Ciência e Saúde

Controle da sífilis no país é dificultado pelo desconhecimento da população

postado em 07/02/2011 09:39
Cláudio (*), 35 anos, funcionário público, ensino superior completo, sexualmente ativo. Depois de uma irritação indolor na garganta, de manchas semelhantes às de picadas de mosquitos nas mãos e nos pés e da visita a três médicos mal informados, ele descobriu que estava com sífilis. Embora seja uma pessoa esclarecida, o rapaz jamais achou que aqueles sintomas estavam relacionados a uma doença sexualmente transmissível. ;Eu me lembrava das grandes feridas nos órgãos sexuais mostradas nas aulas de educação sexual na escola. As ;pintinhas; que apareceram na minha pele mais lembravam alergia;, recorda. De acordo com a enfermeira Leidijany Paz, responsável pela vigilância epidemiológica da gerência de DST/Aids e Hepatites Virais da Secretaria de Saúde (SES) do Distrito Federal, essa falta de conhecimento ; da população e dos profissionais de saúde ; só dificulta o controle da doença entre a população.

Leidijany explica que a sífilis ainda é um grande problema de saúde pública no Brasil. Segundo dados do Ministério da Saúde (MS), são estimadas cerca de 937 mil infecções novas por ano na população sexualmente ativa. A enfermeira conta que os sintomas variam de acordo com os três estágios da doença (veja infografia). Os primeiros são pequenas feridas nos órgão sexuais ou em locais onde foram infectados pela bactéria Treponema pallidum e caroços nas virilhas (ínguas), que surgem entre sete e 20 dias após o sexo desprotegido com alguém infectado. ;A ferida e as ínguas não doem, não coçam, não ardem e não apresentam pus. Mesmo sem tratamento, essas feridas podem desaparecer sem deixar cicatriz. Mas a doença, mesmo assim, se desenvolve;, explica.

Segundo Leidijany, ao alcançar o segundo estágio, podem surgir manchas em várias partes do corpo (inclusive mãos e pés), que também somem, e queda dos cabelos. ;A doença pode ficar estacionada por meses ou anos, até o momento em que surgem complicações graves, como cegueira, paralisia, doença cerebral e problemas cardíacos, podendo, inclusive, levar à morte;, salienta.

O funcionário público Cláudio, ainda com as manchinhas no corpo, inclusive na boca, teve a orientação de que a doença não seria transmitida pelo beijo. ;Eu viajei e beijei muitas pessoas. Só quando voltei é que soube que daquela forma eu também passava a doença;, conta. Cláudio já conseguiu tratamento e passa bem, mas sempre se pergunta: ;Será que eu transmiti a doença para alguém?;.

A resposta é ;provavelmente sim;. A enfermeira Leidijany destaca que a transmissão não sexual da sífilis é excepcional. No entanto, na fase secundária ; na qual Cláudio estava quando beijou outras pessoas ;, as lesões são potencialmente infectantes. ;Lembrando que essas lesões podem estar em qualquer parte do copo, principalmente nas palmas das mãos, nas plantas dos pés e no interior da boca;, ressalta.

Embora a doença seja séria, o tratamento é simples, baseado no uso de penicilina. A enfermeira recomenda procurar sempre um profissional de saúde, pois só ele pode fazer o diagnóstico correto e indicar o tratamento mais adequado, dependendo de cada estágio. ;Para cada um existem doses e períodos adequados de duração do tratamento;, diz. Nos casos de pacientes alérgicos à substância, a médica Maria Liz, infectologista, especialista em sífilis da gerência de DST/Aids e Hepatites Virais da SES/DF, conta que poderão ser administradas, em doses corretas, a eritromicina ou a tetraciclina. ;Por isso, é sempre importante procurar um profissional;, reforça.

Na gravidez
A médica lembra que a única forma de prevenção é o uso de preservativo durante as relações sexuais. Ela também recomenda que as pessoas limitem o número de parceiros. ;Hoje, a camisinha parece ter uma única função: evitar filhos. Contrair doenças, porém, é muito pior;, comenta. Mesmo que a doença tenha cura, a falta de conhecimento e de prevenção podem causar uma epidemia tardia. Mas, para as especialistas na doença, o mais grave são os bebês nascerem com sífilis e tomarem penicilina logo nos primeiros dias de vida.

De acordo com uma pesquisa do Ministério da Saúde realizada em 2006, 1,6% das parturientes brasileiras estavam com a doença ativa no momento do parto. A proporção varia de acordo com a região brasileira, chegando a 1,9% no Nordeste. O último levantamento feito no DF, em 2009, indicou que 0,57% das grávidas atendidas pela rede pública tinham sorologia reagente para sífilis na hora do parto. ;Embora no DF a proporção esteja abaixo da média nacional, na população em geral, essa doença ainda representa um problema de saúde pública relevante, uma vez que temos em média 500 casos de sífilis adquirida notificadas por ano, nos últimos oito anos;, alerta Leidijany.

De acordo com a infectologista Maria Liz Cunha, há a possibilidade de o bebê nascer com sífilis se a mãe desenvolver a doença durante a gravidez. Ela explica que, no bebê, a sífilis congênita (transmitida via transplacentária) pode causar cegueira, surdez, retardo mental, alterações nos ossos e abortos espontâneos. ;Por isso, todas as grávidas devem realizar o teste de sífilis durante gravidez;, acredita.
* Nomes fictícios a pedido dos entrevistados.


Dicas
De acordo com a infectologista Maria Liz Cunha, se você tiver sífilis, tenha o seguinte comportamento:

; Conte à pessoa com quem você tem tido contato sexual sobre a sua infecção.

; Evite o contato de outras pessoas com suas secreções corporais e feridas. Evite relações sexuais ou outros contatos íntimos até que seja tratado.

; Lave as mãos depois de ir ao banheiro e antes de tocar em comida, louças ou utensílios domésticos.

"A doença pode ficar estacionada por meses ou anos, até o momento em que surgem complicações graves (...), podendo, inclusive, levar à morte;
Leidijany Paz, responsável pela vigilância epidemiológica da gerência de DST/Aids e Hepatites Virais da Secretaria de Saúde do DF


Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação