Marcela Ulhoa
postado em 20/09/2012 06:00
Entrevista / Rosa Passos
"Chega uma hora que você pifa"
Em uma época marcada por longas e intensas jornadas de trabalho, é cada vez mais difícil enfrentar o cansaço extremo e as pressões sociais. É nesse contexto que surge a síndrome de burnout, um distúrbio diretamente relacionado ao esgotamento profissional e que divide muitos sintomas com a depressão. Em 2008, a cantora e compositora Rosa Passos literalmente "pifou" diante do estresse causado pela agenda superlotada de shows. Em entrevista ao Correio, a baiana radicada em Brasília conta as dificuldades e os aprendizados vividos nos quatro anos em que ficou afastada da música, sua segunda paixão, depois da família, para se tratar da depressão e da síndrome.
Como a senhora descobriu que estava com a síndrome de burnout?
Eu não percebi que estava com a síndrome, eu percebi que não estava bem. Todas as vezes que tinha que fazer uma viagem internacional, sentia uma sensação de desânimo, total desinteresse e medo. Eu estava com uma agenda de shows muito dura, passava o ano todo viajando. Depois de 16 anos nesse pique, comecei a sentir coisas estranhas no meu organismo. Isso foi se agravando depois de duas grandes perdas em 2006, quando meu pai e minha tia faleceram. Não tive oportunidade de ir aos dois enterros porque estava em viagem. Cheguei ao auge no último show de 2008, em Sorocaba (SP), e percebi que não tinha condições nenhuma de sair de casa. Tinha cumprido minhas missões do ano com muito sacrifício. Musicalmente, estava ótima, mas pessoalmente, estava acabada. Foi quando procurei minha médica para ver o que estava acontecendo.
E o que a senhora sentia?
Uma das primeiras coisas que surgiu foi o medo de avião, porque liga diretamente ao trabalho. Só fui entrar novamente em um em junho deste ano. Nem para passear eu queria. Além disso, tinha ânsia de vômito, mãos frias e não conseguia olhar para o meu violão sem sentir uma coisa ruim, um enjoo. Eu tinha muita diarreia, emagreci 7kg. É uma sensação muito desagradável, tinha a impressão de que ia morrer. Porque, junto com a síndrome, eu estava deprimida também. Eu sou muito responsável e fui levando os shows debilitada, não falava para ninguém que estava mal.
Como a senhora conseguiu se recuperar?
Eu me recolhi. Para você melhorar, você tem de se afastar completamente do trabalho que te deixou assim e, junto com a medicação, fazer uma terapia e ter o apoio da família. Eu tive tudo isso e passei quatro anos em casa. Foi assim que me descobri como pessoa, além de cantora, sempre gostei de ser dona de casa. Descobri meu lado artesão, mexi com flores, papeis coloridos e me dediquei aos meus animais. Tenho cinco cachorros e quatro gatinhos que me energizaram muito. Sou kardecista também e esse acompanhamento espiritual me ajudou bastante.
Como foi o retorno aos palcos este ano?
Eu resolvi que voltaria à música quando me sentisse pronta. Na verdade, não foi a música que me deixou assim, foi a carreira, tudo o que me fazia chegar ao palco. Quando resolvi tocar no meu violão, já estava muito bem. Ele é meu parceiro, precisava respeitá-lo e também me respeitar. Nesse período de quatro anos, nunca deixei de receber muitos convites, mas retomei a carreira de uma maneira muito minha. Quero trabalhar, mas tudo no meu limite, porque a recaída é pior. Acabei de lançar um novo CD e este ano quero investir no Brasil, sempre devagar. Sou baiana, vou lenta, lentinha, como diz Dorival Caymmi. Se não, você entra em uma roda-viva tão grande, que chega uma hora que pifa.