postado em 12/07/2011 07:54
Goiânia (GO) ; ;A ciência quer ser ouvida.; Esse é o discurso mais repetido em praticamente todos os eventos que compõem a programação da 63; Reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que ocorre esta semana na Universidade Federal de Goiás (UFG). Mais do que apresentar pesquisas de ponta, o maior evento científico da América Latina, que deve reunir até a próxima sexta-feira cerca de 10 mil pessoas por dia, tem o objetivo de mostrar como o conhecimento científico pode ser útil na resolução dos problemas que afligem os brasileiros.A solução para a fome, a violência urbana, a precariedade da educação, os problemas relacionados à corrupção ou os desastres ambientais, dizem os cientistas, deve passar pelo que é pensado e produzido nos centros de pesquisa Brasil afora.
Todos esses temas, e tanto mais, estão representados nos diversos painéis e mesas redondas do encontro. Segundo a presidente em exercício da SBPC, Helena Nader, a sociedade precisa aprender a valorizar a ciência como uma forma de se pensar as políticas públicas. ;A ciência não se baseia em preconceitos, em posições políticas, ou ideológicas, em pontos de vista. Acho que essa imparcialidade pode ajudar o Brasil a trocar a luta de ideias ; em que pelo menos uma das partes sai descontente ; pela busca do consenso;, defende a cientista, biomédica da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e que amanhã toma posse definitivamente no cargo à frente da entidade que agrega quase 100 associações científicas nacionais.
A defesa da participação científica na elaboração das políticas públicas ficou evidente recentemente durante a polêmica discussão do novo Código Florestal. A SBPC e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) elaboraram em fevereiro um livro reunindo mais de 300 artigos sobre a questão. ;Toda a discussão sobre o tema tem sido polarizada entre os representantes do agronegócio e os ambientalistas. Essa discussão passa apenas pelo interesse de dois grupos, e não os do Brasil;, afirma Helena. ;É inegável que é preciso preservar o meio ambiente e a água, mas também não é possível ignorar que 60% do PIB nacional vem do agronegócio, e que a produção de alimentos tem um papel cada vez mais importante. Daí a necessidade de uma discussão mais isenta, que só a ciência pode promover;, acredita a presidente da SBPC, para quem a votação da nova legislação deve passar pela Comissão de Ciência do Senado Federal.
Busca de soluções
Não por acaso, o tema central da reunião deste ano são os desafios e o potencial do Cerrado. O segundo maior bioma do país ; atrás apenas da Floresta Amazônica ; estende-se por oito unidades da Federação, em mais de 2 milhões de quilômetros quadrados, e sofre diversas ameaças. Elas vão de pragas como o mexilhão-dourado, que já invadiu os rios do Pantanal, a disputas entre as reservas ambientais e as crescentes metrópoles urbanas e industriais.
Para os especialistas reunidos em Goiânia, a ciência é a maior arma para lidar com novos e antigos problemas que afligem a típica savana do interior brasileiro. ;O solo do Cerrado é pobre de nutrientes e tem características físico-químicas muito peculiares, como a grande necessidade de fósforo para o desenvolvimento da agricultura;, explica Pedro Antônio Pereira, presidente da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). ;Durante os últimos 35 anos, esse solo foi superexplorado primeiro pela cultura do arroz e posteriormente pelas pastagens, chegando a um nível de degradação extremo;, conta o especialista, que participou ontem da conferência Cerrado: água, alimentos, energia e pesquisa agropecuária.
O problema é grave em algumas regiões como no Triângulo Mineiro, onde a agricultura altamente mecanizada é responsável por uma parcela considerável da produção agrícola nacional. ;O município de Frutal, por exemplo, possui a maior quantidade de pivôs para irrigação de lavouras na América Latina. Lá, a retirada excessiva de água do subsolo vem comprometendo a qualidade ambiental;, alerta Romualdo Campos Filho, professor do Instituto de Estudos Socioambientais da UFG. ;A experiência de regiões como as zonas áridas da Austrália e do oeste dos Estados Unidos e o deserto do Mar Morto, na Ásia, mostram que a retirada excessiva de água pode ser catastrófica;, completa o pesquisador, que participou da mesma conferência.
Na opinião de Pereira, da Embrapa, esses casos são exemplos claros de situações em que a ciência já encontrou soluções.
;Existem técnicas de irrigação por gotejamento que economizam água e diminuem o desperdício;, exemplifica o cientista.
;No caso dos solos, já foram desenvolvidas inúmeras técnicas de recuperação, que usam inclusive espécies comerciais como o milho e a soja, que atuam na recomposição do nitrogênio perdidos ao longo dos anos. Soluções não faltam. O que é preciso são políticas públicas que as coloquem em prática;, completa.