postado em 21/12/2010 08:00
Fonte de inesgotáveis estudos desde a Antiguidade, o cérebro humano e seus mistérios são vistos sob nova ótica no recém-lançado livro americano Portraits of the mind: visualizing the brain from Antiquity to the 21st century, da editora Abrams (Retratos da mente: visualizando o cérebro da Antiguidade ao século 21, tradução livre, ainda sem previsão de lançamento no Brasil). Do neurocientista norte-americano Carl Schoonover, da Universidade de Columbia, a publicação destaca não só o conhecimento acumulado em dois mil anos de pesquisas, mas destaca a beleza e engenhosidade por trás dos esforços para conhecer os segredos da mente humana.A obra mostra que a busca por respostas sobre o mais complexo órgão humano também merece ser apresentada ao público em geral. Como destaque estão as imagens ilustradas ou captadas em pesquisas ao longo da história. Pouco conhecidos fora do meio científico, os desenhos e as fotos, muitos inéditos, são comparados a produções artísticas. A editora escolhida para lançar o livro, especializada em publicações de arte, deu especial atenção à reprodução das imagens com o intuito de evidenciar a estética presente nos aglomerados de neurônios, nas células fotorreceptoras e nos vasos sanguíneos fotografados pelas lentes de microscópios eletrônicos.
;Ao destacar o apelo da estética natural das imagens da neurociência, mantenho o foco nas ideias poderosas que esse arrebatador vocabulário visual nos deu;, explica Schoonover, 27 anos. Acompanham as imagens artigos de importantes cientistas e pesquisadores da área que, junto com o autor, explicam as descobertas em neurologia dos últimos 20 anos e exploram o funcionamento de cada área cerebral. Uma das imagens, por exemplo, ajudou cientistas a perceberem que os neurônios responsáveis pela visão eram especializados a ponto de cada tipo perceber um movimento diferente, seja ele descendente, ascendente ou em outras direções.
Ao longo dos séculos
A viagem pela história dos estudos sobre o cérebro começa na Antiguidade. Rascunhos, desenhos e protótipos dos mais variados tipos são provas da curiosidade e criatividade humanas. Um exercício de metalinguagem, essas pesquisas seguem em paralelo com a evolução da tecnologia. No início, eram rascunhos antigos, em que desenhos eram feitos sobre crânios na tentativa de delimitar a função de cada área do cérebro. A partir daí, o homem chegou às técnicas de captura de imagens atuais, que envolvem microscópios eletrônicos capazes de aumentar a imagem milhões de vezes e proteínas geneticamente modificadas, que brilham em luzes fluorescentes, revelando os neurônios e vasos cerebrais.
As imagens recentes redimem um órgão por muito tempo conhecido por sua falta de estética. A consistência úmida e o formato nada atraente do cérebro não inspiravam estudiosos da Antiguidade. Por muito tempo, ele foi relegado ao segundo plano nos estudos de anatomia. Segundo o filósofo grego Aristóteles, que morreu aos 62 anos em 322 a.C., por exemplo, a função da massa cinzenta era auxiliar o coração, que seria o mais importante órgão humano.
Efetivamente iniciado na Renascença, o estudo do sistema neurológico foi elevado à categoria de protagonista do corpo e prestigiado pela ciência médica apenas no século 19. Após sua função devidamente creditada, foi a vez das imagens de intrincadas redes neuronais em fotografias nítidas provarem a beleza e elegante complexidade cerebral.
Segundo o autor de Portraits of the mind, algumas imagens são fortes razões que o levaram a decidir estudar neurologia. São experimentos considerados extraordinários não apenas pela beleza das imagens, mas porque muitos deles resolveram, de uma vez, velhas questões sobre a lógica do cérebro. As abordagens também chamam a atenção por envolverem técnicas criativas, como a fotografia de uma imagem criada dentro do cérebro de um macaco a partir dos movimentos nos vasos sanguíneos do cérebro. ;Interesso-me por experimentos que são belos por si próprios, mesmo que não se considere o resultado. Eu acredito que certos procedimentos de pesquisa em neurociência são de tirar o fôlego;, diz.
TRÊS PERGUNTAS PARA CARL SCHOONOVER
Neurocientista
Como surgiu a ideia de fazer o livro?
Quando comecei o curso de pós-graduação, costumava carregar imagens do cérebro usadas em pesquisas na parte da carteira em que geralmente se colocam as fotografias de família. Eu costumava mostrá-las para quem estivesse disposto a conhecê-las até que um dia, meio por acidente, mostrei para a pessoa que se tornaria minha editora. Ela as achou muito bonitas e rapidamente uma coisa levou à outra e comecei a trabalhar no livro.
Muitas dessas imagens nunca foram vistas pelo público. Que outros aspectos da pesquisa sobre o cérebro você acha que surpreenderiam as pessoas?
Muitas das imagens neste livro mostram uma tripla combinação de elegância conceitual, beleza estética e significado (ou conhecimento). O intuito do livro é tentar compartilhar todas elas com o público em geral, que normalmente só tem conhecimento dos resultados. Para mim, as partes mais incríveis são exatamente aquelas que não são mostradas. O conhecimento é apenas como as coisas são. O que realmente aprecio na ciência é a busca, a estratégia, a incerteza que, se tratada de maneira adequada, será transformada em algo que podemos entender.
O que mais o fascina em relação ao cérebro?
Ele é uma inacreditável bagunça intrincada em que tudo é muito pequeno, muito sutil e muito rápido! Ele tem sido estudado por mais de dois mil anos e ainda estamos apenas começando. Existe um incrível espaço em branco que resta ser conhecido e inúmeras oportunidades de encontrar novos elementos fascinantes. Se tivermos sorte, eles serão tão bonitos quanto os que encontramos até agora.