Ciência e Saúde

Inspiração nas cobras: Três perguntas para - Cecilia Riquelme, bióloga

postado em 28/10/2011 08:51
Por que estudar a fisiologia das cobras, já que os cientistas costumam fazer experimentos com ratos de laboratório?
Eu fiquei fascinada quando li um artigo na revista Nature, em 1998, publicado pelo biólogo e ganhador do prêmio Pulitzer Jared Diamond. Ele escreveu sobre a regulação fisiológica e as adaptações das pítons em situações extremas. Realmente, a maioria de nós, acadêmicos, prefere estudar em ratos ou camundongos, mas estou sempre atrás de novidades. O que Diamond descreveu foi que esse tipo de cobra pode viver por 12 meses sem comer nada e sem que nada de ruim aconteça com elas. Por exemplo, elas não perdem massa muscular, como ocorre com os mamíferos. Quando volta a comer, a píton devora uma imensa refeição, e o que realmente impressiona é que seus órgãos, exceto o cérebro, quase dobram de tamanho. Os órgãos ficam enormes por alguns poucos dias e, depois da digestão, voltam ao normal. O artigo de Diamond mostrou que se os níveis de insulina e lipídeos do sangue das pítons fossem injetados em qualquer um de nós ; eu, você ou um rato ;, nós estaríamos absurdamente intoxicados. Com as pítons, porém, não acontece nada.

[SAIBAMAIS]Qual seria a aplicação para humanos?
O coração de um mamífero pode ficar muito maior que o normal devido a doenças genéticas, a hábitos ruins ou a pressão alta não tratada. Ao longo da vida, a píton passa por esse processo de aumento do órgão, sem que sua saúde seja afetada de forma negativa. Eu e minha equipe pensamos, então, que poderíamos desenvolver uma droga ou outro método terapêutico que combata uma doença e faça o coração ficar mais saudável. Exercícios físicos e dieta geralmente são a receita certa, mas muitas pessoas não podem se exercitar e, para outras, nem mesmo isso dá certo. Nossa ideia é descobrir se podemos estimular um processo similar nos mamíferos, de forma que o coração conseguisse tirar proveito desse aumento, resultado de doenças. Um medicamento poderia, por exemplo, reverter os danos já provocados.

Trabalhar com cobras é mais difícil do que lidar com ratinhos de laboratório?
Muitas pessoas acham que sim, mas não é bem assim. É claro que você está trabalhando com animais enormes. Elas não são venenosas, mas têm presas fortes para subjugar a presa. Fazemos as pesquisas quando as cobras estão com cerca de 1,5m de comprimento, mas essas espécies estão entre as maiores do mundo. Se saírem do ambiente natural ; onde ficam meses sem comer ; e passarem a ser alimentadas constantemente, elas continuam a crescer. Não é difícil encontrar pítons que ultrapassam os 9m de comprimento. Então, é claro que trabalhar com elas pode ser um desafio, mas, basicamente, o que precisamos fazer é ser cuidadosos na hora de manejá-las.

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