Paloma Oliveto
postado em 05/09/2014 06:02
No início da noite de 11 de agosto, o mundo foi pego de surpresa com a notícia de que o comediante Robin Williams havia cometido suicídio. Era o fim de uma batalha perdida contra a depressão e a dependência em álcool e cocaína. São esses justamente os principais fatores de risco de um mal que, em 2012, vitimou nada menos que 804 mil pessoas em todo o mundo, de acordo com um relatório divulgado em Genebra pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A cada 40 segundos, alguém tira a própria vida em algum lugar do globo. No Brasil, em que 11.821 pessoas praticaram o ato no período do relatório, ocorre um suicídio a cada hora, o que coloca o país no oitavo lugar em números absolutos, atrás de Índia (258.075), China (120.730), Estados Unidos (43.361), Rússia (31.997), Japão (29.442), Coreia do Sul (17.908) e Paquistão (13.377).Todas essas mortes poderiam ter sido evitadas por estratégias conjuntas de prevenção, alertou Margaret Chan, diretora-geral da OMS, em uma coletiva de imprensa. Contudo, apenas 28 países dos 193 que compõe a Organização das Nações Unidas (ONU) têm políticas preventivas nacionais ; no Brasil, embora o Ministério da Saúde tenha publicado uma portaria em 2006 instituindo as diretrizes nacionais para a prevenção do suicídio, que deveriam ser implantadas em todas as unidades da Federação, especialistas criticam a inércia das três esferas na adoção de medidas práticas. ;Nada saiu do papel;, denuncia a psiquiatra Alexandrina Meleiro, integrante da Comissão de Estudo e Prevenção de Suicídio da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e uma das maiores experts nacionais no tema. Procurado pelo Correio, o Ministério da Saúde não se manifestou até o fechamento desta edição.
[SAIBAMAIS]Embora Margaret Chan ressalte que o problema seja comum a todos os países do mundo, o relatório Prevenindo suicídio: um imperativo global evidencia que, comparado a 2000, o número de casos em cada 100 mil habitantes está diminuindo nas nações desenvolvidas, que adotaram, de fato, as políticas preventivas. A maioria das ocorrências globais ; 75% ; se concentra em países pobres e em desenvolvimento, carentes de estratégias efetivas, diz o documento.
;As diretrizes brasileiras são muito boas, foram feitas por pessoas muito competentes. Se tivessem sido implementadas, teriam ajudado muito. Mas elas não foram colocadas em prática;, lamenta a psicóloga Karen Scavacini, que participou da revisão do relatório da OMS. ;Na maioria das vezes, nem os próprios agentes do sistema de saúde sabem lidar com o suicídio;, complementa Scavacini, que, na ausência de uma instituição pública, fundou um centro de atendimento, pesquisa, ensino e extensão sobre o suicídio, o Vita Alere.
Avanço entre mulheres
No ranking elaborado pela OMS, o Brasil está na 113; posição quando se consideram as ocorrências por 100 mil habitantes. Com uma taxa de 5,8, o país fica abaixo da média mundial, que é de 11,4. Quando comparada à situação de 2000, houve um aumento de 10,4% no número de casos, sendo que, entre as mulheres de todas as idades, esse crescimento foi mais expressivo: 17,8%. Entre os homens, o percentual foi de 8,2%. A psiquiatra Alexandrina Meleiro adverte que a variação não necessariamente reflete um incremento real nos suicídios ; eles podem ser, por exemplo, sinais de que, em uma década e meia, o sistema de notificação melhorou.
Mas a especialista não descarta o contrário: ;O número também pode ser muito maior;, observa. Para ela, o aumento verificado entre mulheres sinaliza que elas estão lançando mão de meios mais agressivos para cometer suicídio. ;Tentam na proporção de três para cada homem, mas o número de suicídios é inverso: é uma mulher para cada três homens;, conta. Isso porque os homens costumam optar por métodos que dificilmente falham na triste tarefa de dar fim à própria vida. Segundo Meleiro, é possível que as mulheres tenham se rendido a esses mesmos expedientes. Entre as médicas, por exemplo, essa já é uma realidade, diz a psiquiatra e autora do livro O médico como paciente.