postado em 23/09/2011 12:11
A estudante Jéssica dos Santos Silva, 18 anos, descobriu, em março, que estava com três meses de gestação. Embora não estivesse muito conformada com a notícia, fez exames para saber como estava a saúde do bebê. Durante uma ecografia transvaginal, descobriu que sua situação era ainda mais complicada do que uma gravidez inesperada. Jéssica tem mola hidatiforme completa, uma doença em que os trofoblastos ; conjunto de células que, entre outras funções, induz a formação e a fixação da placenta no útero ; se desenvolvem de maneira anormal. Nesse caso, o óvulo fertilizado não tem carga genética materna, apenas paterna. Com isso, o embrião para de se desenvolver, mas as células continuam a proliferar, fazendo com que a placenta se transforme em uma estranha massa que preenche o útero. ;Eu não tive reação quando descobri, fiquei sem acreditar. Assim que recebi o diagnóstico, me internaram por 12 dias;, conta Jéssica. ;Fiquei muito mal. Estouraram aftas na minha boca, nos ouvidos e na garganta;, lembra.Essa doença pode causar problemas à saúde materna, como maior incidência de pré-eclâmpsia ; mal em que a pressão da grávida aumenta e há a presença de proteínas na urina;, cistos no ovário e, caso seja uma mola invasora (ver infografia), a infiltração de trofoblastos na parede do útero ou em outros órgãos. As mulheres que têm esse problema também correm mais riscos de apresentar hemorragia, vômitos excessivos na gestação e alteração na função da glândula tireoide.
A mola hidatiforme completa é apenas uma das doenças trofoblásticas gestacionais (DTGs), males pouco conhecidos. ;As DTGs, apesar de não serem raras em nosso meio, são desconhecidas pela maioria das pessoas. Muitos médicos não estão familiarizados com o acompanhamento dessas patologias;, afirma Marcelo Filippo, médico especializado em ginecologia e obstetrícia. A jovem tampouco sabia da existência dessa doença. Ao ficar internada, precisou fazer uma curetagem, procedimento no qual se retira material placentário da região uterina. Após uma semana, contudo, os trofoblastos voltaram a se multiplicar, o que fez a jovem ter que se submeter novamente ao processo.
;O tratamento da mola hidatiforme é mesmo a interrupção da gravidez, com o esvaziamento do útero e o retorno à normalidade. No caso da mola completa, entretanto, a paciente deve ser acompanhada por cerca de seis meses, para se detectar a possibilidade do desenvolvimento do coriocarcinoma, um tumor maligno;, explica Ana Maria Arruda Lana, professora associada do Departamento de Anatomia Patológica e Medicina Legal da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). ;Após o esvaziamento uterino, as pacientes são submetidas a radiografias de tórax, exames laboratoriais e físicos, para pesquisa de metástases. Além disso, acompanha-se semanalmente a taxa do hormônio gonadotrofina coriônica (;-hCG), que comprova se a pessoa está grávida ou não. Cerca de 80% dessas pacientes evoluem para a cura e apenas 20% necessitarão de tratamento quimioterápico;, descreve Filippo.
Efeitos
Jéssica faz parte desses 20%. Por isso, precisou fazer quimioterapia nos últimos seis meses. Foram nove sessões com um medicamento e oito com outro. ;Passei esse tempo com enjoo e emagreci 17kg, porque não conseguia comer, de tão fortes que eram os remédios;, comenta. Os cabelos da jovem caíram, mas ela manteve a confiança e melhorou. Desde 11 de agosto, não precisa mais se submeter à quimioterapia, mas terá de fazer acompanhamentos mensais.
;A doença trofoblástica mostra variações geográficas na sua ocorrência. Nos países ocidentais, inclusive o Brasil, a mola hidatiforme completa tem incidência de 1 caso para cada 5 mil a 8 mil gestações, sendo bem mais frequente em países asiáticos;, afirma Ana Maria. De acordo com a professora, as DTGs em geral ocorrem mais ;nos extremos da idade reprodutiva;: antes dos 20 anos e depois dos 35-40 anos de idade.
Ana Maria Arruda Lana ressalta que um outro problema que pode afetar as gestantes é a mola hidatiforme parcial, em que um óvulo normal é fecundado por dois espermatozoides. ;Essa doença está presente em abortos com anomalias cromossômicas, em que o feto chega a se desenvolver até certo ponto. Em seguida, ocorre o aborto, precoce ou tardio;, descreve. Marcelo Filippo completa dizendo que os embriões, nesse caso, não são normais, pois têm carga genética com 69 cromossomos, em vez de 46. ;Isso pode levar a múltiplas malformações e, na maioria das vezes, à morte do bebê ainda dentro do útero;, relata o médico. O tratamento, segundo ele, é o mesmo do recomendado para a mola hidatiforme completa.
Coriocarcinoma
No entanto, a DTG mais grave é o coriocarcinoma, tumor maligno que pode surgir em qualquer tipo de gravidez ; mas que é mais comum em quem teve mola hidatiforme completa. ;Muito raramente, essa doença pode surgir na placenta de uma gravidez normal e, independentemente de gravidez, a partir de células indiferenciadas, inclusive no sexo masculino;, ressalta a professora da UFMG. ;É um tumor maligno, detectado não propriamente pelos sintomas, mas principalmente pela presença de níveis elevados e persistentes de ;-hCG no sangue e na urina;, diz.
Diagnóstico por ecos
Esse exame médico consiste no uso de ultrassom para analisar os órgãos reprodutores. Quando inserido no corpo por uma sonda, o som é refletido pelos órgãos internos. O retorno dos ecos é convertido em uma série de imagens no monitor, que permitem ao médico ver a forma, o estado e a posição, tanto do útero quanto das trompas e dos ovários.