna. ;A saliva e a urina são substâncias mais fáceis de lidar quando se está trabalhando com crianças e pacientes internados;, justifica Aquino Quintana. No caso da dengue, o que possibilita sua detecção na saliva e na urina é o fato de que o vírus se instala em qualquer célula do organismo.

Demora de risco
Os exames mais comuns para o diagnóstico da dengue precisam de uma amostra de sangue para serem analisados em laboratório. O mais utilizado na rede pública demora até dez dias para dar o diagnóstico. ;Isso acontece porque este exame tem com finalidade a procura do anticorpo que vai combater a doença, não o vírus;, explica o médico.

Quando o mosquito pica uma pessoa, o vírus entra na corrente sanguínea, busca uma célula, se multiplica e rapidamente se espalha pelo corpo. Mas a ação dos anticorpos só vai ocorrer entre sete e 10 dias depois de a pessoa ficar doente. Antes disso, a produção vai ser muito baixa, o teste não vai detectar e pode dar um resultado falso negativo. ;Essa demora já é tempo suficiente para o quadro piorar;, afirma o virologista.

A técnica
Para chegar ao vírus diretamente, os pesquisadores utilizam um aparelho que emite fluorescência ao detectar o seu genoma (veja arte), o termociclador. Funciona da seguinte maneira: os pesquisadores retiram parte da sequência genética do vírus.

Como essa sequência já é conhecida, os cientistas a sintetizam em laboratório: ;É como se fosse um jogo de cruzadinhas, quando se consegue descobrir a palavra que falta apenas com algumas letras a mais, já que se sabe parte da sequência;, exemplifica o líder do estudo.

Em seguida, essa combinação, com um agente fluorescente, é inserida no genoma do vírus. ;Se emitir fluorescência, é o vírus da dengue;, afirma Quintana. Outra vantagem desse método é que ele pode demonstrar a quantidade de vírus no organismo e dessa forma diagnosticar se a doença está ou não na sua fase grave.

;O aparelho mede a fluorescência. Quanto mais vírus tiver, mais forte será essa fluorescência;, informa o virologista. Segundo ele, não existe um diagnóstico que quantifique a carga viral da dengue. ;Com o desenvolvimento desse método podemos saber a quantidade de vírus que circula no organismo do indivíduo, evitando, por exemplo, que a dengue evolua para sua fase hemorrágica;, disse o virologista.

Aplicações em outros males
O novo método de diagnóstico pode vir a ser um reforço na luta que muitas cidades brasileiras travam contra as sucessivas epidemias de dengue no país. ;Não queremos substituir o exame de sangue, apenas estamos propondo uma alternativa mais precisa e menos dolorosa para o diagnóstico;, pondera Quintana.

Contudo, não é apenas o vírus da dengue que pode ser detectado por meio desse aparelho, chamado no Brasil de termociclador. Qualquer infecção viral, parasitária, bacteriana ou fúngica pode ser encontrada. Em 2009, tal aparelho foi utilizado para detectar o Influenza A, quando a doença estava em vias de se tornar uma epidemia. ;O termociclador é usado em pesquisas nos grandes laboratórios e não está disponível para o diagnóstico fora do âmbito científico;, lamenta Quintana.

Tereza Furlan, biomédica e consultora científica de uma empresa de diagnósticos comemora os resultados da pesquisa, mas acha muito difícil o uso do aparelho se tornar popular nos exames. ;Isso vai demandar treinamento especializado de pessoas para lidar com o método. Atualmente, não temos essa mão de obra disponível.;

Já Quintana diz que implementar termocicladores na saúde pública seria a solução. ;Estamos fazendo nossa parte, usando a ciência para o benefício da sociedade. Quem estiver interessado no nosso método certamente vai nos procurar;, conclui o virologista.

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