Belo Horizonte — “Não me lembro da primeira vez que me cortei, mas eu sentia uma angústia muito grande e não sabia como lidar com aquilo. Em algum momento, comecei a me arranhar e, depois, a me cortar. Nunca foi algo para chamar a atenção, eu escondia. Também não sentia dor, mas aliviava meu sofrimento.” As lembranças de adolescência da bióloga Carolina Costa, hoje com 25 anos, ilustram a realidade das pessoas que se automutilam para enfrentar sentimentos com os quais têm dificuldade de lidar. Não existem estudos epidemiológicos no Brasil sobre a incidência de autolesão, mas pesquisas feitas no exterior mostram que a prática vem crescendo nos últimos anos. Considerando apenas adolescentes e adultos jovens, dados mundiais mostram que de 17% a 20% deles já tiveram, em algum momento da vida, essa atitude.
“Há uma tendência em considerar esse comportamento como um transtorno psiquiátrico por si só, e não mais como comportamento relacionado a outros problemas”, diz Jackeline Giusti, psiquiatra responsável pelo Ambulatório de Adolescente e Automutilação do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP). Na edição mais recente do Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais da Associação Americana de Psiquiatria, o DSM-5, a automutilação é classificada como transtorno psiquiátrico com necessidade de estudos futuros. Já na Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10), é tida como transtorno do controle do impulso não específico, ou como um dos sintomas de transtornos de personalidade, como o borderline.
Giusti pondera, porém, que há a tendência de desvincular a automutilação de transtornos de personalidade. “Eles não têm muito tratamento, seu controle não é algo direto. Há muito paciente que se automutila e não é borderline. Primeiro, porque adolescente não tem transtorno de personalidade já que sua personalidade ainda não está formada. Tem, no máximo, traços”, explica. A automutilação geralmente começa na adolescência e é mais comum nessa faixa etária, mas pode se prolongar até a vida adulta. Cientistas australianos acompanharam, durante oito anos, pessoas que começaram a se ferir ainda jovens e concluíram que sintomas depressivos e suporte familiar fraco seriam fatores determinantes dessa persistência de comportamento.
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