postado em 19/11/2010 23:12
Impotência, perda de libido, mudanças no padrão hormonal e até ganho de peso eram receios dos homens que cogitavam fazer a vasectomia há uma ou duas décadas, época em que o assunto era cercado de mitos e desconhecimento. Atualmente, o procedimento é encarado com mais tranquilidade, tanto que o número de cirurgias desse tipo realizadas no Brasil tem crescido exponencialmente. Somente no Sistema Único de Saúde (SUS), a quantidade de procedimentos passou de 7,7 mil, em 2001, para 34,1 mil, no ano passado, aumento de mais de 300%. O acesso ao método em hospitais privados também cresceu, pois os planos de saúde já cobrem a vasectomia desde 2008. Ainda assim, algumas dúvidas persistem e povoam o imaginário masculino. Tudo porque, segundo os especialistas, não raro, a esterelidade é confundida com castração.A vasectomia é um método cirúrgico de esterilização masculina. De tão simples, a técnica nem requer internação, medida necessária para as mulheres que recorrem à laqueadura (operação de esterilização feminina). O procedimento é feito em ambulatório e dura cerca de 20 minutos. O urologista Renato Argollo, da Clínica Andros, observa que hoje dificilmente alguém não conhece uma pessoa que tenha feito vasectomia. O assunto é conversado com mais abertura e a população passou a entender que ela não interfere na masculinidade, tratando-se apenas de um método seguro de contracepção.
O médico lembra, no entanto, que, nas consultas prévias à cirurgia, os pacientes sempre perguntam se algo irá mudar em relação ao orgasmo, ao desejo sexual e à ereção. ;Isso é natural. É importante deixar claro que a ejaculação não muda, pois 98% do volume do esperma é líquido da próstata e da vesícula seminal. Os espermatozoides representam 2% do que é ejaculado;, pontua. A técnica da cirurgia não mudou tanto ao longo do tempo. A evolução se concentrou no tamanho das incisões na bolsa testicular, que ficaram bem menores. A saúde do homem também não é afetada. Caíram por terra os mitos que confundiam a cabeça dos candidatos ao procedimento no passado, como o suposto aumento nas chances de sofrer de doenças como o câncer de próstata e de testículo.
De acordo com o chefe do Departamento de Andrologia da Sociedade Brasileira de Urologia Otto Henrique Torres Chaves, nada disso tem comprovação científica. ;Dezenas de pesquisas provam que a vasectomia não está relacionada ao aparecimento de outras patologias. Não ocorrem efeitos adversos a curto ou a longo prazo. Os pacientes saem andando do ambulatório no mesmo dia. O desconforto é mínimo;, assegura. Segundo o médico, a opção de operar é do homem, mas a companheira deve estar de acordo com a cirurgia. ;Noto que 95% dos pacientes chegam ao consultório munidos de certo conhecimento. Ainda assim, nosso dever é orientar e questionar o paciente para que ele não se arrependa depois. Quando ele tem uma companheira, ela também deve participar e aprovar a decisão;, pondera.
O empresário Khaled Gahazaleh, 39 anos, optou pela vasectomia há quatro anos e diz estar convicto de que acertou na opção e no momento. Seguro de que estava totalmente realizado com as duas filhas gêmeas, ele conta que não queria que sua mulher continuasse evitando a gravidez com anticoncepcionais. ;Esses remédios prejudicam a saúde. Por que ficar tomando medicação se eu tinha a chance de resolver a questão de modo tão simples? Não tive medo, não senti dor, minha masculinidade não foi alterada e estou muito satisfeito. É uma questão de planejamento familiar;, garante Khaled.
Prazo para funcionar
A chance de reversão espontânea da vasectomia é pequena. Estudos sugerem que ela ocorre em menos de um caso para cada 3 mil procedimentos realizados. Mas a esterilidade não é garantida imediatamente depois da cirurgia. Durante os primeiros 60 dias, a recomendação é que se use outro método contraceptivo. ;Após o procedimento, espermas ativos continuam no sêmen por um período, sendo necessárias entre 15 e 20 ejaculações para que o líquido expelido esteja livre dos espermatozoides. Por isso, um exame de espermograma deve ser feito dois meses depois da cirurgia para garantir que o paciente está realmente estéril. Essa avaliação deve ser repetida uma vez ao ano;, explica Argollo.
O analista de suporte Hugo Acioli Cardoso Sousa, 45 anos, é a prova de que a reversão espontânea é rara, mas não impossível. Depois de ser pai pela quarta vez, ele e a mulher, Carolina, decidiram pelo método. O procedimento foi realizado e, 60 dias depois, o espermograma confirmou a azoospermia. Passados mais seis meses, porém, Carolina engravidou. Assustado com a notícia da gestação, ele refez o exame. O resultado foi claro: a natureza foi mais forte. Os espermatozoides voltaram a aparecer na ejaculação.
Ele recorda que fez a cirurgia porque, na época, a vida estava complicada em termos financeiros. ;Foi a opção melhor naquele momento. Não me arrependi e acho que o destino se encarregou do resto. Ao contrário do que muitos pensam, adorei saber que teria mais um filho e jamais duvidei da minha esposa. É claro, vimos que havia algo incomum em relação ao procedimento e por isso procurei o médico para entender o ocorrido;, explica o analista. Para ele, a reversão foi um presente. ;Tivemos mais duas crianças. A Carol fez a laqueadura depois do nascimento da nossa caçula, que já tem 5 anos. Se a cirurgia dela falhasse e fôssemos surpreendidos com uma nova gestação, eu ficaria muito feliz;, afirma o animado pai.
Reversão é possível
A Organização Mundial da Saúde preconiza que os candidatos à vasectomia preencham certos requisitos para minimizar o risco de arrependimento. Recomenda-se que o homem viva um relacionamento estável, tenha mais de 25 anos e que os filhos vivos tenham passado da idade de doenças infantis. ;Eventualmente, essa recomendação varia de acordo com a história do candidato. O que os especialistas buscam é que a decisão seja madura, responsável e muito bem pensada, pois a vasectomia deve ser considerada um método permanente de contracepção;, enfatiza o médico urologista Otto Henrique Torres Chaves.
Em todo caso, se bater o arrependimento, é melhor que seja nos primeiros cinco anos depois da cirurgia. Quanto mais tempo passar, menores as chances de a reversão cirúrgica dar certo. O analista de sistemas Ubiramar Mendonça, 49 anos, teve sorte. Quando fez a vasectomia, há 17 anos, era casado, tinha um relacionamento estável e dois filhos. A vida, porém, tomou rumos inesperados e o casamento terminou. Ao encontrar uma nova companheira, que ainda não tinha experimentado a maternidade, o desejo de ser pai novamente bateu forte. Ubiramar procurou diversos especialistas, inclusive no exterior, e escutou sempre a mesma resposta: seu caso seria praticamente impossível de ser revertido. ;Eu e minha esposa chegamos a fazer inseminação artificial, mas não deu certo. Não me dei por vencido e resolvi bancar a reversão mesmo com pouquíssimas chances. Acreditava que conseguiria. Deu certo. Estamos grávidos de oito meses. Vou ser pai novamente depois de 20 anos;, comemora. (MN)