Ciência e Saúde

Depressão durante a gravidez pode influenciar a formação dos bebês

Especialistas ressaltam a importância de exercícios físicos e de relaxamento para uma gestação tranquila

postado em 31/08/2010 07:00
; Rayanne Portugal
Especial para o Correio

Juliana Galego, 28 anos, aguarda ansiosa a chegada da pequena Pietra, sua primeira filha. Ela acaba de completar a 29; semana de gestação e se prepara para a chegada da primogênita com meditação, ioga e exercícios físicos específicos para gestantes. O objetivo da empresária é manter o estresse controlado para que, antes e depois do nascimento, Pietra seja um bebê calmo e saudável. ;Sou muito agitada e a expectativa da chegada da primeira filha mexe com toda a família;, afirma Juliana. ;Acredito que meu bem-estar vai influenciar diretamente a qualidade de vida dela. Os exercícios de ioga e meditação que faço são fundamentais para dialogar com minha bebê. Quero que ela sinta todo o carinho e amor que tenho por ela e sinta-se bem-vinda;, explica.

A jovem mãe está certa em se preocupar com Pietra. A psicóloga Helena Morais, especialista em neonatologia, explica que o estresse já faz parte da rotina de grande parte das mulheres modernas, mas que, em excesso, afeta também a qualidade de vida do bebê antes mesmo que ele nasça. ;É normal estar ansiosa com a gestação. O estresse vai acontecer, principalmente porque a maioria das mulheres mantém uma rotina de trabalho e afazeres pesada. No entanto, quando a angústia é muito grande e a mãe não se sente feliz, esse sentimento negativo pode ser prejudicial para o bebê de diversas formas;, diz a profissional. Helena esclarece que depressão, problemas familiares, gestação indesejada ou na adolescência são alguns dos principais casos de estresse grave que afetam as mães.

O impacto do estresse da mãe durante a gravidez sobre a criança ainda não está totalmente compreendido. No entanto, sabe-se que a comunicação entre mãe e feto ocorre durante todo o período gestacional. Assim como as substâncias ingeridas pela mãe entram em contato com o bebê pelo cordão umbilical e pela corrente sanguínea, os impulsos psíquicos e químicos causados pelo estresse serão sentidos pelo bebê. Isso ocorre porque a instabilidade emocional da mãe provoca alterações neuro-hormonais e na pressão arterial.

Em quadros assim, o sistema nervoso da mãe passa a liberar em maior quantidade as chamadas substâncias catecolaminas, das quais a adrenalina é um exemplo. Essas substâncias passam pela corrente sanguínea até o bebê, provocando um estado de perturbação semelhante àquele vivido pela mãe. ;O feto entra em contato com sentimentos de temor e angústia. A tristeza profunda também faz com que a mãe se isole, mostrando-se pouco disponível. A comunicação entre mãe e filho se perde. A disponibilidade da mãe é fundamental para que ocorra o desenvolvimento psicoafetivo do indivíduo. Se o estado emocional da mãe não favorece a comunicação, ela deixa o bebê sozinho e inseguro;, explica Helena Morais. Em casos extremos, o hormônio cortisol, também liberado durante períodos de longo e forte estresse, ao chegar ao cérebro do feto, pode causar mudanças funcionais e estruturais.

Prazer
Para evitar o aumento exagerado de estresse, a mãe deve investir na própria qualidade de vida e na comunicação com o feto. ;Tirar alguns momentos do dia para conversar com o bebê, fazer alguma atividade física, relaxar, ouvir música, interagir afetivamente com a criança são coisas aparentemente simples, mas que influenciam diretamente na felicidade da mãe, e consequentemente, na do bebê;, explica a especialista.

A prática de exercícios é fundamental para a mãe. Daniela Rico, educadora física e responsável por um programa especializado no preparo para a gestação, explica que a atividade física, além de fazer com que a mãe se sinta mais ativa e saudável, libera substâncias que causam prazer: a serotonina e a endorfina. ;Elas vão ajudar a mãe na regulação do sono e do apetite, na redução do estresse e da ansiedade, prevenindo a insônia e a depressão.; Associada à sensação de bem-estar, a serotonina desempenha um papel importante no sistema nervoso, além do controle da temperatura corporal e do apetite. A endorfina, também produzida durante e depois da atividade física, ajuda a regular as emoções. Considerada um analgésico natural, a substância ajuda na redução do estresse e ansiedade, aliviando as tensões.

Mariana Franco, 32 anos, faz atividades físicas semanais enquanto se prepara para a chegada de Francisco. Ativa e ansiosa, ela procura relaxar com exercícios de hidroginástica e alongamento para gestantes. ;Acredito que seja essencial permanecer tranquila nesse momento. Sou naturalmente estressada, mas desde que soube da chegada do Francisco busco equilibrar o humor e deixar coisas que me estressam para trás. Estou muito mais tranquila e feliz;, conta Marina, que conta os dias até a chegada do primeiro filho, no fim de setembro.

A professora Daniela Rico ajuda as alunas no programa para gestantes a fim de amenizar sentimentos de dúvida que ela mesma sentiu quando estava grávida. ;Quando engravidei de Ana Júlia, há 12 anos, estava em um momento de muita instabilidade, prestes a me separar. Criei meu bebê sozinha e acho que esse momento refletiu um pouco na personalidade dela, que foi uma criança com dificuldades de concentração, um bebê que chorava bastante e parecia inseguro;, lembra Daniela.

Pós-parto
Psicólogos afirmam que o impacto emocional pode ser maior depois que o bebê nasce. Maria Isabel Tafuri, psicóloga e membro da Sociedade Brasileira de Estudos sobre o Bebê (Abebê), explica que o ambiente em que o bebê cresce também é fator determinante para a sua qualidade de vida. ;Se a mãe passa por um momento difícil, o ambiente onde essa criança se desenvolverá propiciará maior estresse também para ela. Ele não sentirá uma relação de proteção da mãe;, afirma. A psicóloga ressalta que é importante estabelecer um ambiente de harmonia para a chegada de uma nova criança. ;Não importa o tamanho da família, esta deve estar estruturada para que o bebê se sinta acolhido.;

O bebê com estresse pode desenvolver distúrbios alimentares e de sono. ;O bebê que mama sem olhar para a mãe, sem tocá-la ou dialogar corporalmente com ela provavelmente não vê nela a proteção materna. O sono desse bebê também fica comprometido. Podem ocorrer interrupções no ciclo de sono, sustos, medo de dormir sozinho;, explica Isabel Tafuri.

As marcas deixadas por tais situações vão se constituir em memórias negativas para a criança, mesmo anos depois do nascimento. Helena Morais explica que, dependendo do grau de estresse vivido pela mãe e pelo bebê, algumas características podem determinar a personalidade do filho na infância. ;É possível que bebês que passaram por forte estresse desde o nascimento, devido a uma depressão ou um sentimento de rejeição vivido pela mãe, tornem-se crianças inseguranças, de pouca independência em relação aos pais, com dificuldade de aprendizado e concentração.;

Essencial para a gestação é estar bem e contar com apoio. Helena afirma que toda mãe deve buscar ajuda quando sentir que tem dificuldades para lidar com a situação, seja conversando com o companheiro, com um amigo ou por meio de psicoterapia. ;Procurar um profissional terapeuta em alguns casos é tão importante quanto as consultas de pré-natal;, afirma a psicóloga. Daniela Rico acredita que compartilhar os medos e as dúvidas é importante para a mulher que sofre de excesso de estresse durante a gestação. ;Gosto de ajudar essas mães a passar pela gestação com mais calma e tranquilidade, passando para elas minha experiência pessoal. Tento mostrar que, apesar da angústia que passei, a felicidade de ter minha filha foi maior que qualquer preocupação ou medo;, conta Daniela.

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