Alice Maciel
postado em 30/07/2010 09:56
Belo Horizonte ; Em sete expedições realizadas entre 2008 e 2009, cientistas encontraram espécies raras de plantas, peixes, mamíferos, aves, répteis e anfíbios no maior território de florestas tropicais intactas do mundo, com 4.245.819 hectares ; a Estação Ecológica (Esec) Grão-Pará, localizada na Calha Norte do Rio Amazonas, no Pará, um dos estados mais desmatados da Amazônia brasileira. A pesquisa, encomendada pela Secretaria do Meio Ambiente do estado, resultou em um relatório divulgado pelo Museu Emilio Goeldi (Mpeg) e pela Conservação Internacional (CI;Brasil) que, segundo a diretora do Programa Amazônia da CI, Patrícia Baião, vai orientar a exploração da região. ;O estado do Pará gerou um processo em que a ciência foi à frente do processo de desenvolvimento. Foram sete expedições biológicas, envolvendo cerca de 30 pesquisadores e técnicos. Eles desbravaram uma imensa região até então desconhecida e produziram um diagnóstico ambiental por meio de avaliações ecológicas rápidas;, ressaltou.Patrícia explicou que na Esec Grão-Pará existem pontos de altitude elevada para os padrões amazônicos, denominados platôs, que deram origem a um ecossistema específico e distinto de outras regiões da floresta. Foram registradas em todas as áreas pesquisadas espécies nunca antes descobertas e outras típicas de regiões afastadas dali, como o sopé dos Andes, por exemplo. O relatório apontou 143 espécies diferentes de peixes, 62 de anfíbios e 68 de répteis, até o momento. Também foram registradas 355 espécies de aves, 61 de mamíferos e 778 de plantas. Os exemplares são de grande interesse para a indústria, a pesquisa científica e a conservação ambiental.
Entre os animais encontrados na Esec, está um pequeno lagarto, com apenas quatro dedos nas patas (o usual são cinco), antes apenas conhecido no Amapá. Vários anfíbios até então registrados apenas nas Guianas foram vistos no norte do estado. Segundo os pesquisadores, um número impressionante de 70 espécies da avifauna observadas na Esec Grão-Pará podem ser consideradas de especial interesse para conservação, por serem endêmicas (só existem na região dos escudos das Guianas) ou raras, com distribuições locais na Amazônia. Entre as 17 espécies que tiveram seu registro ampliado, o destaque é para a Dacnis albiventris, comumente conhecida como o saí-de-barriga-branca, cujo registro inédito para o escudo das Guianas estende sua distribuição em mais de 1.000km, desde a região do Alto Tapajós, onde foi documentada na década de 1960.
O registro de ocorrência na Esec do Morphnus guianensis, ave conhecida como uiraçu-falso, gavião considerado quase ameaçado pela União Internacional pela Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais (IUCN, da sigla em inglês) também chamou a atenção dos pesquisadores. Das 61 espécies de mamíferos registradas, 21 (cerca de 34% do total) são consideradas de especial interesse para conservação, por seu status de endêmicas, ameaçadas de extinção ou ainda por não terem sido descritas pela ciência. A onça-pintada, a onça-parda, a ariranha e o tatu-canastra, inventariados na Esec, estão listados oficialmente como ameaçados de extinção no Brasil e no estado do Pará.
Os botânicos registraram 125 espécies de pteridófitas (grupo no qual são encontradas as samambaias e as avencas) e 653 espécies de fanerógamas (árvores com flores), das quais cinco são espécies consideradas como ameaçadas de extinção no estado do Pará: muirapuama, angelim, araracanga, maçaranduba e itaúba. Dentre o conjunto de plantas encontradas na Esec Grão Pará, os botânicos registraram também mais sete espécies consideradas em risco pela IUCN (2008) num contexto mundial.
Manejo
A partir desse levantamento, foi feito um plano de manejo para subsidiar a gestão desses territórios. ;Já existem projetos de exploração sustentável da região;, afirma Patrícia. Entre elas, a diretora do programa Amazônia apontou o potencial madeireiro, a extração da castanha e um estudo de Redd (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação) para mercados de carbono. ;Será feito um microzoneamento nessas áreas para guiar a exploração econômica;, explicou. A presença de espécies ameaçadas de extinção confere uma grande importância para essa unidade de conservação na preservação destes organismos e ressalta seu papel estratégico para a gestão dos recursos naturais. O estado do Pará possui um projeto para zerar as espécies em extinção do estado. ;São espécies muito importantes para ações de conservação;, afirma Patrícia.
A finalização do relatório sobre a Esec Grão Pará causou polêmicas e tem sido contestado por alguns ambientalistas. Entre as principais críticas, está a de que o levantamento é fraco e não apresentou realmente toda a região. Alexandre Aleixo, coordenador do levantamento de biodiversidade da Estação Ecológica Grão Pará e pesquisador associado do Museu Goeldi, defende seu trabalho, afirmando que essa a reserva ;é uma das poucas conservações onde foram realizadas mais de duas expedições; para levantar o seu inventariado. ;Isso porque a lei ambiental só exige duas expedições, uma na estação chuvosa e outra na estação seca.; O biólogo reconhece que ainda há muito a ser descoberto na região. No entanto, ele valoriza o esforço e o trabalho já feitos.
Outra questão que tem sido contestada, conforme Alexandre Aleixo, é a participação da multinacional mineradora Rio Tinto no consórcio que sustentou a pesquisa. Para o biólogo, no entanto, a relação da empresa com os pesquisadores foi totalmente profissional. Segundo ele, não houve nenhuma interferência externa que tenha influenciado o resultado do relatório. ;Verificamos um conjunto de vegetação extremamente diversificado e também encontramos espécies ameaçadas de extinção, que estão na lista do Ibama e do Pará. Qualquer plano de manejo aplicado nessa região tem que ser tratado de maneira especial.;