Ciência e Saúde

Medo prejudica a procriação em animais e até na busca por alimentos

Paloma Oliveto
postado em 09/12/2011 10:28
Espécie de pardal estudada: o temor dos predadores paralisa

Na história da evolução, o medo sempre foi uma característica associada à sobrevivência. Graças ao temor de serem devorados, os animais ficam alertas, evitando o perigo. Mas nem sempre o receio conta a favor das espécies. Em alguns casos, os bichos, de tanto temerem ficar cara a cara com o inimigo, alteram seu comportamento e passam a produzir menos filhotes ou simplesmente deixam de se aventurar em busca de alimento.

O mais recente estudo sobre o tema está publicado na edição de hoje da revista Science. Uma equipe canadense mostra que, no caso dos pardais, só de ouvir o som de ameaça, as fêmeas diminuem a produção de filhotes. Liderados pela bióloga Liana Zanette, da Universidade de Western Ontario, os cientistas estudaram o comportamento da espécie Melospiza melodia na Colúmbia Britânica (Canadá). Na região, as pardocas costumam ter duas crias por ano. A experiência mostrou que 40% da ninhada se perde devido ao medo dos predadores. ;Franklin D. Roosevelt disse que a única coisa que temos que temer é o próprio medo. E os nossos resultados revelam que, pelo menos quando se trata da vida selvagem, a retórica reflete com precisão um fato biológico;, diz Zanette, em teleconferência de imprensa.

Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores eliminaram os predadores naturais, protegendo cada ninho do experimento com uma cerca elétrica. Com corujas, texugos e falcões longe dos ninhos, os cientistas simularam o perigo usando gravações. De quatro em quatro dias, eles colocavam os sons perto das fêmeas, repetindo-os com intervalos de poucos minutos.

Ao longo de toda a primavera, câmeras monitoraram os passos das fêmeas e mostraram a diminuição da ninhada. Além disso, as aves evitavam deixar seus ninhos para ir atrás de comida, privando os filhotes de alimentação adequada.

;É o que chamamos de ;ecologia do medo;;, explica ao Correio William Ripple, pesquisador da Universidade de Washington que estuda o comportamento de animais terrestres e marinhos diante do perigo. Na vida selvagem, conta, alces costumam mudar de hábitos quando há muitos lobos por perto, liberando mais substâncias relacionadas ao estresse ; o que afeta a reprodução ; e ficando mais tempo entocados. ;Isso também acontece no mar. Em regiões onde tubarões são abundantes, os peixes-bois afastam-se das águas rasas, onde podem ser facilmente vistos, justamente o local onde está a base de sua alimentação;, conta. A consequência é que esses mamíferos preferem passar fome a se arriscar.

De acordo com Michael Quinchi, que também participou do estudo publicado pela Science, esses fenômenos têm importantes implicações no manejo e na conservação da vida selvagem. ;Atualmente, por exemplo, debate-se a reintrodução de lobos no Parque Nacional de Yellowstone, nos Estados Unidos, que ocorreu em 1995. Desde então, a população de alces caiu pela metade e, consequentemente, a vegetação que eles consomem floresceu.; Segundo Quinchi, o ecossistema original do parque foi restaurado não porque os lobos comeram metade dos alces, mas devido ao fato de que os cervídeos começaram a reproduzir menos. ;Os efeitos da interação predador-presa são muito maiores que imaginávamos;, constata.

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