Chicago - A palavra "mãe" demonstra que foi na atual Turquia que se originaram centenas de línguas tão diversas, como o hindi, o espanhol, o russo, o holandês, o albanês e o inglês, segundo estudo publicado na edição desta quinta-feira (23/8) da revista Science.
Graças a um complexo modelo informático projetado originalmente para mapear epidemias, cientistas detalharam a evolução da família das línguas indoeuropeias.
Semelhanças entre centenas de línguas faladas da Islândia à Índia deram lugar a acalorados debates sobre o local onde se originaram e o que sua propagação e evolução podem dizer sobre os primeiros humanos.
A teoria dominante é que as línguas faladas atualmente por 3 bilhões de pessoas provêm de nômades da Idade do Bronze, que utilizaram cavalos e carroças para se espalhar ao leste e a oeste das estepes do norte do Mar Cáspio, perto da atual Ucrânia, de 5.000 a 6.000 anos atrás.
Outros afirmam que foi a agricultura - e não o cavalo e a roda - que ajudou a difundir as línguas e apontam suas origens para a atual Turquia há 8.000 ou 9.500 anos.
Este último estudo publicado na Science usou uma enorme base de dados de palavras comuns ou afins, tanto modernas quanto antigas, e identificou as raízes da linguagem na atual Turquia e não nas estepes.
"Este é um dos exemplos-chave propostos de que a agricultura é uma força importante na formação da diversidade linguística mundial", disse o autor principal do estudo, Quentin Atkinson, psicólogo evolutivo da Universidade de Auckland, na Nova Zelândia.
Os resultados se baseiam em investigações arqueológicas e genéticas que sugeriram que a migração humana precoce ajudou a estimular a expansão da agricultura, afirmou Atkinson.
"Não é que todos os caçadores-coletores estavam na Europa e olharam por cima da cerca e viram que seus vizinhos cultivavam e começaram a fazer o mesmo. Houve uma movimentação real de pessoas", disse.
"Os idiomas sugerem que foi um movimento cultural também; os caçadores-coletores não estavam só arando, também estavam adotando uma cultura e uma língua", acrescentou.
O uso de métodos projetados originalmente pelos epidemiologistas para rastrear a linguagem faz sentido porque há tempos foram percebidas similaridades entre a evolução dos seres vivos e as línguas vivas, explicou Atkinson.
"Darwin fala a respeito, em ;A Origem das Espécies; e em ;A Origem do Homem;; se refere a eles como ;estes curiosos paralelismos;", acrescentou.
Os biólogos que buscam a origem de uma pandemia tomam amostras em vários locais, sequenciam o DNA e fazem um mapa de como o vírus evoluiu ao longo do tempo, observando como seus genes foram modificados.
"Uma vez que se tem a árvore genealógica, é possível rastrear a origem em seus galhos", afirmou Atkinson durante entrevista por telefone.
"O que fizemos foi aplicar o mesmo enfoque aos idiomas", emendou.
A equipe construiu uma base de dados de palavras afins, como ;madre; em espanhol, ;mother; em inglês, ;moeder; em holandês, ;mat; em russo, ;mitera; em grego e ;mam; em hindi.
Em seguida criaram uma árvore genealógica dos idiomas, que os situava no tempo e no espaço e dava conta das perdas e danos de cognatos (termos com mesma origem etimológica, mas com evolução fonética distinta). Assim, concluíram que estes cognatos derivam da palavra proto-indoeuropeia "mehter".
"É um grande avanço", disse o arqueólogo Colin Renfrew, da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, em outro artigo publicado na Science.
Mas nem todo mundo está convencido. "Há tanto neste trabalho que é arbitrário", afirmou Victor Mair, especialista em idioma chinês da Universidade da Pensilvânia, à revista Science.
O modelo de Atkinson se baseia em saltos lógicos nas mudanças linguísticas e na forma como os idiomas se difundiram, disse Mair, enquanto a hipótese das estepes "se baseia em dados arqueológicos, como os padrões de enterro, que estão diretamente ligados a materiais datáveis".