Ciência e Saúde

Na diabetes insipidus não é preciso se preocupar com a produção de insulina

postado em 29/10/2011 08:00
Toda vez que entra em um consultório médico, a aposentada Esther França, 43 anos, diz a mesma coisa ao especialista que a recebe. ;Tenho diabetes insipidus, um tipo diferente. Não é o melito, é o diabetes insipidus.; Apesar de o aviso da paciente enfatizar a segunda palavra do nome da doença, médicos e técnicos de enfermagem parecem ouvir apenas a primeira, diabetes, e insistem em espetar o dedo de Esther para exames de glicose no sangue. ;Eu canso de repetir que posso comer açúcar tranquilamente e que o meu problema não tem nada a ver com insulina, mas não adianta: falou em diabetes, querem furar meu dedo.; A doença de Esther causa esse tipo de confusão com frequência. Tipo muito raro, pouca gente conhece casos reais da diabetes insipidus, que não interfere no nível de glicose no sangue.

A síndrome é uma deficiência na produção ou no funcionamento do hormônio antidiurético (ADH) também conhecido como vassopressina. O hormônio é produzido no hipotálamo e controla a quantidade de água no corpo. A vassopressina age principalmente nos túbulos renais, impedindo que os rins percam água pela urina. Atua também na remoção, filtração e reabsorção de fluidos na corrente sanguínea pelos rins. Quando falta água no organismo, o ADH é responsável por provocar a sensação de sede e diminuir a excreção de água. Na situação oposta, a glândula hipófise suspende a produção do hormônio para estimular a liberação de água pela urina. A falta da vassopressina faz com que a água necessária ao bom funcionamento do organismo e que deveria ser reabsorvida passe direto pelos rins e seja eliminada pela urina, que fica muito diluída.

O diabetes insipidus pode ser causado por um problema na produção do hormônio antidiurético, que não é liberado mesmo em situações de desidratação. Nesse caso, o diabetes insípidus é do tipo central. Um problema nos rins também pode fazer com que eles não respondam mais ao hormônio, originando a doença em sua forma nefrogênica. O principal sintoma é a poliúria, aumento massivo do fluxo urinário, além da sede constante do paciente, que expele muito mais líquido do que ingeriu, causando séria desidratação e outros problemas consequentes.

Desconhecimento
Por ser uma doença pouco comum, o diagnóstico é difícil e só ocorre com exames laboratoriais específicos, após descartadas outras possibilidades mais prováveis. Para Esther, a maior dificuldade foi o desconhecimento de casos reais por grande parte dos profissionais que a atenderam. ;Alguns dos médicos e enfermeiros nunca tinham visto um paciente com isso. Só ouviram falar na faculdade.; O diabetes insipidus de Esther se originou do tratamento de um câncer de mama, diagnosticado em março de 2008. Ao iniciar a radioterapia, a aposentada começou a sentir cansaço, dificuldade respiratória, mãos murchas e grave desidratação.

Apesar de beber muita água, devido à sede constante, a quantidade expelida pela urina era muito superior à ingerida, deixando o marido, Eduardo França, preocupado. Técnico em enfermagem há 30 anos, Eduardo desconfiou dos sintomas apresentados pela esposa, que foi hospitalizada diversas vezes, chegando a respirar com a ajuda de aparelhos em algumas ocasiões. ;O nível de consciência dela estava rebaixado. Ela chegou a ter lapsos de memória. Teve um mês inteiro em que ela não se lembrava de nada. Já chegou inconsciente ao hospital.;

Para tratar problemas pulmonares originados de outras doenças que desenvolveu, Esther tomou corticoides, que só pioraram a situação. Após um ano de internações e problemas respiratórios e de memória e dor de cabeça constante, uma médica que a atendeu levantou a hipótese da doença hormonal. ;Foi a primeira vez que ouvi o nome diabetes insipidus, mas, pelo que fui entendendo, se confirmasse a doença, explicava muita coisa.; Após um exame de osmolaridade da urina, em que Esther expeliu 11 litros de água, apesar de ter ingerido apenas três, a doença foi diagnosticada.

Grupo amplo
O amplo destaque comumente dado ao diabetes melito faz com que muitas pessoas relacionem a doença tipo insipidus diretamente à glicose e à insulina. Na verdade, o nome diabetes é mais abrangente. É um grupo de doenças metabólicas associadas a disfunções e insuficiência de vários órgãos. Pode resultar de defeitos na secreção e/ou ação de hormônios como a insulina (melito) e o ADH (insipidus). O endocrinologista Antônio Bosco alerta que também não se deve confundir o diabetes insipidus com doenças renais. ;Como decorre de uma alteração hormonal específica, é considerada uma patologia endócrina, e não renal.;

As origens do diabetes insipidus são variadas, embora alguns casos sejam idiopáticos, sem razão aparente. Para Bosco, até metade dos pacientes do tipo central tem a síndrome originada em outros tipos de doenças e problemas. ;As causas podem ser genéticas, hereditárias ou, mais comumente, adquiridas. Lesões e traumas, tumores e doenças infecciosas e granulomatosas são as causas mais comuns, mas, em até 50% dos pacientes, não se consegue definir uma etiologia. No diabetes insipidus nefrogênico, as principais causas são uso de medicamentos (uso de carbonato de lítio é a mais comum), doenças renais, metabólicas e sistêmicas.;

A gravidez também pode levar ao diabetes insipidus, que é geralmente transitório e sem necessidade de tratamento. No caso de Esther, apesar de não ter sido confirmada a causa do problema, tudo indica que ela apareceu em consequência da radiologia do tratamento do câncer de mama.

O tratamento é simples. O hormônio em falta é reposto via oral ou intranasal, no caso do diabetes insipidus central. O tratamento do tipo nefrogênico é feito com a suspensão do lítio ou a correção dos distúrbios do cálcio e do potássio.

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