Ciência e Saúde

Nobel de Química vai para descobertas usadas em remédios para câncer e Aids

postado em 07/10/2010 08:00
O norte-americano Richard F. Heck, 79 anos, sabe que ajudou a transformar a humanidade. Por telefone, de Manila, ele confidenciou ao Correio: ;Eu posso imaginar que minha vida também vai mudar muito;. Em Sapporo, na ilha japonesa de Hokkaido, Akira Suzuki preparava-se para dormir, após o dia mais atribulado de seus 80 anos. ;Eu recebo o prêmio com grande honra;, disse, também por telefone. Do outro lado da Terra, em Newark, estado de Delaware (EUA), o também japonês Ei-ichi Negishi, 75, tentava se acostumar à fama. Às 6h45 de ontem (hora de Brasília), a Real Academia de Ciências da Suécia anunciou que os três cientistas conquistaram o Nobel de Química. Eles dividirão 10 milhões de coroas suecas (R$ 2,5 milhões).

Membro da instituição, o bioquímico sueco Lars Thelander explicou que os três laureados desenvolveram o acoplamento cruzado do paládio catalisado, uma ferramenta para a produção em laboratório de ligações de carbono-carbono em química orgânica. ;Ela é utilizada amplamente nos meios acadêmico e industrial para sintetizar moléculas orgânicas complexas, como, por exemplo, novos medicamentos, produtos químicos usados na agricultura e compostos orgânicos utilizados na indústria eletrônica;, comentou. Thelander lembrou que essa área da química foi premiada recentemente com quatro prêmios Nobel. Os átomos de carbono são estáveis e não aceitam reagir entre si. As técnicas criadas por Heck, Negishi e Suzuki resolveram o problema. ;Os átomos de carbono se encontram na presença do metal paládio e originam uma ligação carbono-carbono;, acrescentou Thelander.



A Academia comentou que as descobertas dos três permitiram a centenas de cientistas sintetizar muitas substâncias presentes na natureza em todo o planeta. Suzuki e Heck admitiram ao Correio que seus estudos podem proporcionar drogas revolucionárias contra o câncer e a Aids (leia abaixo). ;A humanidade quer novos medicamentos para tratar o câncer ou conter os efeitos devastadores de vírus mortais no corpo humano, a indústria eletrônica busca substâncias emissoras de luz e a indústria agrícola almeja substâncias capazes de proteger as colheitas;, afirmou, em nota, o Comitê Nobel.

O americano Robert H. Grubbs, Prêmio Nobel de Química em 2005, comemorou a escolha. ;Eles contribuíram com uma das espinhas dorsais da síntese orgânica moderna;, afirmou à reportagem, por e-mail, o professor de química do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech).

Mais do que justo

Peter Bakuzis, professor do Instituto de Química da Universidade de Brasília (UnB) e pós-doutor em síntese orgânica pela Indiana University, considera o prêmio ;mais do que justo;. ;Os estudos dos três estão envolvidos em qualquer ramo de química orgânica sintética. Com eles, você pode preparar, de forma catalítica, vários compostos que são difíceis de se fabricar de outro modo;, explica. ;Os produtos derivados são feitos de maneira mais simples, com rendimentos melhores, menos poluição e maior viabilidade econômica. Em suma, podemos preparar mais coisas de modo mais barato e fácil.; Ele pondera, no entanto, que o trabalho de Heck, Suzuki e Negishi ainda não terminou. ;Todos os dias surgem coisas novas, com a criação de compostos mais seletivos. Eles começaram tudo há 40 anos.;

Peter Bakuzis, professor do Instituto de Química da UnB, explica a experiência dos ganhadores do Prêmio Nobel de Química 2010


Akira Suzuki, Prêmio Nobel de Química 2010, fala com exclusividade ao Correio (em inglês)


Richard Heck, Prêmio Nobel de Química 2010, fala com exclusividade ao Correio (em inglês)


O próprio Heck revelou que desenvolveu a reação química do paládio para torná-lo útil. ;Ela tem a vantagem de agrupar moléculas orgânicas, a fim de produzir outras moléculas mais complicadas;, atesta o cientista, um dos poucos a migrar da indústria para a universidade.

Cada um dos laureados deu seu nome a uma das reações químicas descobertas. ;A reação Heck, a reação Negishi e a reação Suzuki têm grande importância para os químicos, já que permitem a criação de elementos cada vez mais complexos e são importantes ferramentas para a busca de novos medicamentos;, comentou o júri da Real Academia de Ciências da Suécia. Com as novas técnicas, é possível sintetizar substâncias complexas encontradas na natureza para combater o câncer de cólon, a herpes e da Aids. Elas também são úteis para o progresso dos antibióticos. Na indústria eletrônica, ajuda na produção de telas de computador ultraplanas de poucos milímetros.

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