Ciência e Saúde

Número de cesarianas no Brasil é mais que o triplo do recomendado pela OMS

No Brasil, o índice é de 52%, enquanto a OMS recomenda 15%

postado em 29/05/2014 20:36
Enquanto a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que no máximo 15% dos partos sejam cesarianas, no Brasil o índice é de 52%, chegando a 88% na rede privada. Os dados estão na pesquisa inédita Nascer no Brasil: Inquérito Nacional sobre Parto e Nascimento, feita pela Fundação Oswaldo Cruz e o Ministério da Saúde, divulgada hoje (29).

A pesquisa acompanhou o pré-natal e o parto de 23.894 mulheres em maternidades públicas, privadas e mistas em 191 municípios em todos os estados. A coleta de dados ocorreu de fevereiro de 2011 a outubro de 2012. Para a coordenadora da pesquisa, Maria do Carmo Leal, os resultados são alarmantes, já que a intervenção cirúrgica expõe a mãe e o bebê a riscos desnecessários.

;Um prejuízo que a criança pode ter é ela nascer antes do tempo que estaria pronta para nascer e, portanto, pode ter dificuldade para respirar, pode precisar ir para uma UTI [Unidade de Tratamento Intensivo] neonatal, e isso é um imenso prejuízo no começo da vida, essa separação da mãe. Para a mãe, o primeiro risco é que a cesárea é uma cirurgia, e como tal tem maior chance de hemorragia, de infecção, e também a recuperação da mulher é pior na cesárea do que no parto vaginal;, comparou.



No Brasil, 28% das mulheres começam o pré-natal querendo a cesárea, enquanto a média mundial é de 10%. O dado preocupa a pesquisadora, que defende uma mudança na cultura do parto no país.

;Tem uma cultura na sociedade, muitas mulheres hoje realmente já acham que a cesárea é uma boa forma de ter parto. E para os médicos também, é conveniente para eles que a cesárea aconteça porque organiza a vida deles, marca uma atrás da outra e não fica à disposição do tempo que você não controla, que é o tempo de nascimento de cada criança. É verdade que médicos podem induzir a mulher a fazer a cesárea, mas o sistema está todo organizado de uma forma a promover isso;.

Segundo Maria do Carmo, nos países desenvolvidos que também vinham aumentando as taxas de cesárea, os índices começaram a diminuir por causa das evidências científicas de riscos para a mulher e para o bebê na gestação em questão e também nas seguintes. Para ela, governo e sociedade precisam se mobilizar para reverter o quadro.

;Há necessidade de políticas públicas, há necessidade das mulheres se movimentarem também, lerem mais sobre o parto e sobre o risco da cesárea. As mulheres tem um papel importante, que é se informar, mas acho que tem que ter uma mudança de atitude, de cultura médica também. Não acontece tão facilmente;, avaliou. ;O Ministério da Saúde tem trabalhado muito, já teve várias iniciativas para diminuir a quantidade de cesáreas no país e não tem obtido sucesso;, acrescentou.

Com o tema A Mãe Sabe Parir e o Bebê Sabe Como e Quando Nascer, o estudo também mostra que, mesmo nos partos normais, o atendimento não atende às boas práticas recomendadas pela OMS, o que provoca dor e sofrimento desnecessário. Entre as práticas comuns estão a de deixar a mulher em trabalho de parto apenas no leito, sem estímulo para caminhar e sem alimentação durante o período, a de oferecer remédios para acelerar as contrações e a de deixar as mulheres darem à luz deitadas, de costas.

Os dados ainda apontam que, no Brasil, entre as mães de baixo risco, apenas 19,8% tiveram presença contínua de acompanhante, 25,6% puderam se alimentar, 46,3% foram estimuladas a se movimentar e 28% tiveram acesso a procedimentos não farmacológicos para alívio da dor. Apenas 5% dos partos ocorre sem intervenções, enquanto no Reino Unido o número chega a 40%.

Quanto aos cuidados com o bebê, entre os recém-nascidos saudáveis, apenas 28,2% tiveram contato pele a pele com a mãe após o nascimento, 16,1% receberam o seio na sala de parto e 44% mamaram na primeira hora. O alojamento conjunto foi verificado em 69% dos casos. As intervenções nos bebês também são altas: 71% tiveram as vias aéreas superiores aspiradas, 39,5% passaram por aspiração gástrica, 8,8% foram para o inalador e 8,7% para a incubadora.

Das mulheres ouvidas para o levantamento, cerca de 30% não desejaram a gravidez, 2,3% tentaram interromper a gestação e 60% iniciaram o pré-natal tardiamente, após a 12; semana. Do total de mulheres, 19% eram adolescentes, sendo que 42% delas fizeram cesárea, e, com isso, ;estarão expostas a mais riscos nas gestações futuras;, segundo o estudo.

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