Ciência e Saúde

Pesquisa conclui que tendemos a escolher o mais alto como líder de um grupo

Depois de analisar dados de eleições nos EUA, pesquisadores da Universidade do Texas concluem que as pessoas tendem a preferir candidatos mais altos e fortes. O comportamento teria sido herdado dos tempos das cavernas, quando as características físicas eram fundamentais para um líder

Paloma Oliveto
postado em 19/10/2011 09:22
Do alto de seus cerca de 1,65m, Napoleão Bonaparte é uma figura que acumula superlativos na história. Com um talento raro de estrategista, dirigiu exércitos com mais de 600 mil homens, conquistou praticamente toda a Europa e, ainda que sua biografia seja controversa, é certo que se autodeclarou imperador com o apoio da população. Grande general e maior herói da França são alguns dos adjetivos usados em textos sobre o militar de baixa estatura ; seus inimigos diziam que ele tinha apenas 1,55m, enquanto há historiadores que defendem 1,68m.

O fascínio despertado por Bonaparte é exceção a uma regra identificada por cientistas políticos da Universidade do Texas. Em uma pesquisa publicada na edição de ontem da revista Social Science Quarterly, Gregg R. Murray e seu aluno de graduação J. David Schmitz, baseados em teorias da psicologia evolutiva, garantem que a escolha de um líder ainda segue padrões da Idade da Pedra. Por uma questão de sobrevivência, homens e mulheres tenderiam, até hoje, a escolher o mais alto como chefe de um grupo.

Depois de analisar dados de eleições nos EUA, pesquisadores da Universidade do Texas concluem que as pessoas tendem a preferir candidatos mais altos e fortes. O comportamento teria sido herdado dos tempos das cavernas, quando as características físicas eram fundamentais para um líderDe acordo com os pesquisadores, características desenvolvidas pelos primeiros Homo sapiens ainda povoam o inconsciente humano em diversas ocasiões, mesmo que não sejam mais necessárias. Eles citam no artigo a predisposição de ingerir alimentos gordurosos, a chamada junk food, como um exemplo dessa realidade ; no passado, o estoque de calorias era importante, pois nunca se sabia quando um bisão ou um mamute estariam disponíveis para caça. Os autores também destacam o medo ;irracional; de cobras.

Quando vivia em cavernas, o homem precisava temer o animal, pois qualquer descuido poderia significar a morte. Porém, em um mundo cada vez mais urbano, é preciso ir ao zoológico para ver esses répteis. Mesmo assim, a maioria das pessoas se arrepia só de pensar naquele bicho de pele gelada e dentinhos afiados.

Em entrevista ao Correio, Murray, professor do Departamento de Ciências Políticas da Universidade do Texas, lembra que 99% da existência humana se deu em um contexto de sociedades caçadoras-coletoras. ;O cérebro do homem moderno tem uma concepção de liderança similar à dos hominídeos que viviam em um ambiente evolutivo. Naquela época, as pessoas moravam em tribos de cinco a 150 membros. O conflito era algo comum, à medida que indivíduos e grupos competiam por terra, comida e status;, diz. ;Na luta pela sobrevivência, o poder muitas vezes era centralizado em um líder que, devido ao ambiente violento, tinha de possuir qualidades que incluíam força e habilidade de lutar, características fortemente ligadas à altura;, completa.

Lembrando que a primeira impressão é, geralmente, a que fica, o especialista diz que os traços físicos ainda são um forte componente do julgamento humano. ;Pessoas com uma estatura substancial tendem a ser mais temidas e respeitadas por seus oponentes em potencial. De maneira similar, indivíduos com essa característica física são percebidos como capazes e competentes. Não à toa, as pessoas tendem a preferir líderes que são fisicamente dominantes;, acredita.

Os humanos não são os únicos. Murray conta que experimentos com chimpanzés e outros primatas mostram que os primos próximos do Homo sapiens também valorizam a aparência. O cientista político explica, porém, que a altura não predispõe, biologicamente, à liderança. Segundo ele, o que acontece é que, independentemente de seu potencial, os altos já contam com a boa vontade natural dos demais. ;Isso os ajuda a emergirem como líderes.;

Se era assim que funcionava no tempo das cavernas, os pesquisadores do Texas desconfiaram que o homem moderno ainda levaria a altura em consideração na hora de escolher seus líderes. Mas, dessa vez, pelo voto. Eles, então, investigaram o ;índice de altura presidencial; dos Estados Unidos. ;Esse índice reflete um fenômeno americano observado entre 1789 e 2008: nos dois partidos majoritários (Republicanos e Democratas), os mais altos obtiveram a maior parte do voto popular em 67% das eleições, e ganharam 58% das disputas;, conta o pesquisador. Outros estudos, diz Murray, já mostraram que os candidatos escolhidos pelos partidos são, geralmente, mais altos que o cidadão comum nos Estados Unidos. ;Isso tem realmente um efeito sobre a liderança política? Acreditamos que sim;, garante.

Murray argumenta que o comportamento político está sujeito a efeitos biológicos. ;Trabalhamos sob a perspectiva da psicologia evolutiva, segundo a qual o comportamento humano universal está relacionado a mecanismos ligados a problemas encarados por nossos ancestrais. Esse ramo da psicologia sugere que o comportamento é a soma do meio e das adaptações evolutivas;, explica. De acordo com ele, as teorias e os métodos da psicologia evolutiva não são usados apenas no ramo da antropologia e da psicologia, mas em estudos sobre economia, populacionais e até criminais. O caráter do artigo publicado na Social Science Quarterly é universal, diz Murray. ;Escavações em sítios arqueológicos pré-clássicos e também dos maias mostram que os líderes eram sempre os mais fortes.;

Sucesso profissional
O professor de negócios da Universidade da Flórida Timothy Judge, que não participou desse estudo, concorda com a avaliação de Gregg R. Murray e J. David Schmitz. Há sete anos, ele fez uma pesquisa e descobriu que pessoas baixas recebem salários menores e relatam ser menos respeitadas e ter menos status que os altos.

;A altura importa no sucesso da carreira;, afirma Judge. ;E isso é algo preocupante porque, com poucas exceções, como jogadores de basquete, não há nada na altura que atribua uma habilidade essencial para a performance no trabalho nem na qualificação do profissional;, argumenta.

A pesquisa de Judge baseou-se no resultado de quatro estudos ; um dos Estados Unidos e outro do Reino Unido ;, que acompanhou milhares de participantes desde a infância até a idade adulta, examinando detalhes de seu trabalho e vida pessoal. Ele descobriu que alguns centímetros a mais podem custar muitos dólares. Cada polegada ; equivalente a 2,54cm ; significava US$ 789 a mais no salário anual.

Por isso, ele concorda com as conclusões dos cientistas da Universidade do Texas. ;Quando os homens ainda viviam nas selvas ou planícies, eles buscavam líderes altos e fortes, que poderiam protegê-los melhor. Apesar de milhares de anos terem se passado, os psicólogos evolucionistas argumentam que alguns desses antigos padrões ainda operam em nossa percepção hoje;, conta. ;Já se passaram mais de 100 anos desde que os americanos escolheram um presidente mais baixo que a altura média da população. Eleito em 1896, o presidente William McKinley, que media 1,70m, era ridicularizado pela imprensa, chamado de ;pequeno garoto;;, lembra Judge.

Embora reconheça que receberá críticas de colegas céticos, Murray diz que, em ciências sociais, não se prova nada, apenas são feitas interpretações de resultados. ;Nós apresentamos evidências que fundamentam nossos argumentos;, sustenta. Além do ;índice de altura presidencial;, o pesquisador fez um teste com 467 estudantes de universidades públicas e privadas dos Estados Unidos. Sessenta e quatro por cento dos participantes desenharam líderes mais altos que a média da população quando os cientistas pediram que representassem, em imagem, um ;líder nacional ideal; e um ;típico cidadão;.

Em outro experimento, os mesmos estudantes responderam um questionário no qual diziam se tendiam ou não à liderança. ;Os mais altos foram os que mais disseram que se viam como líderes;, diz Murray.

Sistema eleitoral
Nos Estados Unidos, o presidente não é eleito diretamente pelo voto popular, mas por delegados estaduais escolhidos pelo povo. No pleito, o eleitor vota no candidato à Presidência, mas esse voto não é computado diretamente, servindo apenas para escolher os delegados que vão representar o estado. Por isso, pode acontecer de um candidato ter o maior número de votos populares e não ganhar as eleições, como em 2000, quando Al Gore teve 500 mil votos a mais que George W. Bush, mas foi derrotado nos colégios eleitorais.

Disputa acirrada
Se Murray e Schmitz estiverem certos, o presidente Barack Obama tem de tomar cuidado com seus oponentes no próximo pleito dos EUA. Rick Perry, senador republicano do Texas, bem posicionado para enfrentar Obama nas urnas, tem a mesma altura do atual presidente. Já Mitt Romney, candidato mais provável a representar o partido dos Republicanos, leva vantagem na altura: mede 1,89m.

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