postado em 14/01/2012 08:00
A solução para a progéria, doença genética extremamente rara que causa o envelhecimento precoce, pode estar nas células-tronco. Essas estruturas, que têm a capacidade de se autorreplicar e se diferenciar em vários tecidos, estariam diretamente ligadas às modificações no organismo percebidas à medida que os seres vivos envelhecem. A conclusão consta de um estudo da Escola de Medicina da Universidade de Pittsburgh (Estados Unidos) publicado recentemente na revista científica Nature Communications. O grupo de pesquisadores descobriu que as células-tronco dos músculos de ratos idosos ou com distúrbios de envelhecimento acelerado não funcionam tão bem quanto as presentes no corpo de ratos jovens. ;Em análise laboratorial, notamos que elas proliferam com menor frequência, têm dificuldades em se tornar tecidos musculares, ossos e cartilagens, além de não conseguirem regenerar estruturas danificadas;, descreveu ao Correio uma das autoras do estudo, Laura Niedernhofer, professora do Departamento de Microbiologia e Genética Molecular da universidade norte-americana.;Em seguida, questionamos se essa perda da função das células-tronco contribui para as mudanças que vêm com a velhice ou se seriam apenas uma consequência disso;, recorda. Para responder esse tópico, a equipe de cientistas injetou novas estruturas, vindas do tecido muscular de ratos jovens e saudáveis ; com 17 dias de vida ;, na barriga de roedores que tinham progéria e, portanto, possuíam expectativa de vida de 21 a 28 dias. ;Com essa aplicação, estendemos o tempo de vida desses animais em até três vezes, já que alguns ficaram vivos até os 66 dias;, conta Laura.
O procedimento também retardou o início dos sintomas associados à idade avançada, como instabilidade ao caminhar, tremores, inatividade, perda de massa muscular e má postura. A partir dessa análise, a professora de genética molecular e seus colegas concluíram que as células-tronco ineficientes são a causa, não a consequência do envelhecimento.
Como as novas unidades migraram para diversos tecidos após a injeção, sem se concentrar em nenhum especificamente, os pesquisadores acreditam que elas agem no organismo de modo a estimular as outras células a funcionarem corretamente. ;Desse modo, podemos estimar que, futuramente, as células-tronco dos músculos adultos serão uma boa opção de tratamento para pessoas com progéria, principalmente porque podem ser desenvolvidas fora do corpo humano para se dividir em muitas estruturas;, afirma a norte-americana.
Ela, no entanto, pondera que, para o tratamento da doença, o ideal seria que cada paciente recebesse injeção das unidades produzidas no próprio organismo, a fim de evitar rejeições imunológicas. Para isso, Laura sustenta que ;o certo seria começar o processo com a correção da mutação do gene que causa a doença a partir de terapia genética;. Só depois, então, ocorreria o transplante autólogo (em que o material transferido é da própria pessoa).
De acordo com a autora, o trabalho mostra que manter a boa atuação das células-tronco é importante para o vigor do corpo humano. ;Consequentemente, substituir as estruturas adultas ou conseguir rejuvenescê-las pode ser uma opção terapêutica viável não apenas para quem sofre com a progéria, mas também para quem quer se manter saudável à medida que a idade chega;, conclui.
Rara e grave
A progéria é um grupo de doenças genéticas raras que atingem um indivíduo no mundo em cada 8 milhões, e fazem com que a pessoa afetada tenha sobrevida de, aproximadamente, 13 anos. O geneticista Salmo Raskin, presidente da Sociedade Brasileira de Genética Médica e diretor do laboratório de análises clínicas Genetika, explica que a patologia é causada pelo acúmulo anormal da proteína progerina no interior das células. ;O excesso de progerina destrói estruturas e vias metabólicas importantes, acelerando o processo de envelhecimento normal celular e do organismo. As consequências são que, tanto do ponto de vista do aspecto físico quanto de sua saúde, a pessoa com Progeria tem uma ;idade; muito superior à sua idade cronológica;, descreve. Ele comenta que existem vários subtipos da doença, como o xeroderma pigmentoso ; que era a alteração genética presente no corpo dos ratos da pesquisa ; e o mal de Hutchinson;Gilford, a forma mais típica.
Entre as características de quem possui o problema, a geneticista Paula Frassinetti Vasconcelos de Medeiros, professora da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) e integrante da Sociedade Brasileira de Genética Médica, cita pele mais fina, nariz pontiagudo, vasos do crânio salientes, perda de cabelos e aparência física semelhante à de idosos. ;Além disso, há problemas de articulação, oftalmológicos e cardíacos;, detalha. Segundo a médica, que vem tratando o caso de uma menina de 5 anos com progéria, o estudo com células-tronco sem dúvida pode ser uma esperança para tratar a patologia. ;Mas essas pesquisas ainda são muito incipientes. Há um longo caminho até comprovar que os resultados em humanos podem ser os mesmos que os obtidos em ratos;, alerta.
Raskin concorda com Paula quanto à relevância da pesquisa norte-americana. ;Achei especialmente importante a parte da pesquisa na qual foram aplicadas células-tronco novas na barriga dos ratos com a doença e a comprovação de que isso prolongou a vida deles, bem como reduziu a velocidade de envelhecimento;, ressalta o geneticista. ;Esse fato é novo e abre caminho para pesquisas futuras que possam testar a modalidade de tratamento de rejuvenescimento em humanos;, acrescenta. Ele adverte que o experimento precisa ser repetido por outros cientistas e em ratos com outros tipos de progéria, em especial nos com Hutchinson;Gilford, para que os resultados tenham mais valor.
A professora da UFCG comenta que a necessidade de outras análises científicas sobre o assunto vale não apenas para a terapia com essas unidades, mas também para a busca de outros medicamentos que possam ser usados em tais pacientes. ;Atualmente, há três drogas sendo avaliadas para melhorar a qualidade de vida deles, bem como para fazer com que vivam mais. Um dos remédios é específico para inibir a enzima que potencializa a progerina, mas o problema é que o grupo disponível de pessoas que poderiam ser voluntárias para fazer os testes é muito pequeno;, lamenta.