postado em 17/09/2010 08:00
São mais de 4 mil espécies, mas apenas quatro povoam os ralos e armários das casas. Saem dos esgotos para espalhar repulsa e pânico em algumas pessoas. Se causam tanto mal-estar em boa parte da população mundial, provocam curiosidade em cientistas. O paquistanês Naveed Ahmed Khan, professor de microbiologia da Universidade de Nottingham, no Reino Unido, quis saber porque elas sobrevivem aos ambientes mais pestilentos e inóspitos. Descobriu que o tecido nervoso das baratas contém moléculas capazes de matar 90% das Staphylococcus aureus resistentes à meticilina(MRSA) ; as chamadas superbactérias, causadoras de graves infecções hospitalares ; e das Escherichia coli, sem danificar as células humanas. Em tese, o cérebro das baratas é uma espécie de depósito rico em potenciais antibióticos.;Como esses organismos habitam os mais asquerosos locais conhecidos ao homem e são bem-sucedidos mesmo na presença de superbactérias, minha hipótese era de que eles deviam ter algum tipo de defesa;, explica Naveed ao Correio, em entrevista por e-mail. ;Testamos essa teoria e vimos que ela é verdadeira.; O especialista deduziu que o sistema nervoso das baratas precisaria ser continuamente protegido. Caso contrário, o inseto morreria. ;O cérebro é a parte mais resguardada de qualquer organismo. Então, fazia sentido que encontrássemos potenciais atividades microbianas ali;, diz.
Naveed concluiu que as estruturas periféricas do sistema nervoso desses insetos podem sofrer avarias, mas não o suficiente para matá-los. ;Nós identificamos nove diferentes moléculas (proteínas) nos lisados (produto da dissolução de células de um tecido) que eram tóxicos às superbactérias;, conta. Ele espera agora que essas substâncias sejam sintetizadas em tratamentos para infecções bacterianas resistentes às drogas atuais. ;Esses novos antibióticos fornecem alternativas para medicamentos atualmente disponíveis que são eficientes, mas têm efeitos coletareis graves e indesejáveis;, comenta.
De acordo com Naveed, pesquisas preliminares indica que as proteínas naturais têm atividade potente contra bactérias gram-negativas, como a neuropatogênica Escherichia coli e gram-positivas, como as MRSA. ;Por meio de ferraments analíticas ; como o espectrômetro de massa e a ressonância nuclear magnética ;, estamos estudando as estruturas moleculares para determinar suas inovações;, relata o cientista de Nottingham. ;Esperamos submetê-las a testes clínicos e levá-las às farmácias nos próximos cinco ou 10 anos. Uma vez que conheçamos toda a estrutura proteica, seremos capazes de sintetizá-la em grandes quantidades, no laboratório;, acrescenta.
Por enquanto, Naveed e seus colegas concentram seu trabalho nas baratas de laboratório. A expectativa em relação às espécies de esgoto (Periplaneta americana) é ainda mais otimista. ;As baratas de esgoto devem ter muito mais atividades moleculares. Por isso, o futuro de descobertas de antibióticos a partir desses insetos é muito próspero;, admite. O britânico Simon Lee, pesquisador da pós-graduação na Universidade de Nottingham e co-autor do estudo, explicou que não causa surpresa o fato de os insetos secretarem suas próprias substâncias antimicrobianas. ;Os insetos frequentemente vivem em ambientes sem saneamento e sem higiene, onde encontram muitos tipos diferentes de bactéria. Por isso, é lógico que eles tenham desenvolvido meios de se proteger contra os micro-organismos;, lembra Lee.
Gafanhotos
As baratas não são os únicos seres quase indestrutíveis pelas superbactérias. Uma simples observação levou Naveed a concluir que os gafanhotos gozam do mesmo mecanismo de defesa. ;Estávamos intrigados pelos insetos antimicrobianos, quando percebemos que muitos soldados retornavam de diferentes partes do mundo com infecções incomuns;, relata. ;Gafanhotos viviam nas mesmas regiões e eram incólumes à presença de superbactérias;, acrescenta. O paquistanês usou a mesma linha de raciocínio usada com as baratas e detectou a presença das mesmas moléculas no cérebro do inseto.