Ciência e Saúde

Pensar emagrece, diz estudo que pode ajudar médicos a combater a obesidade

Imaginar repetidas vezes que está comendo um alimento antes de prová-lo ajuda as pessoas a se satisfazerem mais rapidamente, indica pesquisa publicada na revista Science

Paloma Oliveto
postado em 10/12/2010 08:00
Imaginar repetidas vezes que está comendo um alimento antes de prová-lo ajuda as pessoas a se satisfazerem mais rapidamente, indica pesquisa publicada na revista ScienceUm dos principais conselhos para quem está de dieta é: pare de pensar em comida. Porém imaginar uma deliciosa barra de chocolate pode, na verdade, ajudar a perder peso. Foi o que descobriram pesquisadores da Universidade de Carnegie Mellon, nos Estados Unidos. O estudo, publicado na edição de ontem da revista especializada Science, sugere que, ao visualizar repetidas vezes um alimento, o cérebro engana o estômago, e a pessoa, consequentemente, come menos, por se sentir saciada.

O psicólogo Carey Morewedge, principal autor da pesquisa, lembra que o ser humano reage por estímulos, quando o assunto é algo desejável ; seja um prato de comida, um cigarro ou um drinque. ;De fato, ao imaginarem-se saboreando um delicioso filé, as pessoas costumam salivar e sentir vontade de comê-lo. Pensar no cheiro de um cigarro queimando aumenta a vontade de fumar em quem é dependente. O aumento do desejo provocado pelo pensamento parece afetar a maneira como nos comportamos;, diz, no artigo. Se é possível salivar só de pensar em uma barra de chocolate, então é razoável deduzir que o organismo reage de outras formas ; por exemplo, sentindo-se farto ; a partir de um estímulo imaginado repetidas vezes.

Nos testes realizados pela equipe de Morewedge, os participantes foram divididos em dois grupos, com 51 pessoas cada. O primeiro deles teve de imaginar, seguidamente, que estava consumindo de três a 30 unidades de determinado alimento, a ;guloseima-alvo;, como, por exemplo, balinhas M;s. Os demais eram incentivados a pensar em outros tipos de ação, como comer um alimento diferente ou recusar um prato de comida. ;Então, demos a todos os participantes uma tigela cheia da guloseima-alvo e pedimos que comessem algumas unidades para que pudessem avaliá-las em um teste de sabor;, contou o pesquisador ao Correio.

Depois que os voluntários pararam de comer, as tigelas foram retiradas e, secretamente, pesadas. ;Descobrimos que os participantes que haviam imaginado muitas vezes ter comido aquele alimento consumiram menos;, diz Morewedge. ;Já os voluntários que imaginaram outro tipo de comida ou desempenharam tarefas mentais que não envolviam alimentos comeram mais.; Em experimentos semelhantes descritos no artigo, os resultados foram iguais. ;O consumo imaginado reduz o consumo real porque diminui a vontade de comer o alimento visualizado;, explica o pesquisador. De acordo com ele, antes mesmo que o organismo dê o sinal de que está saciado, o cérebro, depois de estimulado pelas imagens, manda o aviso de que já enjoou da comida (leia entrevista).

;O hábito é um dos processos fundamentais que determinam o quanto nós consumimos de determinada comida ou de um produto, quando vamos parar de consumi-lo e quando vamos trocar o consumo para outro alimento;, explica ao Correio o pesquisador Joachim Vosgerau, que também participou do estudo. ;Nossa descoberta mostra que o hábito não é governado apenas pelos sentidos de tato, visão, cheiro e audição, mas também é definido pelo modo como nossa experiência de consumo é mentalmente representada. Em alguns casos, simplesmente imaginar uma experiência substitui a realidade;, diz Vosgerau.

Além das evidentes implicações da pesquisa para o controle da obesidade, os autores acreditam que é possível estender a descoberta para outras questões, como a dependência de tabaco ou bebidas alcoólicas. ;Acreditamos que esse estudo poderá ajudar a desenvolver futuras intervenções para reduzir o vício para coisas como vício por junk food, drogas e cigarros, e esperamos que isso vá nos ajudar a ensinar as pessoas como fazer escolhas saudáveis;, conclui Morewedge.

PALAVRA DE ESPECIALISTA
Intervenções possíveis
;Essa descoberta tem importantes implicações para diversos campos de pesquisa. Primeiro, os resultados sugerem que a mentalização, sozinha, pode gerar um hábito a partir de um estímulo. Além da sua importância teórica, é uma descoberta que poderá levar ao desenvolvimento de intervenções mais efetivas na redução da dependência por comida e drogas, e diminuir reações fóbicas, por meio de estímulos de indução do medo. Além disso, o estudo mostra que a diferença entre a experiência real e as representações mentais de uma experiência pode ser menor do que se achava previamente.;
Young Eun Huh, pesquisador do Laboratório de Pesquisas Comportamentais da Universidade de Carnegie Mellon


TRÊS PERGUNTAS PARA CAREY MOREWEDGE
Psicólogo da Universidade de Carnegie Mellon

Imaginar repetidas vezes que está comendo um alimento antes de prová-lo ajuda as pessoas a se satisfazerem mais rapidamente, indica pesquisa publicada na revista ScienceQuais são os impactos que o estudo poderá ter sobre a luta contra a obesidade?
As pessoas parecem parar de comer por duas razões: o retorno de seu sistema digestivo, que dá uma sensação de saciedade, e o hábito de consumir determinado alimento (ela acaba enjoando dele). Como o hábito é algo que ocorre mais rapidamente, acreditamos que o resultado da pesquisa possa ser usado para ajudar as pessoas a regular sua ingestão de alimentos. Agora mesmo, estamos começando a testar se um pensamento de indução similar pode ser usado para ajudar as pessoas a comer menos alimentos pouco saudáveis e ingerir mais comida saudável.

A técnica de visualização funciona quando a pessoa está realmente com fome ou só se refere à gula?
Atualmente, estamos pesquisando essa questão mais a fundo. Mas tanto os participantes que estavam com muita fome quanto os que não estavam com tanta fome pareceram ter sido influenciados pela tarefa de imaginar que estavam consumindo o alimento de forma similar.

O senhor acredita que a técnica pode funcionar também com bebidas alcoólicas e outros tipos de vício?
Nós esperamos que esse tipo de indução da imagem possa também afetar a vontade de consumir outras substâncias viciantes, e estamos começando a investigar se a imaginação mental repetitiva pode reduzir a vontade de fumar. Ainda temos de testar se o processo pode funcionar, mas tenho o palpite de que sim, e espero conduzir mais estudos para examinar essa questão em um futuro próximo.

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