A vida da brasiliense Auristela Viana da Silva, de 23 anos, sempre foi cercada de curiosidade. O fato de a jovem ter nascido sem a língua, deformidade rara com somente três casos registrados no mundo, desperta uma enxurrada de dúvidas e surpresas. Como ela consegue falar, comer ou sentir gosto? Com 1,46m, sorridente e extremamente carinhosa, Auristela nunca teve vergonha ou se sentiu inferior por sua condição. ;Na escola, faziam uma roda ao meu redor e eu ia abrindo a minha boca para cada colega ver. Eu não tenho problema com isso, não gosto de esconder nada;, relata confiante. Mas não foram só os colegas de sala que se impressionaram. O caso de Auristela desafiou a medicina e forçou uma equipe de especialistas a encontrarem pelo menos algumas repostas para tantas dúvidas. Nesse caminho, eles desenvolveram um protocolo inédito para tratamento das sequelas da aglossia congênita isolada, nome científico dado à ausência da língua.
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Um dos principais problemas decorrentes da aglossia é a dicção. Entretanto, ao contrário do que se imagina, a fala não depende somente da língua. Todo o aparelho fonador está envolvido no processo, o que inclui, por exemplo, narinas, palato, dentes, lábios, assoalho da boca, laringe, traqueia e pulmões. Como Auristela não apresenta deformidade nessas outras estruturas, ela consegue falar desde a infância. O problema, no entanto, estava em alguns fonemas que requisitam diretamente a língua, como o ;t;, o ;d; e o ;r;. O resultado é uma fala embolada e não tão bem articulada. Para contornar a limitação, até hoje Auristela faz acompanhamento com a fonoaudióloga Maria Lúcia Torres.
;Primeiro, a gente trabalhou toda a musculatura da boca com exercícios para o lábio, a bochecha e o assoalho;, explica Torres. A especialista também ensinou uma série de técnicas para que Auristela conseguisse adaptar o som dos fonemas dificultados pela ausência da língua. ;Para falar ;tatu;, ela usa os lábios para copiar o som e o resultado é muito satisfatório. Ele não sai perfeito, mas você consegue entender o que ela está falando;, exemplifica. Outro ponto trabalhado por Torres foi a mastigação e a deglutição da brasiliense, que, antes da terapia, movimentava muito o pescoço e a cabeça para conseguir engolir os alimentos sólidos.