Ciência e Saúde

Sumiço de espécies marinhas há 450 mil anos foi por mudanças no clima

Paloma Oliveto
postado em 22/02/2011 07:00
A Ilha de Anticosti, no Canadá, um dos lugares estudados pelos cientistas: técnica inédita para calcular a temperatura do oceano há milhões de anosCerca de 450 milhões de anos atrás, a Terra sofreu a segunda maior extinção em massa de sua história, com o desaparecimento de mais de 75% das espécies marinhas, durante o Período Ordoviciano. O que exatamente causou essa tremenda perda na biodiversidade ainda é um mistério. Agora, porém, uma equipe de pesquisadores liderada pelo Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech) descobriu novos detalhes sobre o evento, que teria sido provocado por súbito esfriamento do planeta.

;Apesar de se saber há muito tempo que a extinção está intimamente ligada às mudanças climáticas, o mecanismo preciso continua pouco claro;, diz ao Correio Seth Finnegan, pesquisador da Caltech e principal autor de um artigo publicado na edição on-line da revista especializada Science. Ele explica que o desaparecimento das espécies marinhas coincidiu com um período glacial, durante o qual as temperaturas diminuíram, ao mesmo tempo em que o planeta ficou tomado por geleiras. Naquela época, a América do Norte localizava-se onde hoje é a linha do Equador, e os outros continentes formavam uma supermassa conhecida como Gondwana, que começava na fronteira equatoriana e terminava no Polo Sul.

Utilizando um novo método que mede antigas temperaturas, os pesquisadores encontraram pistas sobre o tempo e a magnitude da glaciação e como isso afetou as temperaturas oceânicas perto da linha do Equador. ;Nossas observações revelaram um sistema climático distinto de qualquer outro que tenhamos conhecimento ao longo dos últimos 100 milhões de anos;, acrescenta Woodward Fischer, professor de Geobiologia da Caltech e coautor do artigo.

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O fato de a extinção ter ocorrido durante um período glacial, quando enormes peças de gelo cobriram muito do que agora é a América do Sul e a África, dificulta o trabalho de avaliar o clima da época. ;Uma das maiores dificuldades em estudar os dados do paleoclima (clima de determinada época histórica) é mensurar as mudanças na temperatura do oceano e nos blocos de gelo continentais;, afirma Fischer ao Correio. Segundo ele, ambos fatores podem ter desempenhado um importante papel na extinção em massa, pois, com mais água congelada, o nível do mar deve ter diminuído, reduzindo o hábitat marinho.

Novo equipamento
O método convencional para determinar antigas temperaturas requer a mensuração da razão de isótopos de oxigênio contidos nos minerais da água do mar. Essa relação depende da temperatura, mas também da concentração de isótopos no oceano, um dado difícil de se obter. Por isso, analisar as antigas composições oceânicas é um grande desafio para a ciência. ;Até agora, não há uma forma confiável de saber exatamente quão quente ou fria era a temperatura durante os períodos glaciais;, continua Fischer.

Para isso, a equipe utilizou um novo equipamento, chamado paleotermômetro, desenvolvido por John Eiler, professor de geologia e geoquímica na Caltech. Com a técnica, os pesquisadores conseguiram determinar a temperatura média durante o Ordoviciano tardio. Segundo Fischer, foi a primeira vez que cientistas conseguiram compreender os efeitos do volume de gelo no oceano em um evento ocorrido há milhões de anos. A mensuração foi feita por meio da análise química de fósseis marinhos e conchas coletadas em Quebeque, no Canadá, e na região central do oeste americano.

Geleiras
Seth Finnegan explica que o método criado por John Elier não se baseia na concentração isotópica do oceano, mas mede a temperatura baseada em isótopos pesados encontrados nos fósseis. Altas temperaturas fazem com que os isótopos se aglomerem, enquanto o frio os afasta mais. ;Ao fornecer informações independentes sobre a temperatura oceânica, esse novo método nos permitiu conhecer a composição isotópica da água do mar de 450 milhões de anos;, diz Frinnegan. ;Usando essa informação, podemos estimar o tamanho das geleiras continentais ao longo dos períodos de glaciação.; E, com uma ideia mais clara de quanto gelo havia, explica, os pesquisadores podem conhecer melhor o clima do Ordoviciano, incluindo a forma como isso afetou o ecossistema marinho a ponto de provocar uma extinção em massa.

;Descobrimos que taxas elevadas de mudanças climáticas coincidem com a extinção;, conta Finnegan. Ele conta que a equipe constatou que, embora as temperaturas oceânicas tropicais fossem mais altas do que agora, pequenos blocos de gelo existiam nos polos antes e depois da extinção. Mas, na época das glaciações, os termômetros baixaram cinco graus, fazendo com que as geleiras crescessem no continente Gondwana mais de 150 milhões de quilômetros cúbicos ; um tamanho maior do que as geleiras que cobriam a Antártida e o Hemisfério Norte durante a última glaciação da era moderna, há cerca de 20 mil anos. ;Nosso estudo fortalece a ideia de que a mudança climática foi responsável pela extinção;, conclui Finnegan.

Mortes
A Terra já passou por diversas extinções em massa, mas algumas foram mais expressivas do que outras em quantidades de espécies que desapareceram. O primeiro grande evento foi a extinção do Período Cambriano-Ordoviciano, ocorrida há 488 milhões de anos. Quase todas as espécies de braquiópodes, conodontes e equinodermos, todos micro-organismos marinhos, simplesmente sumiram dos oceanos. A terceira grande extinção da história foi a dos dinossauros, há 1 milhão de anos, o que abriu caminho para o domínio dos mamíferos sobre o planeta.

Datação

Isótopos são dois átomos do mesmo elemento químico com massa diferente e número atômico iguais. A diferença está na quantidade de nêutrons. Por causa disso, eles têm comportamento químico semelhante, mas propriedades físicas diferentes. Na natureza, quase todos os elementos químicos presentes em substâncias minerais e na atmosfera são compostos de vários isótopos. Uma das aplicações para a pesquisa histórica é a datação radiométrica, feita principalmente com o carbono 14.

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