Ciência e Saúde

Técnicas menos invasivas substituem cirurgia para a neuralgia do trigêmeo

postado em 25/01/2011 08:00
Numa escala de zero a 10, os pacientes que sofrem com neuralgia do trigêmeo sempre atribuem pontuação máxima à dor que sentem. O desconforto surge repentinamente e é tão intenso que a pessoa passa a viver em função do medo da terrível sensação. Bastam um sorriso ou ações cotidianas como fazer a barba, escovar os dentes ou se maquiar para desencadear o incômodo. Em casos graves, a vítima da mazela não consegue nem beber água. ;Na última crise, fiquei de cama sem conseguir me mexer. Ficava desesperada na hora de tomar a medicação oral. A dor é dilacerante, algo que não desejo nem para o pior ser humano da Terra;, relata a professora aposentada Marisa Eid, 64 anos.

A doença é mais comum em mulheres acima dos 50 anos. A dor sinaliza um distúrbio na função do nervo que controla os músculos e transmite informações sensoriais à face. Embora as causas não sejam totalmente conhecidas, sabe-se que o mal está associado à pressão que um vaso sanguíneo próximo à base do cérebro passa a exercer sobre o nervo trigêmeo. Até alguns anos atrás, o problema era tratado com medicamentos ou com uma cirurgia que exigia a abertura na parte de trás do crânio, a chamada descompressão microvascular (DMV). Atualmente, técnicas percutâneas apresentam grandes chances de cura com menos riscos de complicações e menor tempo de recuperação. A mais nova delas, conhecida como compressão percutânea com balão, já é realizada no Hospital Universitário de Brasília (HUB) e na rede particular da cidade.

O diagnóstico da neuralgia do trigêmeo é clínico. O transtorno costuma afetar o lado direito do rosto, mas alguns estudos sugerem que em até 10% dos casos ele se manifesta bilateralmente. O ramo maxiliar do nervo é o mais atingido, o que faz com que os pacientes procurem odontólogos na primeira tentativa de remediar a dor. De acordo com Tiago Freitas, neurocirurgião especialista em neurocirurgia funcional, a sensação pode vir em forma de choque, queimação ou pontada. ;Alguns pacientes também apresentam lacrimejamento dos olhos. A dor vem em intervalos, dificilmente é contínua, mas é tão intensa que acreditamos ser uma das mais insuportáveis descritas pela medicina. Há indícios de que existe uma propensão genética envolvida nessa neuralgia;, observa.

Exames de imagens são feitos para complementar e confirmar o diagnóstico, pois a doença pode ser decorrente de outros transtornos no cérebro, como esclerose múltipla e tumores. A primeira opção de tratamento é a medicamentosa e funciona em 60% a 70% dos casos. São prescritos anticonvulsivantes, que inibem a dor. ;Quando todas as opções de drogas são usadas e o paciente não responde à terapia ou apresenta efeitos colaterais, a cirurgia é indicada;, explica o neurocirurgião Ronald Reimer, médico da Mayo Clinic (EUA).

Menos invasivas
As técnicas percutâneas são consideradas as melhores alternativas cirúrgicas, principalmente para pacientes acima dos 50 anos. Minimamente invasivas, o neurocirurgião chega até o gânglio do nervo trigêmeo para realizar o procedimento com o auxílio de agulhas e catéteres. Além da compressão com balão, as outras possibilidades são a radiofrequência ; método que lesa o nervo ; e a aplicação de glicerol, substância que promove a desidratação da raiz nervosa. A melhor indicação varia de acordo com o caso e as condições clínicas da pessoa.

A incisão da intervenção que usa o balão inflável para comprimir o gânglio nervoso é feita próxima à boca, com o paciente adormecido e sob efeito de anestesia geral. Os médicos se orientam com um aparelho de raios X preciso, para alcançar a base do crânio, local onde está a base do nervo. ;Um balão é introduzido por cateter e inflado sob determinada pressão por um minuto. Cerca de 80% dos pacientes apresentam excelente reparação;, garante o médico americano. Segundo ele, os riscos são mínimos. Menos de 5% das pessoas sofrem algum problema no pós-operatório.

Para o neurocirurgião Tiago Freitas, de todas as técnicas percurtâneas, a do balão é a que apresenta mais benefícios e menos complicações. ;Todas as três agridem o nervo de alguma forma. É um artifício para que ele pare de funcionar desregulado e o estímulo de dor seja interrompido;, detalha o médico que realiza as técnicas em Brasília. Os pacientes já acordam sem dor. Segundo Freitas, de 50% a 60% dos que recebem o glicerol não sentem mais o desconforto. A técnica vem sendo preterida porque não é tão eficaz quanto as outras duas. ;Para aqueles que receberam a radiofrequência, o índice de sucesso é de 90%, mas o paciente tem que ser acordado no meio da intervenção, o que é muito desconfortável;, pondera.

Marisa conta que sentiu a neuralgia no trigêmeo esquerdo pela primeira vez em 1989. ;A dor vinha de repente, quando eu ia comer ou falar. Nenhum analgésico era capaz de remediá-la. Em 1997, tomei uma injeção de álcool que trouxe grande alívio até dezembro passado, quando a dor voltou dilacerante;, diz. Além do anticonvulsivante, a aposentada chegou a tomar morfina e antidepressivos. Nada trazia alívio. Há 15 dias, Marisa fez a cirurgia de compressão com balão. O rosto ainda guarda um hematoma do procedimento, mas a dor foi embora instantaneamente. ;A cirurgia durou 30 minutos. Não precisei nem levar pontos. Eu renasci. Viver imóvel em uma cama é quase uma morte. Assim que o médico liberar, vou viajar e voltar às minhas atividades;, comemora.

A auxiliar de enfermagem aposentada Gasparina Oliveira Brito, 74 anos, também passou pelo mesmo procedimento. ;Sentia dor na região da boca. Gritava e chorava o tempo todo. Não conseguia comer nem dormir. É difícil acreditar que um pequeno balãozinho me trouxe a tranquilidade de volta. Ainda está um pouquinho inchado, mas isso não é nada perto do transtorno que passei;, relata.

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