Ciência e Saúde

Cientistas da USP constatam que insuficiência renal afeta a memória

postado em 19/09/2015 08:08
Um estudo brasileiro dá os primeiros passos para descobrir como a insuficiência renal ; a perda lenta, progressiva e irreversível das funções dos rins ; pode levar a problemas neurocognitivos, como perda de memória e demência. Coordenado pelo farmacologista Cristoforo Scavone, do Laboratório de Neurofarmacologia Molecular no Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP), o trabalho foi publicado neste mês na revista científica norte-americana Plos One e pode resultar em intervenções que ajudem muitos pacientes ; a estimativa é de que a prevalência de demência em pessoas com doença renal crônica chegue a 30%.

Na pesquisa, ratos passaram a ter insuficiência renal depois que os cientistas retiraram um rim e parte do outro de cada cobaia, procedimento chamado de nefrectomia. Roedores com os dois órgãos formaram o grupo de controle. Todos os animais participaram de testes de comportamento e de memória. O experimento durou 120 dias. Na primeira fase, explica Scavone, o objetivo era saber em quanto tempo surgiria o deficit cognitivo nas cobaias operadas. ;Queríamos estabelecer o decurso temporal do aparecimento do problema. Uma vez detectado, iniciamos o estudo que está descrito no trabalho publicado.;, explica o pesquisador.

Para avaliar a memória, os ratos foram colocados em uma gaiola com dois ambientes: um claro e outro escuro. Quando os bichos iam para o lado escuro, recebiam um estímulo elétrico nas patas. Um dia depois, o procedimento era repetido. Esperava-se que os animais com complicações renais, e que poderiam desenvolver consequentemente o deficit cognitivo, mudariam para o lado sem luz em menos tempo porque não se lembrariam dos choques recebidos anteriormente.

Outro teste tinha a intenção de medir o tempo que os animais demorariam para perceber mudanças no ambiente em que estavam inseridos. Os roedores foram apresentados a dois objetos iguais. Uma vez familiarizados com eles, um dos objetos era retirado e um novo, inserido. Os ratos com insuficiência renal crônica apresentaram deficit cognitivo nos primeiros 30 dias, mas os resultados finais dos experimentos foram heterogêneos.

;Dos 28 animais nefrectomizados, 15 apresentaram deficit cognitivo e 13 se comportaram como os de controle;, diz Scavone. Segundo o pesquisador, os resultados indicam que a insuficiência renal pode ser um agente contribuidor, mas não define que todos os pacientes desenvolverão problemas cognitivos.

Em um segundo momento, os cientistas examinaram os ratos para verificar o que teria causado a deficiência de aprendizado e de memória. Perceberam, nas cobaias com problemas cognitivos, uma grande concentração da proteína TNF-alfa no líquido cefalorraquidiano, fluido que ocupa o espaço entre o cérebro e o crânio. Em teste laboratoriais, observou-se um aumento dos níveis da TNF-alfa tanto no hipocampo quanto no córtex frontal, áreas cerebrais relacionadas à memória.

Prevenção

Os pesquisadores, então, correlacionaram esse resultado com a expressão da Klotho, proteína que regula o fosfato e a vitamina D no organismo. A ausência dela pode levar à menor absorção desses compostos, ocasionando o acúmulo de cálcio e fósforo no organismo. Por outro lado, a maior expressão potencializa funções cognitivas como o aprendizado e a memória.

Nas análises, detectou-se uma diminuição dos níveis de Klotho nos ratos com insuficiência renal crônica, quando comparados aos animais do grupo de controle. Desse modo, Scavone sugere que a pesquisa esclarece o fato de os pacientes submetidos à diálise apresentarem altos níveis de TNF-alfa e baixa concentração de Klotho. ;Nós vamos tentar reverter esses efeitos por meio de estratégias que estamos estudando, como exercício físico e curcumina (corante feito a partir do açafrão-da-índia). Temos um trabalho mostrando que a curcumina é capaz de reverter os deficits cognitivos;, diz o pesquisador.

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