postado em 02/10/2010 08:00
Responsáveis por quase metade do oxigênio liberado na atmosfera, as algas marinhas são mais que ingredientes do sushi ou o ;matinho; irritante que se prende nas pernas de banhistas na praia. Diversas pesquisas mostram que elas podem ser transformadas em remediadoras ambientais (como ajuda contra danos à natureza), fármacos, cosméticos e até biocombustíveis. Isso com a vantagem de ser uma matéria-prima que não precisa de terra para brotar nem água doce para vingar. Cultivadas no mar ou em piscinas, dispensam também o uso de fertilizantes e pesticidas.Divididas em dois grupos, micro e macroalgas, essas plantinhas superpoderosas são organismos ricos em polissacarídeos/açúcar (as macro), ponto positivo na produção de etanol, e lipídios/gorduras (as micro), necessários para a produção de biodiesel. Como estão expostas às adversidades, as algas desenvolvem sofisticadas moléculas químicas, como agentes metabolisantes secundários, ao contrário de estruturas de plantas terrestres. As espécies mais utilizadas nas pesquisas são Gracilaria domingensis, Gracilaria birdiae, algas vermelhas brasileiras e Kappaphycus avarezii, originárias das Filipinas. Delas, são extraídos a carragena e o ágar (1), muito utilizados em alimentos e remédios.
Apostando nos benefícios dessas plantas, o professor de bioquímica Pio Colepicolo Neto, da Universidade de São Paulo (USP), coordena um projeto de exploração das algas marinhas e o uso da biomassa delas como fonte de novos remédios e de recursos biológicos economicamente viáveis para o tratamento de áreas degradadas ambientalmente. Ele explica, por exemplo, de que forma essas algas podem tratar águas poluídas: ;Elas absorvem os poluentes orgânicos, utilizando-os como esqueleto carbônico para sintetizar biomoléculas importantes, tais como aminoácidos, bases nitrogênicas, proteínas e lipídios. Já os poluentes metálicos são absorvidos pelas algas, que, com substâncias endógenas, imobilizam os metais em seus vacúolos (espécie de ;tentáculos; da planta).;
Para Pio, as algas desempenham papel fundamental no ambiente e, ;com criatividade e interesse;, é possível, segundo ele, inovar em diferentes áreas da ciência. Ele cita que as algas servem de base para a produção de antifúngicos e que o uso deles aumenta a vida útil das frutas e verduras em até quatro semanas. ;O que fizemos foi cultivar em laboratório os fungos que atacam as frutas e descobrimos o extrato algal como atividade antifúngica;, afirma. O extrato deve ser borrifado na fruta. No âmbito farmacêutico, por exemplo, ele afirma que as algas servem de base para a fabricação de filtros solares.
Por precisarem de luz solar para sobreviver, as algas possuem micosporinas (MAA), substância química capaz de absorver radiação ultravioleta (UV) e com ação antioxidante. ;Se um protetor solar tiver na fórmula a micosporina, terá uma ação sinérgica, antioxidante e com alta absorção dos raios UV;, destaca.
Negócio em expansão
Com tantos prós e poucos contras, o biólogo marinho Miguel Sepúlveda viu no cultivo das algas uma chance de empreender. Em 1998, ele introduziu em Ilha Grande (RJ) as fazendas de macroalgas da espécie Kappaphycus avarezii. Ele trouxe o broto da Venezuela e, após deixá-lo em um descanso de 40 dias no laboratório de camarões em Santa Catarina, iniciou o cultivo experimental. Essa pausa é importante para a planta brotar. Após cinco anos de avaliação tecnológica acerca do impacto ambiental e dos níveis de crescimento, o biólogo chegou à carragena, utilizada, entre outros produtos, em xaropes, cremes de barbear e embutidos. Atualmente, apoiado pela GDK /SA e Instituto Otaviano de Almeida Oliveira, Miguel comercializa a alga seca e em gel bruto, o carraguard. ;Você pode extrair das algas um composto vitamínico de A a Z que pode ser utilizado na alimentação, como adubo e como demarcador de poluição. São inúmera funções;, salienta.
A Kappaphycus é a base para as pesquisas de fabricação do etanol de terceira geração do programa ProAlga da Universidade Federal do Rio de Janeiro, coordenado pelo professor do Departamento de Virologia do Instituto de Microbiologia da UFRJ Maulori Curié Cabral. Ele explica que, da planta seca, desidratada e hidrolisada, elas são transformadas em um líquido de puro açúcar. Esse suco é fermentado e só então se obtém o etanol. As moléculas de álcool ficam dissolvidas no caldo constituído pela massa das algas. Esse processo, segundo Maulori, possui patente nacional e internacional pela UFRJ. ;Nossa produção está configurada para as escalas de bancada e piloto. Os próximos passos exigem financiamento para os grandes equipamentos da escala semi-industrial e, desta, para a escala industrial;, aponta.
Empolgado com o processo, o professor chama a atenção para a boa relação custo-benefício da produção do etanol a partir das algas. De acordo com ele, enquanto para cultivar alga não é necessário nem água doce nem solo terrestre, para o cultivo de um hectare plantado com cana de açúcar, que produz cerca de 85 toneladas para as usinas, são necessários 2 milhões de litros de água doce por hectare/ano para o abastecimento.
O Brasil tem potencial para produzir 40 toneladas por hectare/ano de alga seca. ;Isso envolve quebra de paradigmas em prol da agricultura marinha, pois nosso povo não conhece ainda as vantagens do uso do mar, de forma sustentável, para o desenvolvimento econômico e social das populações litorâneas;, enfatiza. Para ele, algo mais sustentável que alga não existe. ;O dia em que o mundo quiser solucionar o efeito estufa, basta prestar atenção no valor sustentável das algas;, prega.
Riqueza derivada
São géis brutos extraídos das algas muitos utilizado pelas indústrias alimentícia e farmacêutica. Atuam como espessantes, gelificantes, agentes de suspensão e estabilizantes, em produtos à base de água ou leite.