postado em 11/12/2010 08:05

Para realizar o experimento, foi preciso multiplicar as CTMs. A autora do estudo, a bióloga Carolina Caliari, retirou células-tronco da medula óssea dos camundongos sem queimaduras e as cultivou em laboratório. As CTMs se separam umas das outras, aderindo ao plástico das garrafas de cultivo. ;O objetivo era que permanecessem somente as CTMs, para que se multiplicassem até chegar à quantidade suficiente para a terapia;, descreve. Essas células foram aplicadas, com seringa, nas feridas abertas pelas queimaduras.
Segundo Carolina, os animais tratados com as CTMs, camundongos com 40% do corpo com queimaduras de terceiro grau, tiveram uma recuperação mais rápida quando comparados aos que não as receberam. ;Os que foram tratados com placebo apresentaram apenas 80% de cicatrização;, ressalta. Ela observou ainda o equilíbrio entre os linfócitos TCD4 e TCD8, que fazem parte do sistema imunológico. ;As células mostraram potencial modulador do sistema imunológico e podem ter controlado a proliferação exagerada dos TCD8 no organismo, o que possivelmente interferiu positivamente na melhora dos animais;, acrescenta.

De acordo com Carolina Caliari, o tratamento só poderá ser feito em humanos quando o entendimento sobre os mecanismos de atuação dessas células-tronco em queimaduras for dominado, garantindo a segurança da aplicação da técnica. ;Como todo novo experimento, a transposição da terapia em modelos experimentais para seres humanos requer cautela;, ressalva.
Esperança
Poderão ser beneficiados, após as fases de testes, pacientes com queimaduras em grandes extensões no corpo. Para Carolina, quanto maior o tempo em que a ferida permanecer aberta, maiores serão as chances do desenvolvimento de outras complicações, como infecções. ;Essas pessoas necessitam de cuidados rápidos e especiais;, aconselha. A ideia é desenvolver, segundo a bióloga, um curativo contendo as CTMs, que poderá ser colocado sobre a queimadura. ;Quanto menos invasivo for o tratamento, melhor para o paciente;, aconselha.
Foi o que ocorreu com a aposentada Eride Caires depois de um acidente em 24 de dezembro de 2008. Enquanto preparava o almoço de Natal, um vazamento de gás explodiu o apartamento dela. O acidente causou queimaduras de segundo e terceiro graus, espalhadas pelo rosto, pelo pescoço, pelas pernas e pelos braços, totalizando 42% do corpo. A aposentada conta que durante o ocorrido não sabia se tentava salvar os móveis ou se ficava embaixo da água para aliviar a dor. ;Eu chutava as cadeiras ainda em chamas e, quando me dei conta, estava tudo preto e eu toda queimada embaixo do chuveiro frio;, recorda.
O tratamento de Eride se estende até hoje. ;Os médicos queriam amputar as minhas pernas. Fiz enxerto com pele artificial e do couro cabeludo e terapias e fisioterapias de duas a quatros vezes por semana;, lembra. No entanto, quem vê a aposentada hoje e a compara com as fotos de dois anos atrás não a reconhece. Ela está radiante, recuperada e com poucas sequelas. ;Ainda falta a pigmentação de algumas áreas, mas estou bem. O Natal está chegando e estou preparando uma festa linda, porém, dessa vez, sem peru;, brinca. Até hoje, a aposentada utiliza uma malha compressiva como proteção no braço direito, para ocultar parte das marcas restantes.
A dermatologista e especialista em queimaduras e feridas Thereza Piccolo, do Hospital Nelson Piccolo, de Brasília, explica que as queimaduras são classificadas, por profundidade, em espessura parcial e total de pele destruída. Segundo ela, a do tipo parcial pode ser subclassificada como superficial, intermediária ou profunda. Já as queimaduras de espessura total, ou seja, que provocam a destruição completa da pele, não têm capacidade de regeneração sem a mobilização de tecidos. ;A queimadura rompe a barreira de isolamento do indivíduo, representada pela pele, com seu meio ambiente. Consequentemente, ele fica exposto a desidratação, complicações respiratórias e infecções;, afirma.
A médica conta que para cada queimadura há um tratamento indicado ; em geral, cirúrgico. Segundo ela, as sequelas são variadas, como manchas, cicatrizes com alteração de textura, cor, aspecto, sensibilidade e restrições funcionais. Thereza avalia que o tratamento de queimados evoluiu consideravelmente. ;Se, antes, queimaduras que tomavam apenas 20% do corpo eram encaradas como letais, hoje, há casos em que conseguimos recuperar pessoas queimadas em mais de 90% da superfície corporal e com qualidade de vida, sem restrições funcionais;, afirma.
AÇÃO EM EQUIPE
Tanto o linfócito TCD4 quanto o TCD8 são células de defesa do organismo. O TCD4 funciona como um organizador, reunindo amostras para apresentar aos leucócitos qual ;inimigo; deve ser atacado. O TCD8 age destruindo as células infectadas ou com mutações. Em indivíduos sadios, o número de TCD4 é superior ao de TCD8. Naqueles com grandes queimaduras, a atuação dos TCD4 é mais favorável para a melhora do paciente.
PREVENÇÃO
Como forma de prevenir acidentes, o Núcleo de Proteção aos Queimados do Hospital Nelson Piccolo desenvolve quatro programas institucionalizados e várias oficinas temporárias. A campanha ;Queimaduras, evite essa cicatriz; já atendeu aproximadamente 30 mil alunos do ensino fundamental do Distrito Federal, alertando para situações potencialmente perigosas. Também têm sido realizadas cirurgias reparadoras, sessões de terapia e aulas de maquiagem corretivas, tudo gratuitamente.
Queimaduras
Causadas por agentes físicos térmicos (os mais frequentes), elétricos ou químicos, são divididas em três categorias:
Primeiro grau ; é aquela superficial, que deixa a pele avermelhada, inchada e dolorida. Pode ser desencadeada até mesmo pelo Sol
Segundo grau ; intermediária, provoca o aparecimento de bolhas
Terceiro grau ; de grande profundidade, causa a morte do tecido
Tratamento
No primeiro estágio, podem ser administradas pomadas. No segundo, às vezes, é necessário o procedimento cirúrgico. No terceiro, como a necrose geralmente destrói a camada lesada, é necessário o enxerto com pele retirada de outras regiões do corpo
Estudo
A pesquisadora retirou células-tronco mesenquimais de medulas ósseas de camundongos. Essas células-tronco são responsáveis por gerar tecidos como cartilagem, pele e músculo para o tratamento de áreas queimadas
Aplicabilidade
Cultivadas em placas de plástico, as células-tronco são colhidas em uma seringa e aplicadas ao redor das regiões afetadas pela queimadura
Eficácia
A hipótese foi associada ao efeito das células-tronco na lesão. As feridas apresentaram uma quantidade maior de tecido de granulação ; aquele tecido fininho formado em cima das feridas ;, e de vasos sanguíneos na região. Ambos auxiliam na cicatrização
Benefício
Além da reconstituição do tecido, no sétimo dia de tratamento os camundongos mantiveram equilíbrio de células do sistema imunológico. São elas: TCD4 e TCD8, importantes para um bom prognóstico do paciente
Fonte: Carolina Caliari