postado em 28/09/2010 08:00
Qual animal seria capaz de vencer o elefante africano, que pesa cerca de 7t e consome pelo menos 150kg de vegetais por dia? Esqueça o leão, os crocodilos ou qualquer outro bicho feroz que puder imaginar. Mostrando que tamanho não é documento, os únicos capazes de meter medo no maior mamífero da Terra são as formigas. Isso mesmo, com apenas 1cm, elas têm capacidade não só de assustar os gigantes, mas de impedir que eles se alimentem de determinadas árvores ; justamente as escolhidas pelos insetos para habitar. Essa foi a inusitada conclusão de um estudo da Universidade da Flórida, feito no Centro de Conservação de Mpala, no Quênia, publicado na última edição da revista científica Current Biology.A curiosidade dos pesquisadores começou quando eles perceberam que a espécie Acacia drepanolobium, um arbusto espinhento bastante abundante nas savanas do continente africano, simplesmente não era utilizada como alimento pelo elefante, que preferia migrar ou até mesmo ter sua população diminuída pela falta do que comer a ter que ingerir uma folhinha sequer da árvore. Analisando melhor a planta, eles perceberam que o interior de seus espinhos era povoado por várias espécies de formigas.
Para ter certeza que eram os pequenos insetos os causadores de tamanha ojeriza nos elefantes, os pesquisadores realizaram o seguinte experimento: forneceram galhos das árvores Acacia drepanolobium sem as formigas, que foram prontamente ingeridos pelos elefantes. ;Nos ensaios de alimentação, os elefantes não distinguiram a Acacia drepanolobium que tinham as formigas removidas, e ela se tornou altamente palatável;, explicam em seu artigo, os autores da pesquisa Jacob Goheen e Todd Palmer. As suspeitas dos cientistas foram confirmadas depois de um segundo experimento. Eles infestaram de formigas plantas que normalmente fazem parte da dieta do animal. O resultado não podia ser outro: os animais não aceitaram as plantas, permanecendo com fome.
A explicação dos pesquisadores para o desgosto do paquiderme em relação à acácia está na tromba do animal. Quando os elefantes tentam se alimentar da planta, as formigas defendem o território onde vivem, atacando o gigante, que ;aprende; que aquela espécie não é boa para alimentação. É a repetição da velha história de Davi e Golias. Outros animais, que não têm tromba, não encontram esse problema, se alimentando normalmente do vegetal.
Impacto
A história, que à primeira vista parece engraçada, tem um efeito muito sério nas espécies animais e vegetais que vivem nas savanas da África. Os cientistas explicam que a vegetação africana nem sempre consegue se manter constante. ;A cobertura arbórea na savana é geralmente considerada como instável, variando de acordo com as chuvas, com o fogo e com os demais animais;, explicam os pesquisadores. ;Na África subsaariana, os elefantes suprimem a cobertura de árvores, mantendo assim a heterogeneidade da paisagem, promovendo a convivência de árvores e gramíneas;, afirmam Jacob e Todd
Eles contam que os elefantes são responsáveis pela destruição de boa parte da vegetação local. ;Na ausência de elefantes, o crescimento das árvores pode converter savanas em florestas;, afirmam. Da mesma forma, se a população de paquidermes aumenta muito, os resultados podem ser catastróficos; ;A pressão dos animais pode transformar a savana em campos abertos;, explicam.
Mas qual o papel da formiga nessa delicada relação entre os elefantes e as plantas? ;Nós mostramos que as formigas estabilizam a cobertura de árvores nas savanas do Quênia, protegendo uma árvore dominante dos ataques dos elefantes;, concluem os especialistas. Isso significa dizer que, se não fosse pelas formigas, toda a cobertura de árvores das regiões onde o mamífero vive desapareceria, causando a desertificação da área.
Isso acontece porque, segundo o estudo, existe uma simbiose entre o arbusto e os pequenos insetos. ;Trata-se de uma relação de mútua dependência, quando duas espécies precisam uma da outra para sobreviver;, explica o professor do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de Brasília (UnB) Paulo Cesar Mota. ;Na simbiose, diferentemente da protocooperação, a relação é obrigatória, ou seja, sem uma espécie a outra não conseguiria sobreviver;, completa o professor.
Apesar da surpresa com relação aos reflexos da união de forças entre o arbusto e a formiga, ele conta que na natureza esse tipo de situação é comum. ;Não sabia que nesse caso específico o resultado da simbiose é suficientemente forte para espantar os elefantes, mas é bastante comum que espécies de formigas se associem a plantas, evitando que animais se alimentem delas;, conclui o professor da UnB.