Belo Horizonte ; Quando a ciência se une a uma das mais artísticas áreas do conhecimento humano, o resultado pode ir além de oferecer soluções úteis e práticas. Pode ser também bonito. E é isso que se vê no trabalho de doutorado do professor Paulo Baptista, da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A tese Panoramas da Serra do Espinhaço ; um ensaio de mapeamento fotográfico da paisagem propõe um modelo de interface entre arte e ciência, mais especificamente entre fotografia e preservação ambiental.
A ideia é mais simples do que se pode imaginar: escolhe-se um lugar em meio à paisagem, tira-se uma foto de um ponto específico e arquiva-se a imagem. Junto dela são marcadas a altura em que estava o tripé da máquina fotográfica e a coordenada geográfica em que ele foi montado: latitude e longitude. Depois de algum tempo, cinco ou 10 anos, um fotógrafo volta a esse local, usa essas informações e tira, exatamente, a mesma foto. Com a comparação das imagens é possível fazer uma análise sobre as mudanças ambientais na área. Ou seja, controle ambiental por meio da imagem obtida.
Para Paulo Baptista, o processo é mais fácil por contar com a experiência. Professor de fotografia da Belas Artes da UFMG há mais de 20 anos, ele é fotógrafo de paisagem, com apreço especial pela Serra do Espinhaço. ;Essa área tem uma importância ambiental muito grande e, ensinando, fui percebendo que a fotografia tinha um potencial político enorme;, conta. Ele diz que a tese é, essencialmente, uma tentativa de aplicar essa produção fotográfica em outras áreas, como geociência e geografia. ;Usar a fotografia com foco mais aplicado, além da estética;, justifica.
Embora a ideia pareça óbvia, o processo é complexo. Para que as fotos sejam boas, é preciso carregar um equipamento que pode pesar até 15 quilos. Ele inclui tripé, uma máquina fotográfica pesada e seus acessórios, computador portátil e um HD externo. Isso tudo porque, usando as tecnologias atuais, é possível tirar fotografias com altíssima resolução. As imagens podem chegar a 192 megapixels de resolução, o que oferece várias possibilidades. Por exemplo, ao ampliá-las no computador, é possível ver uma única flor que estava a 5km de distância do ponto de onde a foto foi tirada, ou ver o horizonte a até 30km.
Além do equipamento para a fotografia é preciso carregar mapas, bússola e GPS, que ajudam a encontrar as coordenadas geográficas pré-definidas e repetir o ponto exato onde a foto original foi clicada. E é bom se preparar antes, usando possibilidades como o Google Maps e carregar uma cópia da imagem original para comparar os locais.
Caminhar até encontrar o local exato para armar o tripé e posicionar a câmera na altura e ponto ideal leva algumas horas. Como a imagem é digitalizada e precisa ser escaneada em altíssima resolução, o processo entre o clique e o produto final pode demorar até 30 minutos. Resultado: em um dia de trabalho é possível tirar, no máximo, três fotos. Além disso, o método só funciona em imagens estáticas.
Mas o processo pode ser encarado de forma otimista. Uma panorâmica, por exemplo, conta com 10 a 15 imagens numa única foto. Depois de feita uma nova foto, alguns softwares de computador ajudam a calcular a distância e indicam se a original estava mais para a direita ou esquerda, mais para frente ou para trás e faz os ajustes necessários. A partir daí, é só comparar e analisar.
Sob orientação do professor doutor Heitor Capuzzo Filho, a metodologia na tese de Baptista parte do trabalho do fotógrafo americano Mark Klett, no projeto Third View Project. Com base em fotos tiradas em 1860, no Oeste Americano, Klett voltou aos locais das fotos na década de 1970, marcou as coordenadas geográficas e fez novas imagens daqueles pontos. Em 1997, voltou aos lugares e, mais uma vez, registrou as paisagens. O objetivo era entender as mudanças físicas do local e definir suas perspectivas.