Ciência e Saúde

Fungo pode explicar desaparecimento em massa de anfíbios no mundo

Paloma Oliveto
postado em 10/05/2011 13:38
Nas listas periodicamente divulgadas sobre animais extintos ou ameaçados, os anfíbios ocupam uma posição cativa. Em apenas 40 anos, 40% das espécies encolheram, o que representa um risco para a biodiversidade. Entre as principais causas para o declínio das populações, estão a destruição do hábitat, a escassez de alimentos, as mudanças climáticas e a poluição. Mas outro fator pode explicar uma perda tão grande em um espaço tão curto de tempo: doenças causadas por agentes infecciosos.

Segundo um grupo de pesquisadores da Universidade de São Francisco, na Califórnia, o vilão chama-se Batrachochytrium dendrobatidis (Bd). Trata-se de um fungo que ataca a pele dos anfíbios, provocando a quitridiomicose, doença fatal que impede o animal de regular a temperatura interna, levando-o à morte. Descrita pela primeira vez em 1998, a doença levou ao colapso populações de anfíbios na Austrália, no Panamá, no Peru e no estado da Califórnia.

;Durante três décadas, houve perdas populacionais misteriosas e, em alguns casos, ocorreu até mesmo a extinção de espécies tropicais;, diz ao Correio Rick Spear, diretor do Centro de Saúde Pública e Medicina Tropical Anton Breil, na Austrália. Antes da descoberta da quitridiomicose, não havia sido encontrado nenhum motivo para isso, mas os dados epidemiológicos sustentam a hipótese de que o fungo, introduzido nas áreas de floresta tropical, foi a causa do declínio das populações;, afirma o especialista, que publicou o primeiro artigo sobre o Bd há mais de 10 anos. Desde então, poucos estudos foram realizados para constatar a tese de Spear.

Amostras de museus
Agora, os pesquisadores da Universidade de São Francisco decidiram verificar o grau de relação entre o fungo e o declínio da população de anfíbios. ;Em alguns locais do México e da Guatamala, salamandras começaram a desaparecer ao mesmo tempo em que o fungo letal chegou a essas áreas. O mesmo ocorreu nas florestas da Costa Rica, com sapos e salamandras;, contou à reportagem a estudante de biologia Tina L. Cheng, uma das autoras do estudo. Para investigar o padrão de contaminação associada à morte de espécimes, a equipe de pesquisadores criou uma técnica inovadora e simples: examinar as prateleiras de museus de história natural.

;Estabelecer a presença do Bd em espécimes conservadas em museus das populações que estão desaparecendo pode ser a chave para descobrir a disseminação histórica e geográfica desse patógeno e pode também fornecer evidências objetivas da relação entre a emergência do fungo e o declínio populacional dos anfíbios;, justifica Tina. Ela conta que a onda de mortes começou no fim da década de 1970, no México, espalhou-se para a Guatemala na década seguinte e, no início dos anos 1990, chegou à Costa Rica. O estudo resultante da pesquisa foi publicado pela revista especializada Proceedings of the National Academy of Sciences.

De acordo com Tina, a súbita extinção do sapo-dourado (Bufo periglenes) e do sapo-arlequim (Atelopus varius) da reserva ambiental Monteverde, na Costa Rica, é um dos casos recentes mais bem documentados dos declínios populacionais misteriosos que caracterizam a crise global dos anfíbios. ;O subsequente desaparecimento de 40% das espécies de anuros (grupo de anfíbios que não possuem cauda) das florestas tropicais costa-riquenhas é um dos casos mais extremos de perda de biodiversidade;, explica.

A culpa do fungo foi comprovada pela equipe de pesquisadores a partir da análise de amostras de peles de anfíbios conservadas no Museu de Zoologia Vertebrada da Universidade da Califórnia. Os cientistas estudaram o DNA de todos os espécimes do museu. Foi um trabalho pesado. Às vezes, eles precisavam analisar o material genético de 500 salamandras ao mesmo tempo, o que não deixou de ser uma vantagem, já que, quanto maior o número de amostras, mais provas para ;incriminar; o Bp surgiam. O material biológico referente às grandes epidemias revelou que 90% dos animais mortos estavam infectados pelo fungo.

Animais resistentes
Além de investigar a presença do Bp em espécimes conservados no formol, a equipe fez testes com anfíbios vivos. Em laboratório, os pesquisadores inseriram o fungo nos animais para verificar o processo da doença ; da incubação à morte. Eles descobriram que algumas são mais suscetíveis à infecção, e a letalidade está relacionada ao nível de esporos dos fungos. Agora, eles querem descobrir por que nem todos os anfíbios são atingidos da mesma forma quando entram em contato com o Bp.

Em entrevista à agência de notícias da Universidade de São Francisco, o professor Vance Vredenburg, que orientou o trabalho de Tina e assinou o artigo com a aluna, disse que testes semelhantes poderão ser realizados em museus de todo o mundo, o que facilitará a compreensão sobre o declínio populacional de anfíbios. ;Esses animais são uns sobreviventes. Eles já estão na Terra há 360 milhões de anos e sobreviveram a quatro extinções em massa. Estavam indo muito bem até agora, mas algo inédito e preocupante aconteceu nos últimos 40 anos;, afirma. Com a pesquisa, o biólogo acredita que será possível encontrar um caminho para combater o fungo de maneira eficaz.

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