postado em 16/04/2011 08:00
A incontinência fecal acomete homens e mulheres, costuma destroçar a autoestima e deixar pacientes reféns do problema. Ainda pouco discutido, mesmo entre as vítimas, o problema é encarado como um tabu. O desconforto de perder fezes involuntariamente constrange e priva a pessoa de uma vida social e profissional normal, provocando o isolamento. Embora os idosos estejam mais propensos à mazela, a doença pode atingir todas as faixas etárias.O proctologista Elias Couto explica que as causas da incontinência fecal estão ligadas a lesões diretas nas estruturas musculares da região anorretal, provocadas por traumas cirúrgicos ou acidentes. O descontrole também pode ser decorrente de problemas congênitos, males sistêmicos, metabólicos e patologias neurológicas, como a doença de Parkinson, a esclerose múltipla e alguns tumores periféricos no cérebro. Estima-se que 15% das mulheres com mais de 50 anos e 3% das que tiveram partos vaginais, são vítimas da incontinência fecal temporária ou permanente. Mas, em 5% da população geral, ocorrem pequenas perdas, conhecidas como ;soiling;. Acima dos 65 anos, a incidência é 12 vezes maior; e 51% dos pacientes com diarreia crônica apresentam a incontinência.
Os idosos são mais vulneráveis porque estão suscetíveis ao enfraquecimento da musculatura e dos ossos em geral. ;Com o passar do tempo, os músculos do assoalho pélvico ; estrutura que ajuda a sustentar o intestino, coordena e auxilia na contratividade do ânus ; também perdem a tonicidade. No entanto, até crianças podem sofrer com a incontinência;, pondera Couto, que é especialista do Hospital Anchieta. O geriatra Thiago Póvoa lembra que as comorbidades e as alterações funcionais decorrentes de outras doenças típicas do envelhecimento também favorecem a grande incidência em idosos. Os pacientes com dificuldade de mobilidade, por exemplo, têm mais riscos de desenvolver a incontinência, causa importante de internação em casas de repouso. ;O tratamento para esses pacientes leva em consideração uma série de fatores. As cirurgias nem sempre resolvem. Quando a incontinência é idiopática, uma dieta balanceada pode ajudar na contenção das fezes;, observa.
Ajuda atrasada
Por constrangimento, os pacientes demoram a procurar ajuda, principalmente se a pessoa ainda está em idade produtiva. De acordo com o proctologista, a maioria dos que sofrem dessa perda involuntária não sabe que a incontinência é um problema que, dependendo da situação, pode ser resolvido com dieta e exercícios fisioterapêuticos. Os procedimentos mais invasivos são encarados como a última opção. Os exames e a própria história da pessoa determinam o que é ideal para cada paciente. ;É importante saber que aqueles com hábitos alimentares ruins e constipação intestinal são muito mais propensos ao mal. A não evacuação diária gera pressão no ânus, o que interfere na contratividade e leva à incontinência;, detalha.
Além disso, lesões decorrentes do parto podem desencadear a incontinência. Foi o que aconteceu com a psicóloga Paula Cardoso, 49 anos. ;Foi terrível, porque me deixava altamente limitada. Tinha receio de sair de casa e passei a usar absorvente na tentativa de evitar ainda mais constrangimento. Os exames revelaram a causa. Meu assoalho pélvico estava totalmente relaxado;, conta. A correção na dieta e a fisioterapia orientada por uma especialista em uroginecologia resolveram o problema. ;A alimentação rica em fibras, a hidratação e outras questões simples, como a postura que devemos ter ao sentar no vaso sanitário, podem ajudar no tratamento, mas a fisioterapia me devolveu a qualidade de vida;, considera Paula.
Embora não seja um fator determinante, o sexo anal também pode gerar a incontinência devido aos traumas que a prática provoca na região anorretal, assim como as cirurgias de retirada da próstata. ;A fisioterapia vem ganhando cada dia mais espaço para remediar a questão da incontinência. Muitas vezes, ela recupera totalmente o paciente;, garante o proctologista Elias Couto. A fisioterapeuta Andrea Camargo explica que o tratamento é feito com a ajuda de uma sonda ligada a um aparelho que estimula, fortalece e até relaxa os esfíncteres, pois a contração excessiva também provoca a incontinência. ;Trabalhamos ainda com a terapia comportamental e o biofeedback, técnica que promove a melhora da função fisiológica por meio de estímulos da atividade neuromuscular e capacita o paciente a readquirir controle voluntário sobre seus músculos;, esclarece. O tratamento, segundo a especialista, é indolor. ;Depois de oito sessões, os paciente começam a conseguir se controlar;, assegura ela, que também usa eletroestimulação das raízes sacrais e outras técnicas que complementam o tratamento.
Para o professor de educação física Paulo*, 54 anos, a fisioterapia devolveu a autoestima e a rotina normal. A incontinência comprometia completamente seu dia a dia e vinha obrigando o profissional a trabalhar usando fraldas descartáveis. ;É uma condição extremamente angustiante e debilitante. Cheguei a imaginar que estava com uma doença grave. Não conseguia correr, nadar, orientar meus alunos, mas já estou conseguindo controlar a situação;, comemora. Paulo considera que a vergonha do problema impede muitos pacientes de buscarem ajuda. ;Esse assunto abala emocionalmente, mas precisa vir à tona. Muitas pessoas se isolam por não saber que existem boas possibilidades de cura;, reforça.
Nome fictício a pedido do entrevistado.