Isabela de Oliveira
postado em 03/07/2016 07:50
Ao serem transportados à força para o Brasil, africanos eram lançados em um mundo onde não tinham direitos. Nem mesmo o de se expressarem, seja pela condição de escravos, seja pela dificuldade de dominar a língua portuguesa. Assim, a história desses homens e mulheres permanece cheia de lacunas, vazios que, passados 128 anos da abolição da escravatura, cientistas tentam preencher.
Graças a novas tecnologias, especialistas conseguem, literalmente, desenterrar esse passado, por meio do estudo de restos mortais de escravos. Em um estudo publicado no Journal of Archaeological Science, pesquisadores liderados por Murilo Barros Quintans, do Museu Nacional do Rio de Janeiro, recuperaram a origem de africanos sepultados durante os séculos 18 e 19 nos cemitérios Pretos Novos, no Rio, e da Sé, em Salvador ; muitos deles enterrados como indigentes pouco após chegarem ao país.
O grupo analisou os dentes fossilizados de 41 indivíduos, nos quais mediu os valores de isótopos de estrôncio, elementos naturalmente incorporados aos ossos e dentes ao longo da vida, a partir do consumo de água e alimento. Após serem cruzadas com as assinaturas de estrôncio presentes na geologia do continente africano, os pesquisadores descobriram que os negros sepultados em ambos os cemitérios tinham origem muito diferente, especialmente em Pretos Velhos, que apresentou uma pluralidade de origens muito maior que a encontrada em outros cemitérios de escravos, como o New York African Burial Ground, sítio arqueológico em Nova York, nos Estados Unidos.
;Isso significa que esses indivíduos pertenciam a diferentes regiões da África, ou seja, não eram de comunidades fechadas, mas de tribos diversas que eram misturadas durante a captura;, explica Roberto Ventura Santos, pesquisador-sênior do estudo e professor da Universidade de Brasília (UnB), onde parte do trabalho foi executada. Os níveis isotópicos remontam a regiões da África oriental e central.
Mapeamento
Algumas taxas mais elevadas de isótopos de estrôncio apontam para regiões com rochas arcaicas (4 bilhões a 2,5 bilhões de anos atrás) que ocorrem esparsamente em Angola, Congo e Moçambique. Em contraste, os dentes com níveis menores do elemento pertenceram, possivelmente, a pessoas que habitavam áreas vulcânicas mais recentes e que caracterizam a paisagem de Camarões, algumas regiões de Moçambique e pequenos segmentos de Nigéria, Congo e Angola. Para Quintans, a diversidade de origens ilustra a imensa dimensão do tráfico de escravos para o Rio de Janeiro, local que mais recebeu cativos para comércio em toda a América.
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