Ciência e Saúde

Resistência masculina a cuidados médicos rotineiros colabora para que os brasileiros vivam, em média, sete anos menos que as mulheres

Política federal de atenção à saúde do homem, criada em 2009, luta para se fortalecer

Paloma Oliveto
postado em 11/07/2010 07:00
Na agenda do homem, parece nunca sobrar espaço para uma consulta. Médico, só quando a dor já se tornou insuportável. Não à toa, eles morrem, em média, sete anos antes das mulheres que, mais precavidas, costumam se submeter a avaliações periódicas de saúde . ;É uma questão cultural. O homem ainda se sente superpoderoso;, resume o presidente da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), Modesto Jacobino.

Política federal de atenção à saúde do homem, criada em 2009, luta para se fortalecerAlém das doenças comuns aos dois sexos, uma série de outras enfermidades podem aparecer ao longo da vida do homem: de fimose, na infância, ao câncer de próstata, na idade adulta. Sem contar os distúrbios sexuais e as doenças cardiovasculares, que ainda acometem mais o sexo masculino e são a principal causa de óbitos no Brasil.

Jacobino, porém, comemora o fato de o país já ter uma política nacional de saúde do homem, lançada em 2009, com objetivos ambiciosos, como aumentar em até 20% o número de ultrassonografias de próstata até o ano que vem, incrementar o repasse de procedimentos urológicos e familiares aos municípios e atender, pelo menos uma vez em cada 12 meses, 2,5 milhões de homens entre 20 e 59 anos na rede pública ; um percentual de consultas 5% maior do que o atual.

;A resistência masculina à atenção primária aumenta não somente a sobrecarga financeira da sociedade, mas também, e, sobretudo, o sofrimento físico e emocional do paciente e de sua família, na luta pela conservação da saúde e da qualidade de vida dessa pessoa;, justifica o texto do Ministério da Saúde que institui a política de atenção integral à saúde do homem.

A SBU está empenhada em apoiar o ministério no desafio. No fim do mês passado, a entidade apresentou seis propostas ao ministro José Gomes Temporão, para serem incluídas na política de saúde do homem. O projeto prevê seis linhas prioritárias: oferecer 10 mil vasectomias voluntárias, qualificar 32 mil equipes do programa Saúde da Família nos temas doenças sexualmente transmissíveis, câncer de próstata, câncer de pênis e planejamento familiar; realizar 10 mil cirurgias de próstata em cidades das regiões Norte e Nordeste; treinar médicos para fazer biópsias de próstata; promover campanhas nacionais de conscientização e organizar um fórum nacional da saúde masculina.

Coração

Os homens de 25 a 59 anos correspondem a 41,3% da população masculina e são 20% do total de brasileiros. Nesse grupo, considerado estratégico pela política de atenção integral à saúde do homem, 75% das enfermidades se concentram em cinco áreas: urologia, cardiologia, saúde mental, gastroenterologia e pneumologia. Os indicadores de mortalidade mostram que, depois de causas externas (violência e acidentes), os óbitos do sexo masculino devem-se às doenças do aparelho circulatório, aos tumores, aos males do aparelho digestivo e, por último, às enfermidades do aparelho respiratório.

;As doenças coronarianas são responsáveis por dois terços dos casos de mortes entre os homens;, afirma o cardiologista José Roberto Melo Barreto Filho, do Instituto do Coração, em Taguatinga. Ele alerta que os principais fatores de risco são o histórico familiar, a elevação da pressão arterial, o diabetes e o tabagismo. ;Mas o principal é se houve um caso de morte súbita na família;, diz. De acordo com o médico, está aumentando o número de pessoas com mais de 35 anos que morrem em consequência de ataques cardíacos. Barreto Filho explica que, por isso, é preciso fazer avaliações cardiológicas todos os anos a partir dessa idade.

Assim como as mulheres já fazem, durante todas as etapas da vida, o homem precisa fazer visitas regulares ao médico para evitar males como tumores e problemas cardiológicos. Veja quais as doenças mais comuns no sexo masculino:

Infância

Enurese noturna
; é a micção involuntária durante o sono, em crianças sem anomalias, que já possuem o controle urinário diurno. Há várias causas envolvidas, principalmente a hereditariedade. Os tratamentos medicamentosos são indicados após os 8 anos.

Disfunção miccional
; são alterações miccionais na criança neurologicamente normal. Na maioria das vezes, ocorrem perdas urinárias diurnas e noturnas, podendo haver infecção urinária e constipação.

Hipospádia
; anomalia do desenvolvimento fetal masculino, caracterizada pela abertura da uretra fora do local habitual (extremidade da glande). O tratamento é sempre a correção cirúrgica, que deve ser realizada dos 6 meses aos 2 anos. Anomalia freqüente, ela acomete um em cada 125 meninos.

Fimose
; é a impossibilidade de retrair a pele do pênis (prepúcio) para expor a glande (cabeça). O tratamento é feito com cremes ou pomadas e, se não resolverem, a cirurgia é utilizada. Com 3 anos, 90% dos meninos conseguem retrair o prepúcio e expor a glande. Aos 17, cerca de 1% dos jovens permanecem com fimose. É uma das causas do câncer de pênis.

Criptorquidismo
; é a ausência do testículo na bolsa escrotal. Pode ser uni ou bilateral. Na maioria das vezes, o testículo fica retido na região inguinal ou abdominal, mas pode ocorrer a agenesia (ter nascido sem). O tratamento pode ser realizado com medicamentos e, se não resolver, a cirurgia é necessária e deve ser realizada ao redor de 1 ano. Ocorre em 3 a 4% das crianças.

Hidrocele
; presença de líquido no escroto. Na maioria das vezes, regride espontaneamente até o primeiro ano de vida. Quando não regredir ou for muito grande, a cirurgia é necessária. Ocorre em cerca de 6% dos meninos.

Infecção urinária
; causa dor e ardência ao urinar, aumento de freqüência e indisposição. Toda criança com febre inexplicável deve realizar um exame de urina. Acomete de 2 a 3% das crianças e é a segunda causa de infecção bacteriana da infância, só superada pelas vias aéreas superiores.

Adolescência

Tumores no testículo ; o câncer de testículo é o tumor mais prevalente nos homens jovens na idade de 15 a 35 anos de idade, apresentando alta possibilidade de cura na fase inicial, com tratamento à base de quimioterapia e/ou radioterapia. O auto-exame do testículo é fundamental para o diagnostico precoce.

Torção de testículo ; emergência cirúrgica com maior incidência entre 13 e 18 anos. A torção pode levar a uma deficiência na irrigação arterial do órgão, o que pode causar isquemia e necrose tecidual. O tempo é crucial para a recuperação do testículo, sendo que é possível recuperar o órgão em até seis horas.

Varicocele ; É uma dilatação anômala do plexo venoso pampiniforme (veias do testículo), responsável pela drenagem venosa do testículo. Está presente em torno de 15% dos adolescentes, incidência semelhante aos indivíduos da fase adulta. Cerca de 40% dos homens com alterações da fertilidade são portadores dessa patologia. Sua ocorrência deve-se a uma insuficiência de válvulas venosas do plexo venoso (conjunto de veias) testicular.

Trauma urológico ; no Brasil, morrem 75 mil pessoas decorrente de trauma a cada 18 meses. Cerca de até 90% desses indivíduos são jovens de até 29 anos. O trauma renal é o mais comum entre as afecções traumáticas urológicas, respondendo por cerca de 1 a 5% de todos os traumas, e acomete os homens três vezes mais que as mulheres.



Idade adulta e velhice

Infertilidade ; acomete cerca de 15% dos casais e em metade dos casos de casais inférteis existe um fator masculino que contribui para a dificuldade de concepção.

Disfunções sexuais ; compreendem dificuldades de ereção e alterações da ejaculação, sendo a mais comum a ejaculação precoce. Problemas de ereção aumentam com a idade, especialmente pelo aparecimento de doenças sistêmicas como hipertensão, diabete e doenças cardiovasculares, além de hábitos nocivos como tabagismo e sedentarismo

Prostatite (inflamação ou infecção da próstata) ; é uma doença que atinge de 2% a 10% dos homens . Fatores inflamatórios, imunológicos, neuropáticos e infecciosos são implicados como responsáveis pela constelação de sintomas que caracterizam o problema.

Litíase urinária (cálculos ou pedras) ; afeta preponderantemente adultos jovens, e os homens são de duas a três vezes mais afetados que as mulheres. A cólica renal, causada por cálculos que obstruem a passagem da urina, é uma das causas mais frequentes de atendimento em emergências hospitalares.

Hiperplasia de próstata (HPB) ; afeta praticamente todos os homens a partir da quarta década de vida. É causada pelo envelhecimento e pela presença do hormônio masculino, a testosterona. O aumento do volume prostático determina dificuldade à passagem de urina pela uretra, o que causa sintomas como dificuldade miccional, jato fraco, sensação de esvaziamento incompleto, aumento do número de micções e esforço para urinar.

Câncer de próstata ; é a neoplasia mais frequente no sexo masculino, representando mais de 40% dos tumores que atingem os homens acima de 50 anos. No Brasil, são 50 mil casos/ano. É assintomática e o diagnóstico precoce é realizado por meio de exames de sangue periódicos de PSA (Antígeno Prostático Específico) e do toque retal da próstata.

Câncer de pênis ; é um dos poucos cânceres evitáveis. A prevenção do tumor é realizada facilmente com a educação da população, com o cuidado de higiene, uso de preservativo nas relações sexuais para se evitar o HPV e a cirurgia de fimose ou exuberância de prepúcio na puberdade. Em casos graves, é preciso amputar o órgão e até mesmo os membros inferiores.

Câncer de bexiga ; É o segundo tumor urológico maligno mais comum. Sua manifestação mais frequente é sangue na urina (visível a olho nu ou detectado em exame de urina). O principal fator de risco para o desenvolvimento deste tumor é o tabagismo.

Câncer de rim ; É o terceiro tumor urológico mais frequente, e sua incidência vem aumentando nas últimas décadas. É mais comum em homens do que em mulheres, e é diagnosticado mais frequentemente após os 50 anos de idade.

Câncer de testículo ; é uma doença rara, e os índices de cura com o tratamento cirúrgico e quimioterápico são extremamente altos, especialmente quando diagnosticados em estágios iniciais.

Doença de Peyronie ; curvatura anômala do pênis. De causa desconhecida, a doença de Peyronie forma uma espécie de nódulo no pênis. Pequenos traumatismos durante o ato sexual são uma possível explicação para o problema. Este traumatismo seria seguido de uma cicatrização errônea. Atinge normalmente homens entre 40 a 65 anos.

Andropausa (DAEM ; Deficiência Androgênica do Envelhecimento Masculino) ; trata-se de uma diminuição gradual dos níveis sanguíneos da testosterona, que pode estar associada a uma significativa diminuição da qualidade de vida dos homens. A queda da testosterona começa em média a partir dos 40 anos. A prevalência deste distúrbio varia de 10% a 30% dos homens a partir dos 60 anos.

Doenças cardiovasculares -- principal causa de mortes no Brasil, esses males afetam mais os homens que as mulheres. Além do estilo de vida (estresse, sedentarismo, obesidade, abuso de álcool e cigarro), pesquisas ainda não conclusivas sugerem que baixos níveis de testosterona podem estar associados aos fatores de risco.

Síndrome metabólica -- é caracterizada pela associação de fatores de risco de doenças cardiovasculares (ataques cardíacos e derrames cerebrais), de doenças vasculares periféricas e da diabete. Também está associada à obesidade e ao sedentarismo. Para evitá-la, é preciso passar por avaliação médica regularmente, fazer exercícios e evitar álcool e cigarro.

Incontinência urinária ; perda de qualquer quantidade de urina, de forma involuntária. Pode vir acompanhada de forte desejo para urinar. Relaciona-se ao processo de envelhecimento, que leva à perda de capacidade da bexiga de armazenar urina.

Fontes: Sociedade Brasileira de Urologia, Laboratório Bayer, Arquivos Brasileiros de Endrocrinologia e Metabologia, e Ministério da Saúde

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