Agência France-Presse
postado em 18/12/2012 17:35
Paris - Em 1969, o homem pisou na lua. Em 2012, pôs as mãos em uma nova partícula elementar, provavelmente o famoso bóson de Higgs, a chamada "partícula divina", peça que faltava para compreendermos o funcionamento da massa e, consequentemente, do Universo. "Apesar da pequena dúvida que ainda paira sobre a identidade desta partícula, a balança pende para o bóson de Higgs", assegura a física Pauline Gagnon, que participou da descoberta, anunciada em 4 de julho, no Centro Europeu de Pesquisa Nuclear (Cern), situado entre França e Itália.Esta partícula é considerada pelos físicos a chave para entender a estrutura fundamental da matéria porque explica quase tudo o que os cientistas observam no mundo subatômico, permitindo entender o porque de algumas partículas têm massa e outras, não. O bóson é a partícula que atribui massa a todas as demais, segundo o chamado "Modelo Padrão", teoria atual que descreve o funcionamento das partículas fundamentais e, portanto, que explica como funciona o Universo, explicou Gagnon.
Este Modelo Padrão tinha um grande vazio, ao não explicar porque as partículas têm massa. O bóson foi proposto em 1964 por seis físicos, entre eles o britânico Peter Higgs, para explicar este buraco na teoria. Por isso, para os físicos, a descoberta do bóson de Higgs equivale à descoberta do DNA para os biólogos, avaliou Peter Knight, presidente do Instituto britânico de Física.
O bóson, ou mais precisamente, o invisível "mecanismo de Higgs", funciona como um campo que permite às partículas obter sua massa, informou. A ideia é que existe um "campo de Higgs" onde as partículas colidem permanentemente com bósons de Higgs. Estas colisões freiam seu movimento, que fica mais lento, e lhe dão aparência de massa.
O fenômeno foi comparado a um homem que tenta passar correndo em meio a uma multidão que detém sua corrida e o obriga a reduzir a velocidade. Também se compara ao campo de Higgs com uma espécie de cola em meio do qual as partículas se encontrariam relativamente aderidas, o que seria percebido como uma massa.
Ao que nosso Universo se pareceria sem o bóson de Higgs? Estaria morto, suas partículas não poderiam se unir para formar átomos e matéria, dizem os especialistas. "Não haveria estrelas, nem o menor sinal de vida. O Higgs permite à Humanidade, pela primeira vez, perceber porque a natureza é como é", disse Themis Bowcock, da Universidade britânica de Liverpool.
Até o anúncio do CERN, este inatingível bóson existia só em teoria e nas mentes dos físicos, desde as deduções de Higgs e seus colegas belgas, Robert Brout e François Englert.
Mas, a façanha realizada no Grande Colisor de Hádrons do CERN (LHC) seria, então, simbólica? "Ter uma teoria está bem, mas confirmá-la é mil vezes melhor", respondeu Pauline Gagnon, que comparou a descoberta do bóson com a confirmação de que a Terra é redonda, e com os primeiros passos do homem na Lua.
Para os cientistas, identificar o famoso bóson é só a primeira etapa de uma nova odisseia científica. "Um trampolim para passar às etapas seguintes, relativas à natureza da matéria escura, o papel da gravidade e outras questões", destacou Pierre Fayet, especialista em física teórica da Escola Normal Superior de Paris.
Para explorar estas novas pistas, os cientistas vão aproveitar "as energias de colisão muito altas previstas no CERN a partir de 2014-2015", disse Yves Sirois, que trabalha nesse centro de pesquisas.
O bóson de Higgs é denominado "partícula de Deus" a partir de um livro cujo título foi modificado. O prêmio Nobel de Física Leon Lederman queria chamá-lo "The Goddamn Particle" ("a partícula maldita"), por ser difícil de encontrar. Mas o editor tirou a terminação "damn" e o chamou "The God Particle", pois temia que a palavra "goddamn" fosse considerada insultante.