Ciência e Saúde

Marca-passos evoluem e estão cada vez menores e mais sofisticados

postado em 04/05/2011 08:00
Daniel precisa do marca-passo devido a um problema congênito
O primeiro marca-passo cardíaco pesava 60g, era movido a baterias de cádmio e níquel e tinha um diâmetro de 55mm. O instrumento, implantado em 1958 no peito do engenheiro sueco Arne Larsson, foi substituído 21 vezes no decorrer das mais de quatro décadas em que seu coração foi monitorado e os descompassos, corrigidos. Arne consolidou uma carreira de sucesso, viajou pelo mundo, criou dois filhos e, é claro, conseguiu acompanhar a evolução do aparelho que lhe permitiu viver por quase nove décadas. As antigas próteses remediavam apenas a bradicardia (frequência cardíaca abaixo dos 60 batimentos). Bem diferente da engenhoca recebida por Larsson, os marca-passos do século 21 desempenham outras tarefas. O equipamento, que hoje pesa cerca de 20g e não ultrapassa os 5mm, gerencia e corrige outras deficiências. Alguns modelos implantados em crianças pesam não mais que 15g e são do tamanho de uma moeda de R$1. E o futuro garante ainda mais surpresas.

O cardiologista do Incor/Taguatinga Cândido Rodrigues Gomes explica que os marca-passos disponíveis atualmente são multifuncionais, monitoram e gerenciam toda a atividade do coração. A nova geração ajuda a minimizar a bradicardia, a taquicardia e até a insuficiência cardíaca porque também são capazes de aumentar a força do órgão mais vital do ser humano. ;Eles funcionam como um anjo da guarda, porque observam batimento por batimento, agindo somente quando necessário. O aparelho grava a atividade cardíaca e produz um relatório que é avaliado periodicamente, permitindo o monitoramento e o ajuste dos medicamentos e do próprio aparato;, diz. A leitura é feita graças a um sistema de telemetria que transmite os dados da memória do marca-passo para um computador. É também pela telemetria que a equipe médica programa o aparelho para desempenhar as funções adequadas a cada paciente e verifica a situação da bateria.

O coração tem capacidade para gerar, automaticamente, um impulso elétrico que se propaga por ;fios naturais; até alcançar toda a área cardíaca, fazendo com que o músculo se contraia por inteiro de forma sincronizada e coordenada. Em uma pessoa saudável, ele produz de 60 a 80 batimentos por minuto ; pulsando pelo menos 100 mil vezes por dia. As doenças cardíacas alteram esse ritmo, porque danificam a ;fiação; natural, gerando poucos ou muitos estímulos. O marca-passo consegue exercer sua função graças a dois eletrodos ligados ao gerenciador de tarefas, introduzidos nas veias cardíacas e fixados na parede do músculo no momento do implante. ;Os problemas que levam ao descompasso são de natureza diversa. Podem ser decorrentes de doenças degenerativas, provocados por agentes virais e bacterianos e outros fatores;, acrescenta Gomes.

Os marca-passos não evitam as crises ; esse papel é da medicação. Mas, se o coração falhar, o aparelho entra em ação. Um choque produzido pelo dispositivo diante de uma parada cardíaca pode chegar a 700 volts, uma força equivalente ao coice de um cavalo, de acordo com o cardiologista. Quanto mais o sistema é acionado, mais a bateria é consumida. Como o aparelho é blindado, é necessário trocar todo o dispositivo de tempos em tempos.

;Sustos do bem;
O aposentado Antônio Guida Filho, 60 anos, já experimentou a intervenção do marca-passo por mais de uma vez. Vítima de uma cardiopatia obstrutiva ocorrida há 18 anos, o sistema elétrico passou a sofrer com as sequelas da bradicardia. Dependendo da gravidade da arritmia, Guida Filho recebe estímulos de baixa ou alta energia, corrigindo-a imediatamente. ;O marca-passo evita que o paciente tenha que ir ao pronto-socorro para reverter o descompasso e, nos casos mais severos, evita a morte súbita;, observa Martino Martinelli Filho, cardiologista e diretor da unidade de marca-passos do Instituto do Coração da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Guida Filho afirma que o aparelho já intercedeu durante uma parada cardíaca e, provavelmente, evitou o pior. ;Estava em um supermercado quando comecei a me sentir fraco, sem fôlego. De repente, levei um choque. Era o desfibrilador agindo e salvando a minha vida;, relata.

Ao contrário do que muitos imaginam, os marca-passos também socorrem pacientes jovens. O servidor público Daniel Ayer Madrid, 28 anos, tem o aparelho implantado há sete. No caso dele, um problema congênito conhecido como síndrome de Brugada desencadeia a pane no sistema elétrico e a arritmia ventricular. Quando o coração acelera, a prótese corrige a taquicardia. ;A primeira grande intervenção do marca-passo me derrubou. Fiquei constrangido, pois estava no meio da rua, mas sei que sem esse aparato não estaria mais vivo;, avalia. Fora os eventuais sustos, Daniel relata que tem uma vida normal. É casado, trabalha e se exercita. ;Não pratico esportes de contato. O futebol ficou no passado, mas já estou habituado com as limitações. Certa vez, esqueci a carteirinha que comprova que sou portador de marca-passo e tive que ser revistado em um banco. Acabei achando graça. O importante é que estou monitorado;, diz, aliviado.



Martinelli Filho reforça que o choque ocorre justamente quando o paciente tem uma arritmia que potencialmente ameaça a vida. ;A taquicardia ventricular ou a fibrilação ventricular são potencialmente graves. Quando o marca-passo as reconhece, faz a intervenção elétrica. A carga depende da gravidade do problema;, garante. As técnicas de implante do marca-passo e dos eletrodos podem ser endocárdicas e epicárdicas. A caixinha de titânio que protege o gerador e a bateria é implantada embaixo da pele ou sob o músculo peitoral para os homens e sob o mamário para as mulheres. Depois do implante, as restrições variam de paciente para paciente.

;O aparelho devolve a vida. Se o coração é forte e não padece de outros males, orientamos apenas que não se frequente locais geradores de campo magnético, como portas com detectores de metais e áreas próximas a antenas de telefonia celular;, lembra o médico. Quando o coração é fraco, existem as restrições de atividades físicas. O futuro ainda promete inovações. Diversas pesquisas exploram a possibilidade da extinção dos cabos que ligam o gerador ao músculo cardíaco. Esses fios ainda costumam dar problemas, rompendo-se ou causando ruídos que comprometem o funcionamento do aparelho. ;Os marca-passos wireless estão chegando;, acredita Martinelli Filho.

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